14/09/2010

Leituras da Turma da Mónica de Setembro

Títulos da Turma da Mônica editados pela Panini Comics (Brasil) distribuídos este mês nas bancas portuguesas:

Mônica #39
Cebolinha #39
Cascão #39
Chico Bento #39
Magali #39
Ronaldinho Gaúcho e Turma da Mônica #39
Turma da Mônica – Uma aventura no parque #39
Almanaque da Mônica #20
Almanaque do Cebolinha #20
Almanaque do Cascão #20
Turma da Mônica – Colecção Histórica #16
Turma da Mónica – Saiba mais #30 – Oswaldo Cruz
Turma da Mônica Jovem #21

13/09/2010

Jerry Spring - L'intégrale en noir et blanc - Tome 1 – 1954/1955

Jijé (argumento e desenho)
Dupuis (Bélgica, Agosto de 2010)
218 x 230 mm, 240 p., cor, cartonado

Resumo

Primeiro volume da edição integral a preto e branco de Jerry Spring, reúne os álbuns “Golden Creek (Le secret de la mine abandonnée)", “Yucca Ranch", "Lune d'argent" e "Trafic d'armes", originalmente publicados em 1954 e 1955.

Desenvolvimento
Pertenço a uma geração para quem o western era (um)a (das) aventura(s) em estado puro. E ainda é!
Por isso – e como leitor do “Mundo de Aventuras”, que me formou para um gosto eclético dentro dos quadradinhos – Jerry Spring foi um dos heróis que (também) encheu os meus sonhos. Blueberry e Buddy Longway, para mim, surgiram mais tarde, Tex (para desgosto do José Carlos Francisco), só em anos recentes, outros heróis menores (na dimensão que ocupam na história da BD) por lá passaram também mas deixando marca menos impressiva.
Assim, quando antevi a possibilidade de reencontrar Spring, numa edição com esta qualidade, para mais no preto e branco original, preferido por Jijé em detrimento da cor mais comercial, não hesitei. E o mínimo que posso dizer é que valeu a pena. Porque o reencontro com este herói da minha juventude, não destruiu nada da imagem que a minha memória guardava e ainda acrescentou a (re)descoberta de um clássico incontornável da 9ª arte.
Apesar de se considerar mais desenhador do que argumentista, a verdade é que Jijé, neste western, revela dotes mais do que suficientes para prender o leitor ao longo das narrativas, diversificadas dentro de alguns dos habituais estereótipos do género, bem conseguidas e consistentes, graças também ao seu ritmo acelerado, muitas vezes trepidante, devido à riqueza e variedade de planos e enquadramentos utilizados por Jijé.
Por isso não se compreende porque por vezes recorreu a outros colegas de profissão (Goscinny, Rosy…) até porque, apesar de aceitar os seus pontos de partida, no decurso dos álbuns acabou sempre por seguir o seu instinto, para desagrado deles.
As histórias incluídas neste tomo, as primeiras de Spring, revelam já um protagonista sólido e bem definido e um fio condutor sólido e credível, apesar de ligeiras discrepâncias menores, e mostram como Jijé soube beber nas suas inspirações (narrativas e gráficas) embora dotando a sua personagem de roupagens originais.
Desde logo, pelo carácter humanista de Jerry, cowboy romântico por excelência, gentleman por baixo da pele (não muito grossa) de homem do Oeste, como comprovam várias situações em que opta pelo diálogo e não pela violência, pela compaixão e não pela brutalidade desnecessária. E, também, pelo humor patente ao longo dos relatos, presente em muitos dos diálogos de Jerry ou, por exemplo, pela cobiça despertada por Ruby em todos aqueles com quem o herói se cruza em “Lune d’Argent”.
Se o protagonismo pertence ao americano – por vezes herói a solo dos relatos – a seu lado está quase sempre o mexicano Pancho que com ele forma um dueto (fisicamente) equiparável a muitos outros existentes na BD, pois Jerry é alto e atlético, enquanto Pancho é baixo e gorducho. No entanto, Pancho actua menos como contrapartida cómica e (bem) mais como verdadeiro parceiro, revelando, muitas vezes, mais bom senso e experiência, e contribuindo assim para salvar(-se e a)o amigo de situações limite.
O desenho de Jijé, mesmo sujeito a prazos apertados e ao seu excesso de trabalho – era então o faz-tudo da revista Spirou e das edições Dupuis – se foi traçado a pincel com rapidez e celeridade, não o denota, revelando antes um desenhador por excelência que, felizmente, a BD foi roubar à pintura. A planificação adoptada, com apenas três tiras por prancha, frequentemente ocupadas com uma única vinheta, deixa o seu desenho respirar e ajuda mesmo a realçar as suas principais qualidades: um traço elegante, ágil e muito dinâmico, e uma excelente utilização de manchas de negro utilizadas com mestria para guiar os olhos do leitor e destacar na brancura da página os pontos principais da acção.
Jijé sente-se tão à vontade com a figura humana – sejam os protagonistas delgados ou rechonchudos, novos ou velhos, homens ou (bonitas) mulheres - como no desenho de (soberbos e imponentes) cavalos. Nos cenários, em que montanhas e planícies tomam a primazia a aglomerados urbanos, adivinha-se que Jijé os conheceu e percorreu (durante uma viagem aos Estados Unidos), conseguindo transmitir-lhes uma aura realista e uma credibilidade que o recurso ou a “prisão” a documentação fotográfica muitas vezes não permite. Este aspecto contribui decisivamente para a solidez realista deste western, o que não invalida que o herói ganhe sempre no final, por muitas provas e atribulações que tenha de atravessar. Como aliás convém!

