Arranque hesitante
Valérian fez a sua estreia aos quadradinhos a 9 de Novembro
de 1967 na revista “Pilote”, então conhecida como “a revista de Astérix”, mas
onde se cruzavam heróis como Blueberry, Lucky Luke ou Michel Vaillant.
É esse princípio que este álbum nos mostra.
O chefe de redacção era René Goscinny, “pai de Astérix”,
que, mesmo não apreciando especialmente o género ficção-científica, sem grande
expressão na BD francófona, encontrou na proposta de Pierre Christin (que
assinava Linus) e Jean-Claude Mezières, méritos suficientes, fazendo ecoar os
ventos de mudança e experimentação que começavam a soprar.
O início de Valérian, que se estreou no nosso país na
revista Tintin, logo em 1968, foi algo hesitante e na linha de alguns clichés
do género, nomeadamente as viagens no tempo e um vilão de serviço, por isso,
este primeiro álbum ASA, distribuído na passada quarta-feira com o jornal
Público, não deve ser considerado representativo da série, mas apenas o que é:
um arranque algo vacilante.
A primeira história, Sonhos
maus, balança entre a aventura, uma ficção-científica básica e o caricatural,
e a segunda, A Cidade das Águas Movediças
(que nesta edição surge com mais 9 pranchas que as versões até agora publicadas
em álbum) revela-se já bem mais interessante, sendo famosa pelas imagens de
Nova Iorque submersa. Ambas, no entanto, são importantes para compreender
posteriormente algumas questões relevantes.
A partir do terceiro álbum, “O Império dos Mil Planetas” -
que serviu de base ao filme de Luc Besson que estreia hoje - Christin e Mezières
encontram o seu caminho: a descoberta de miríades de universos fantásticos e
maravilhosos, povoados por seres originais e diferentes - mais tarde reunidos
num atlas - recriados pelo traço barroco mas extremamente eficaz. Esta fase de
deslumbramento perante a imensidade e o potencial do universo, onde Valérian e
Laureline se deslocam para repor os equilíbrios necessários, fica também
marcada pela transposição para aqueles mundos distantes, mas que formam um todo
coerente, de muitas situações sociopolíticas então na ordem do dia e presentes nas
preocupações dos autores, da opressão à igualdade, da ecologia ao pacifismo, do
racismo à libertação feminina.
Aliás, não é por acaso que Laureline, que acompanha Valérian
desde a primeira história, quando ele a encontrou numa viagem ao ano 1000, foi
ganhando cada vez mais protagonismo e assumindo mesmo as rédeas missão após
missão, o que estava longe de ser normal.
Numa segunda fase, a série - sem perder o seu lado
fantástico - assenta mais nas tentativas da dupla de agentes espácio-temporais
de voltarem ao seu tempo e evitarem o cataclismo que destruiu a cidade de
Galaxity, onde estava sediada a agência para a qual trabalham.
Valérian #1
Sonhos Maus/A Cidade das Águas Movediças
Pierre Christin (argumento)
Jean-Claude Mezières
(desenho)
ASA/Público
Portugal, 26 de Julho de 2017
96 p., cor, capa mole
8,90 €
(versão revista e expandida do texto publicado no Jornal de
Notícias de 17 de Julho de 2017; clicar nas imagens - as pranchas são do volume
1 da versão integral francesa - para as aproveitar em toda a sua extensão)
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