Quantas vezes?
Li Tananarive há semanas, aquando da sua publicação e, confesso, para minha surpresa, em função do que já tinha lido sobre o livro, que não me senti especialmente tocado pela história. Recentemente, distinguido como Melhor Obra Estrangeira de Banda Desenhada Editada em Português, nos Prémios de Banda Desenhada da Amadora, por um júri cuja idoneidade e conhecimento reconheço, decidi dar-lhe uma segunda oportunidade.
Feita a segunda leitura, sinto-me obrigado a escrever que a obra tinha tudo para me tocar. Tudo começa com o notário reformado que perde o seu melhor amigo, alguém com uma história de vida plena e cheia de aventuras vividas à imagem e à sombra de um certo Pinpin, o grande herói de banda desenhada da sua infância. Após o seu falecimento e a descoberta de que a sua casa seria absorvida pelo erário público por não haver descendentes, aquele notário decide procurar um herdeiro que em tempos o seu amigo referiu.
No entanto, essa busca, nos passos do seu amigo, complicada e metódica, no emaranhado das burocracias, embalada na mente do notário e aos olhos do leitor por belas imagens de aventuras aos quadradinhos, em cenas reconhecíveis aqui e ali, acaba por se revelar uma enorme surpresa, senão uma grande desilusão.
Obviamente não vou referir as razões para que isso seja assim, mas senti nesta segunda leitura, possivelmente mais atenta e desejoso de encontrar no livro o que tantos louvaram, que não fui capaz de sentir a empatia e a emoção que a história merecia e propunha.
Sei - já escrevi mais do que uma vez por aqui - que o momento de leitura, a disposição mental, a altura da vida influenciam sobremaneira a forma como lemos. Neste caso, em concreto, Tananarive tinha tudo - uma montanha-russa de emoções, a ligação implícita e explicita à BD... - para me agarrar, tocar e emocionar, mas simplesmente não aconteceu. Mentalmente, percebi-o e aconselho esta leitura, reconhecendo implicitamente o valor da obra e equivalendo-a, de certa forma, no tom e no propósito, a Senhor Apothéoz, essa sim que me deixou uma sensação de conforto e bem-estar.
No entanto, termino este texto como me senti quando fechei o livro, com a sensação de uma leitura falhada da minha parte, o que me leva à pergunta que sub-titula estas linhas: quantas outras belas e grandes leituras falhei ou não consegui desfrutar em pleno porque naquele momento em que peguei no livro e o abri, alguma coisa no meu dia, na minha vida, na minha cabeça, não me predispôs para uma fruição integral?
Tananarive
Mark
Eacersall
(argumento)
Sylvain
Vallée
(desenho)
ASA
Portugal,
Junho
de 2024
217
x 294
mm, 116
p., cor, capa dura
20,90
€
(imagens disponibilizadas pela ASA; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
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