A reter
- Já o escrevi algumas vezes (e disse-o muitas mais), mas não me canso de o repetir: estou rendido aos volumes “integrais” francófonos. Pela irrepreensível qualidade gráfica, pela relevância e diversidade da documentação incluída (esboços, capas originais, arquivos de base, fotos, contextualização histórica da obra, etc.), pela importância das obras reproduzidas, pelo preço acessível. E também, neste caso concreto, “tout-court” pelo valor sentimental que Jerry Spring tem para mim. Não admira que tenha cada vez mais tomos destes na minha biblioteca…
- A qualidade do traço de Jijé, pormenorizado, rico, ágil, dinâmico, apesar de sujeito aos prazos apertados e à rapidez de execução. Por isso, se justificam as palavras de Derib (autor de Buddy Longway): “sou o único a considerar Jijé o maior desenhador de bandas desenhadas realistas?”.

Curiosidades
- Estreado em Portugal no “Cavaleiro Andante”, logo em 1956, em Portugal Jerry Spring passou também pelas páginas do “Zorro”, “Spirou” (1ª e 2ª séries) e “Selecções BD” (2ª série), para além do já citado “Mundo de Aventuras”. Quatro dos álbuns escritos e desenhados por Jijé - El Zopilote, Pancho em Apuros, Cavalos de Montana e Lobo Solitário - foram editados a cores pelas Edições 70, entre 1983 e 1984.
- Assistente de Rob-Vel, de quem herdou Spirou, Jijé privou (e trocou experiências e ajuda nos trabalhos quando os prazos apertavam) com Morris e Franquin, tendo um certo Jean Giraud dado os primeiros passos na BD no seu estúdio, em pranchas deste mesmo Jerry Spring, cuja influência gráfica é bem notória nos primeiros álbuns de Blueberry.

11/09/2010

A Batalha do Bussaco – A Derrota Fatal dos Marechais de Napoleão Bonaparte

No âmbito das comemorações dos 200 anos da Batalha do Bussaco, é lançado hoje, sábado, 11 de Setembro, às 16 horas, no Convento de Santa Cruz do Bussaco, na Mealhada, o álbum de banda desenhada “A Batalha do Bussaco – A Derrota Fatal dos Marechais de Napoleão Bonaparte”, da autoria de José Pires.
O livro, que retrata detalhadamente um momento crucial da história portuguesa e europeia, será apresentado pelo Coronel José Geraldo, director do Jornal do Exército.
A Batalha do Bussaco é um álbum publicado pela Âncora Editora, com o patrocínio da Câmara Municipal de Mealhada.

10/09/2010

Tintin no Congo



Hergé (argumento e desenho)
Edições ASA (Portugal, Setembro de 2010)
160 x 220 mm, 64 p., cor, cartonado


Resumo
Segundo tomo das aventuras de Tintin, leva o reporter até ao antigo Congo belga, sob o pretexto de escrever uma série de reportagens.

