Quais os limites para a violência?
O
facto de ser a primeira experiência do actor Kanu Reeves como
argumentista de BD é um dos factores que contribuiu para fazer deste
livro uma das últimas surpresas editoriais do ano transacto, no que
à BD diz respeito.
Edição
da G. Floy, BRZRKR
é a história de um semi-deus, concebido de forma sobrenatural para
ser uma arma e amaldiçoado por uma imortalidade que o leva a sofrer
na pele, literalmente, uma e outra vez, as consequências da sua
condição.
Há milhares de anos a vagabundear pelo planeta - e é inevitável a comparação com A Velha Guarda - encontramo-lo agora nos Estados Unidos, submetido a uma série de testes e experiências, que visam tanto conhecer e explorar todo o seu potencial quanto conseguir reproduzi-lo.
Enquanto o protagonista vai recordando a sua génese e os seus feitos posteriores, vão sendo levantadas algumas questões cruciais: Em que ponto é que a violência deixa de fazer sentido, se alguma vez o faz? É quando deixa de ser usada como defesa e passa a ser usada para atacar? E quando é que o ataque deixa de ser defesa antecipada? As respostas, dadas ao longo de séculos, tiveram sempre dois pontos de vista opostos: o dos vencedores e o dos vencidos; o dos dominados e o dos dominantes; o dos fortes e o dos fracos...
A discussão pode ser feita, mas por mais voltes que se tente dar a resposta será sempre a mesma e levará a uma triste constatação: o que mais fez avançar a humanidade, em qualquer época, foi a guerra, a vontade de suplantar o próximo, o desejo de conquistar o que está ao lado, a necessidade intrínseca do ser humano mostrar que é mais forte, mais valoroso ou mais insensível.
Mas se esta á uma das leituras possíveis, a verdade é que BRZRKR pode e deve ser fruído como uma narrativa de acção, violenta e trepidante, centrada num ser castigado com a imortalidade.
É uma história repleta de referências e homenagens a momentos importantes dos comics de super-heróis, que assenta numa planificação intensa e muito dinâmica, que é um contributo fundamental para o ritmo do relato e para salientar pontualmente pormenores que acabarão por se revelar muito importantes. A par disso, ostenta igualmente um desenho que cultua a hiper-violência e reforça o impacto de uma narrativa sem tempos mortos ou de reflexão, servido por uma superior utilização da cor para definir momentos e mudanças de cenário ou de época.
Como nota final, uma referência para o extenso caderno que encerra o livro, que reproduz as capas dos comics originais e, principalmente, um diálogo entre Reeves e Kindt sobre a génese da obra e as diferentes opções gráficas, narrativas e visuais assumidas.
BRZRKR
Keanu
Reeves
e Matt
Kindt
(argumento)
Ron
Garney e Bill
Crabtree
(desenho)
G.
Floy
Portugal,
Dezembro de 2024
180
x 275 mm, 424
p., cor,
capa dura
50,00
€
(versão revista do texto publicado na edição online do Jornal de Notícias a 4 de Janeiro de 205 e na edição em papel do dia seguinte; imagens disponibilizadas pela G. Floy; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
Sem comentários:
Enviar um comentário