Desenvolvimento
1. A obra
Esta é uma das mais ingénuas narrativas de Tintin, sem grande fio condutor, que quase se limita a ser uma sucessão de gags – alguns bem conseguidos - que têm por tema o confronto com os inimigos de Tintin, caçadas a animais exóticos ou encontros com a população local. Apesar disso, é uma obra de uma grande legibilidade, que em termos narrativos visuais revela já todas as (muitas) qualidades de Hergé.
Revisitada hoje, quase oitenta anos depois da sua génese, revela-se bastante datada e tem que ser encarada como tal, como um documento da forma de pensar de uma época. E é assim que deve ser lida. E é assim que deve ser analisado e compreendido o olhar complacente e de alguma superioridade de Tintin em relação aos negros e a atitude subserviente destes em relação ao herói que reconhecem e admiram.
Por isso, as variadas acusações de racismo e os múltiplos processos de que está a ser alvo em tribunal, apenas podem significar uma de duas coisas: ignorância por parte dos seus autores, ou uma vontade desmesurada de se colocarem em bicos de pés à custa da obra de Hergé…
E o mesmo se poderá dizer das acusações de desrespeito pelos direitos dos animais (seja lá isso o que for), feitas por umas tantas pessoas e organizações com demasiado tempo livre, face às matanças – nalguns casos bem divertidas – que Tintin vai cometendo.

2. O formato
Se o traço de Hergé é suficientemente legível e expressivo para aguentar bem a redução de tamanho adoptado pela ASA para esta sua primeira edição de Tintin, próximo do comic americano ou do próprio livro, a verdade é que qualquer redução de tamanho é penalizadora para a completa fruição de uma obra gráfica. Reconhecendo diversas vantagens ao actual formato (a começar pelo preço), pessoalmente, prefiro o tamanho tradicional.

3. A tradução
Esta edição da ASA apresenta também uma nova tradução. Sendo um dos álbuns de Hergé com menos texto, se num ou noutro balão poderia haver opções mais felizes (nalguns casos utilizadas na anterior edição da Verbo) globalmente fiz a sua leitura sem que nada me chocasse ou soasse especialmente mal.

09/09/2010

Pérolas a Porcos #8 – Pérolas de sábado à noite

Stephen Pastis (argumento e desenho)
Bizâncio (Portugal, Março de 2010)
210 x 220 mm, 130 p., pb, brochado com badanas


Não hesito em afirmar que Pérolas a Porcos (Pearls before Swine, no original) é uma das mais geniais tiras diárias em publicação. É verdade que um dos seus epítetos poderia ser “Feios, um porco e maus”, pois este é um retrato cínico e cruel mas irresistível do ser humano (todos nós), mostrando o seu pior lado, quer fale do racismo, da violência, da reciclagem, da religião, do desporto, dos programas televisivos, dos grupos de auto-ajuda, das novas tecnologias ou do comércio enganoso. Porque Pastis, o seu autor, traça-o com diálogos inteligen-tes, mordazes, certeiros, finamente irónicos, absurdamente deliciosos ou deliciosamente absurdos, com um notável e irresistível non-sense, baseando-se nos piores defeitos da humanidade– o egoísmo, a maldade, a ganância, a inveja, o oportunismo, a estupidez, a falta de educação – transpostos para uma série de animais antropomorfizados e sem nada que os permita classificar como “fofinhos”: um rato egoísta, impertinente e oportunista; um porco a quem chamar estúpido é um grande elogio; uma zebra simplista e ingénua mas com uma grande vontade de viver; um bode sensato e lúcido, mas pouco interveniente.
A esta base – sólida, consistente e cujos diálogos têm sempre algo de inesperado – há que acrescentar uma série de personagens ocasionais ou recorrentes, com tanto de surpreendente quanto de insólito: Chuckie, o carneiro (não antropomorfizado!) que por isso só faz “béééé” (há tante gente assim!), Herb, o maquinista (miniatura!) dos comboios (em miniatura!), os pictogramas que bem conhecemos da sinalização de portas de WC, uma anémona-do-mar, um par de nozes, bonequinhos vickings efeminados, Barbara Bush, os cérebros “autóno-mos” dos anti-heróis que protagoni-zam a série, o bélico pato-de-guarda, Andy o cão acorrentado com vontade de correr mundo (e com mala feita), Steve e Orville os hamsters de gaiola, o próprio Pastis, descoberto ou acossado pelas suas criações, etc., etc.! Como último achado, surgem os “peixes do tecto” que, sentados no topo da tira, tentam pescar os seus protagonistas!
Neste oitavo tomo, a relação de ódio/von-tade de comer entre a zebra e os (muito, mas mesmo muito) estúpidos crocodilos assume um maior protagonismo, semelhante mesmo ao desfrutado pelo rato e o porco, e é ainda condimentada (passe o termo), pelos novos vizinhos, uns leões fêmea-dependentes.
No entanto, o grande destaque vai para novo cruzamento com uma tira “rival”, desta vez a sossegada e ingénua “Family Circus”, cujo espírito próprio e singularidades gráficas, são vítimas do humor de Pastis e das (más) acções do rato e companhia.

08/09/2010

Libérale Attitude

Pluttark (argumento e desenho)
Fluide Glacial (França, Agosto de 2010)
225 x 288 mm, 48 p., cor, cartonado


Resumo

Se é uma (triste) verdade que a economia só é divertida para os bancos, alguns gestores e outros tantos políticos, e que temas tão áridos e mal sonantes como crise económica, inflação, impostos ou juros geralmente causam arrepios ao comum dos mortais, este álbum prova que, apesar de tudo, eles até têm um lado divertido e que a crise (afinal) tem solução.

Desenvolvimento
Ou melhor, várias soluções, ou vários caminhos (complementares) para chegar à solução final (por muito mal que esta expressão soe…).
E são esses caminhos, a sua sugestão pelo menos, que Pluttark nos apresenta ao longo de quase cinco dezenas de páginas, ocupadas por gags de vinheta única, tiras subordinadas ao tema « 100 ideias para vencer a crise » ou bandas desenhadas curtas, que transpiram criatividade e imaginação. Talvez – de certeza ! – de uma forma (muito) cínica e politicamente incorrecta, é verdade, mas, parafraseando alguém, « grandes problemas implicam grandes soluções »… Por isso, conceitos como produtividade, liberalismo, consumismo, desumanização ou mão-de-obra, são levados ao extremo, empurrados até ao absurdo, esticados até aos limites, embora o ponto de partida seja um simples debate de ideias.
E que ideias ! Porque em « Libérale attitude » podemos encontrar um (pobre) gestor em greve pelo direito à isenção de impostos e a um iate livre de encargos ; descobrir as vantagens da mão de obra barata (quase escrava…), que culminam na possibilidade de utilização dos cadáveres dos empregados como fertilizantes orgânicos « 100% biológicos » ; analisar a sugestão do aumento dos dias da semana para incrementar a produtividade ; encarar a hipótese da redução substancial da idade legal para trabalhar (para algo como os 4 anos de idade… ou menos se as criancinhas forem grandes e fortes) para fazer concorrência aos países pobres.
Concursos televisivos, marketing ou protecção de espécies protegidas são outros temas analisados à (fraca) luz da (fraca) realidade económica, descobrindo o autor, em cada um deles, com humor negro e sarcasmo, novas soluções para sairmos do buraco em que nos meteram.
Servido por cores lisas, o traço base é simples e ligeiro, quase só veículo acessório para dar corpo às ideias peregrinas (serão ?) que Pluttark sugere mas que por vezes resultam bem assustadoras pela colagem à realidade que revelam.

07/09/2010

Beetle Bailey: 60 anos de inépcia militar

Há 60 anos, Beetle Bailey, eterno recruta, estreava-se numa dúzia de jornais mas o seu criador estava longe de imaginar o seu sucesso e de como este dependeria da sua estreita relação com o exército norte-americano.
Símbolo por excelência da preguiça – “não faças amanhã, o que podes deixar para depois de amanhã”, poderia ser o seu lema tal como “se sentires vontade de trabalhar, deita-te e espera que passe” – e de uma contestação suave e desarmante ao autoritarismo da instituição militar, Bailey (em Portugal mais conhecido como Recruta Zero) sobrevive até hoje, sendo publicado diariamente em centenas de jornais por todo o mundo.
Para o seu progenitor, Mort Walker, nascido a 3 de Setembro de 1923, em El Dorado, no Kansas, desenhar cartoons sempre foi algo tão natural como comer ou beber. Por isso publicou o primeiro desenho no jornal escolar aos 10 anos, vendeu o primeiro cartoon aos 11, criou a primeira série regular – “Limejuicers” – aos 13, tornou-se cartoonista profissional aos 15, dirigiu a primeira revista aos 18 (e criou durante a sua carreira outras séries famosas, como “Hi & Lois”, “Boner’s Ark” ou “Betty Boop and Felix”). Em 1948, após cumprir o serviço militar na II Guerra Mundial (“quatro anos de pesquisa”, dizia ele) e terminar a sua formação universitária, mudou-se para Nova Iorque, onde viu recusados cerca de 200 cartoons, antes de conseguir emprego como editor de quatro títulos na Dell Publishing Company.
Em 1950, cansado do excesso de trabalho e do baixo salário decidiu reciclar Spider, um jovem desengonçado e desleixado, com olhos pequenos e que fumava cachimbo, que era personagem recorrente dos seus gags, tornando-o protagonista de uma tira diária, em meio universitário, entre colegas, miúdas e professores. A King Features aprovou o projecto, embora mudando o título para Beetle Bailey.
A estreia da tira diária foi modesta, apenas numa dúzia de jornais, que tinham aumentado para o dobro ao fim de seis meses, número insuficiente para justificar a sua manutenção, ao fim de um ano de existência, não tivesse a realidade influenciado a ficção. É que a 25 de Junho desse ano, tinha-se iniciado a Guerra da Coreia, o que veio a introduzir um ponto de viragem na vida de Bailey que a 13 de Março de 1951 se alistou para servir no exército norte-americano, vivendo nos quadradinhos da tira de jornal o que experimentavam os seus pares do mundo real.
Destacado para o Camp Swampy (pantanoso), o novo recruta, de quem os quadradinhos nunca mostraram os olhos, sempre sob um chapéu ou boné, viu recrudescer a sua preguiça e demonstrou a maior inépcia para a vida militar, originando as maiores confusões e tornando-se no alvo preferencial do colérico (mas sentimental) Sargento Orville Snorkel. Da sua vida anterior, levou apenas a namorada, destacando-se na nova galeria persona-gens como “Killer” Diller, um mulhe-rengo, Otto, o cão antropo-mórfico de Snorkell, ou o General Amos Halftrack, caquéctico, alcoólico mais interessado no golfe e na (bela) secretária do que nas suas atribuições.
Com eles, demonstrando um enorme sentido de humor, especial predilecção por gags puramente visuais e uma invulgar capacidade de (re)inventar situações, pondo constantemente em causa a autoridade militar, Walker transformou Beetle Bailey num grande sucesso, difundido por centenas de jornais, entre os quais o próprio “Star & Strips”, órgão oficial do exército.
Com o final da guerra, uma tentativa de regresso à vida civil do recruta foi imediatamente rejeitada, provocando inclusive centenas de cartas de protesto por parte dos leitores e condenando Bailey, que também já protagonizava uma prancha dominical colorida desde 14 de Setembro de 1952, a uma eterna vida militar, se é que assim se pode designar o seu desempenho, para gáudio dos seus leitores, que se foram renovando ao longo dos anos.
Com a vida no exército como tema, Beetle Bailey foi sempre uma fonte de polémica. A primeira, significativa, surgiu no final da guerra da Coreia, quando o novo responsável do “Star & Strips”decidiu suspender a sua publicação, considerando-a atentatória da moral (?!) e má para a disciplina do exército, o que incendiou a imprensa em defesa da série.
Quase 20 anos depois, em 1970, a situação repetiu-se quando Walker, apesar da oposição da distribuidora, introduziu um oficial negro, o tenente Flap, sendo acusado pelos negros de os estereotipar e pelos brancos de proselitismo, numa época em que o racismo era uma realidade nos EUA.
Em 1997, as atenções constantes do general Halftrack em relação à sua sedutora secretária, a bela Miss Sheila Buxley, criada em 1982, levaram os movimentos feministas a acusar o autor de promover o assédio sexual.
Em todos estes momentos, após pousar a poeira das críticas, a série saiu sempre reforçada junto do público e incrementou a sua difusão nos jornais.
E a verdade é que o próprio Exército dos EUA, apesar de tudo, se mostrou grato pela sua criação, atribuindo a Mort Walker no ano 2000 a mais alta condecoração com que é possível distinguir um civil.
O sucesso da tira (que em Portugal passou pelo jornal A Capital nos anos 70, bem como por diversas revistas, para além das versões brasileiras que chegavam aos nossos quiosques) originou duas adaptações animadas na televisão, em 1963 e em 1994, inúmeras publicações em revistas e livros, uma homenagem em forma de selo pelos correios norte-americanos, já este ano (o que foi referenciado na própria tira), e rendeu inúmeros prémios a Mort Walker, que desde os anos 80 foi assistido pelo seu filho Greg, actualmente responsável pela série.
(Versão revista e aumentada do texto publicado no Jornal de Notícias de 4 de Setembro de 2010)

06/09/2010

Futuro dos quadradinhos passa pelo digital?

Nascida há pouco mais de um século, com o advento da imprensa, a banda desenhada dá agora os primeiros passos nos novos suportes digitais, que alguns anunciam como o seu futuro.
“Oficiosamente”, a banda desenhada nasceu a 25 de Outubro de 1896. A data assinalava o primeiro balão de texto do The Yellow Kid, de Richard F. Outcault, e também a sua massificação pela imprensa. Para a escolha dessa data, por um grupo de especialistas, entre os quais Vasco Granja, reunidos em Lucca, em 1989, pesou também a proximidade dos seus primeiros 100 anos. E, pode dizer-se, nasceu para ser lida em papel, primeiro nos jornais, depois em revistas, mais recentemente em álbuns e livros.
Mas, com o advento das novas tecnologias, a BD também as tem experimentado, a diversos níveis. Através da leitura directa em ecrãs (área em que se têm multiplicado os scanners piratas que as editoras combatem cada vez mais ferozmente) ou tendo a internet já como suporte original, como forma de combater as dificuldades relacionadas com a edição, o lançamento de novos autores e a distribuição dos livros. O que, por exemplo, popularizou o formato geralmente designado como “italiano” (horizontal), mais próximo das medidas dos ecrãs tradicionais.
Isto, segundo alguns (saudosistas?), retira aos quadradinhos características fundamentais: a textura do papel, o cheiro da tinta, o peso físico do objecto livro, a facilidade de avançar e recuar voltando as páginas, a possibilidade de apreciar uma página inteira ou mesmo páginas duplas… Ou, indo mais longe, tornando impossível as edições de luxo e as tiragens limitadas, tão ao gosto dos coleccionadores. Do outro lado da barricada, apontam-se como vantagens a diminuição radical do espaço de arrumação dos livros impressos, a diminuição do papel gasto e a consequente preservação das florestas ou a facilidade de transporte das obras.
Com o crescendo da aposta das editoras neste formato, as ferramentas informáticas têm sido utilizadas para aproximar os quadradinhos digitais do formato original (“virar” das páginas) ou acrescentar-lhes algo no novo suporte (ampliação de vinhetas ou animações limitadas, os designados “motion comics”).
Por isso, cada vez mais, é possível aceder online a excertos de obras novas, a títulos esgotadas ou difíceis de encontrar e mesmo a novas edições. Gratuitamente, alugando por períodos mais ou menos limitados, por assinatura ou pagando o título desejado. Mas sempre num nível (ainda com muito de) experimental e de teste a um mercado que para já é apenas potencial. E que ainda possui muitas limitações: o aluguer não garante propriedade, uma falha de sistema pode significar a perda da “biblioteca”, o fecho ou mudança do site vendedor também…
Actualmente, a facilidade de acesso a leitores como o iPad, Kindle, iPod, iPhone, Courier (e às suas muitas potencialidades) abre novas portas. Ou não, como o confirma o facto de em Junho último um dos mais importantes operadores franceses de comics digitais ter vendido apenas cinco títulos…
Mas os sinais de que o novo suporte veio para ficar (quanto mais não seja para servir a geração vindoura já “nascida” a ler digitalmente…) multiplicam-se, tal como as aplicações que os suportam: ComiXology, iVerse, BD Touch. Recentemente, a Marvel lançou pela primeira vez em simultâneo um comic – do Homem de Ferro - em versão papel e digital. A DC Comics anunciou em grandes parangonas a entrada no mundo virtual; outras editoras, como as igualmente norte-americanas IDW, Dark Horse ou Aspen, dão também passos firmes nesse sentido. Na Europa, o panorama não é muito diferente: a Soleil e os Humanoides Associèes têm já on-line o seu catálogo na DigiBidi, enquanto que a Casterman, a Dupuis, a Dargaud, a Lombard e a Fluide Glacial criaram a Izneo onde têm distribuído (também) desta forma alguns dos seus títulos mais chamativos. Questões como o preço da versão digital relativamente à de papel ou os pagamentos aos autores, são outros pontos – não pacíficos – que aguardam resolução.
Por isso, sendo tantas as questões e dúvidas e ainda tão poucas as respostas e esclarecimentos, para terminar parece ajustado um modelo que foi recorrente no tempo das revistas (em papel) de histórias aos quadradinhos: (continua).
(Versão revista e aumentada do texto publicado no Jornal de Notícias de 22 de Agosto de 2010)

03/09/2010

Cathy, o fim aos 34 anos


Cathy, a neurótica protagonista da tira diária de imprensa com o seu nome, viverá os seus últimos quadradinhos no próximo dia 3 de Outubro, após 34 anos de publicação ininterrupta.
Estreada em Novembro de 1976, esta banda desenhada que chegou a ser publicada diariamente em 1400 jornais e conquistou um Prémio Reuben em 1992, atribuído pela National Cartoonists Society, destacou-se desde logo por ser escrita e desenhada por uma mulher – Cathy Guisewite – e por ter como base algumas das questões que preocupam (especialmente) o belo sexo – aspecto, dietas, relações, trabalho - abordadas de um ponto de vista especificamente feminino.
Ao longo das suas tiras e pranchas dominicais, Cathy, uma mulher solteira, trintona, anafada, independente, neurótica, explorada no trabalho, insegura quanto ao sexo oposto, dividida entre a vontade de comer e a necessidade de dietas que não consegue cumprir, com dificuldades em aceitar o proteccionismo dos pais e as semelhanças com a mãe, divertiu gerações de leitoras, com quem partilhou diariamente as suas desventuras com Irving (namorado, ex-namorado, outra vez namorado e, finalmente, marido), os pais, os colegas de trabalho, o chefe prepotente ou a sua cadela.
Agora, mais de três décadas depois, a autora, nascida no Ohio, a 5 de Setembro de 1950, decidiu pôr fim a esta aventura gráfica, para se dedicar à família. Às fãs de Cathy - e aos fãs também – resta-lhes reler as muitas colectâneas, cronológicas ou temáticas, existentes, das quais mais de duas dezenas foram editadas em português pela Gradiva, com títulos sugestivos como “Pernas elegantes nem daqui a 30 anos”, “Os homens deviam vir com manual de instruções” ou “Melhor que chocolate só mesmo um par de sapatos novos”.

(Texto publicado no Jornal de Notícias de 21 de Agosto de 2010)

02/09/2010

Leituras ASA de Setembro

Lista dos títulos previstos pelas Edições ASA para o mês de Setembro:

Happy Sex
Zep (argumento e desenho)

Com um humor cúmplice e irónico, este álbum evoca o nosso tempo, com pranchas muito divertidas, especialmente aquelas que dizem respeito às situações do dia-a-dia que, sem caírem na vulgaridade, abordam temas como as imperfeições do corpo, as obsessões e a gestão da vida sexual… sem nos esconder absolutamente nada!
O grafismo de Zep juntamente com as cores pastel que utilizou, permitem mostrar o corpo humano com humor, pondo a nu as excentricidades e os comportamentos sexuais mais hilariantes!

Adèle Blanc-sec , vol. 1
(inclui os álbuns “Adèle e o Monstro” e “O Demónio da Torre Eiffel”
Jacques Tardi (argumento e desenho)
Esta série decorre nos inícios do séc. XX. Uma época de grandes feitos tecnológicos e avanços científicos, onde tudo é possível. Uma época na qual ciência e misticismo andam de mãos dadas, em busca de um futuro melhor para a humanidade…
É neste contexto que têm lugar as extraordinárias aventuras de Adèle Blanc-sec; no primeiro volume, assistimos à eclosão de um ovo de pterodáctilo que levará à revelação de seitas diabólicas que ameaçam Paris…

Spirou e Fantásio #51 – A invasão dos Zorcons
Vehlmann (argumento)
Yoann (desenho)

Edição com capa exclusiva para a FNAC disponível a partir de 3 de Setembro
O célebre sábio Pacómio passa tranquilamente os dias no seu Castelo… Enquanto se dedica às suas experiências, o nosso amigo micólogo recebe a intrigante visita de um Zorglub que se apresenta mais altivo do que nunca… Mas o que pensar do comportamento do Conde que confunde o seu famoso rival com um simples canalizador? Será que Zorglub preparou minuciosamente todas as catástrofes que estão prestes a ocorrer?
Com a edição deste álbum, assistimos ao regresso de um mítico duo da banda desenhada humorística a uma selva insólita, infestada de criaturas inquietantes…


Blacksad - O inferno, o silêncio
Dias Canales (argumento)
Juan Guarnido (desenho)


(álbum a lançar dia 17, em simultâneo com a edição original francesa)



As Aventuras de Tintin
Hergé (argumento e desenho)
(nova tradução e novo formato: 160 x 220 mm)
PVP: € 8,90


Tintin no país dos sovietes
Tintin vai à Rússia fazer uma reportagem para o jornal, mas vários homens tentam impedi-lo para que não revele a verdadeira realidade russa.
Originalmente publicado num suplemento juvenil, esta história foi retirada de circulação por Hergé a partir dos anos 30 e só em 1973 voltou a ser publicada, tornando-se num “best-seller”. Livro onde o regime comunista e os comunistas são retratados como vilões, o que gerou controvérsia.
É o único livro de Tintin a preto e branco

Tintin no Congo
Tintin é enviado para o Congo, colónia belga na época. Por uma série de peripécias acaba por entrar em confronto com um bando de gangsters que controlam a produção de diamantes…
Esta história foi publicada inicialmente no suplemento juvenil e depois em álbum a preto e branco.
Em 1946, Hergé redesenhou a história alterando a ideologia colonialista do álbum, deu-lhe cor e alterou os diálogos.

Tintin na América
Tintin parte para a América durante o período da lei seca. Em Chicago é raptado por gangsters, cujo chefe é Al Capone, que o consideram perigoso. Após escapar e ser de novo perseguido, acaba por encontrar os peles-vermelhas…
Este álbum é considerado um dos mais fantasistas e infantis. Hérge quis centralizar a história nos índios da América, que o fascinavam.

Os Charutos do Faraó
Tintin está a fazer um cruzeiro com destino ao Extremo Oriente, quando encontra um egiptólogo extravagante que procura a tumba de um faraó. Ao decidir acompanhá-lo é capturado e após várias peripécias chega à Índia, onde desmonta uma organização de traficantes de ópio…
Álbum inicialmente publicado a preto e branco, foi o último a ser colorido, em 1955. Este álbum surgiu 12 anos após a descoberta do túmulo de Tutankhamon.

O Lótus Azul
Um mensageiro da China, que se iria encontrar com Tintin, é atingido por uma flecha envenenada com o veneno da loucura, dando-lhe apenas tempo para pronunciar o nome Mitsuhirato. Tintin parte em busca deste individuo desconhecido, o que o leva até à Índia e à China…
Publicado em álbum a preto e branco em 1936, só 10 anos depois foi colorido.
Este livro, onde Hergé defende a causa chinesa, nunca foi bem visto pelos japoneses.

A Orelha Quebrada
Tintin investiga o roubo no Museu Etnográfico de um fetiche pertencente a uma tribo – Os Arumbaias. As pistas levam-no até à América do Sul, onde existe uma revolução em curso. Perseguido por todos, refugia-se na tribo dos Arumbaias onde descobre o segredo do fetiche… Álbum editado em 1937, foi reeditado a cores em 1943.
Mais uma vez são feitas alusões à actualidade mundial - a guerra do Chaco, entre o Paraguai e a Bolívia. No livro Hergé denomina o conflito por “guerra do Chapo”.

(Resumos da responsabilidade da editora)

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