28/10/2021

O Fogo Sagrado

Humor e amor




Acredito que para alguns, O Fogo Sagrado começará por ser uma desilusão - falo daqueles que esperam encontrar nele o humor desbragado de que Derradé deu provas em livros anteriores.
...mas, isso é largamente (compensado) por ele ter feito desta obra (autobiográfica) uma bela declaração de amor à banda desenhada.

Não se depreenda do que escrevi acima que o tom deste livro é sorumbático ou até depressivo - apesar de o ser (ou espelhar) a espaços - porque o humor, sempre presente na obra de Derradé, também perpassa por ele - e até em momentos bem conseguidos e contagiantes.

Mas, fundamentalmente, esta obra “autobiográfica fictícia pós-apocalíptica viral” - como ela própria (e muito bem) se define - é antes de mais uma afirmação de fé de Derradé em si próprio, a promessa de continuar a ser autor como garantia de sanidade mental e uma emotiva declaração de dedicação eterna à banda desenhada.

À boleia da pandemia - transformada em cenário pós-apocalíptico de forma interessante, pelas reflexões que provoca - Derradé aproveita para mergulhar no seu próprio passado, narrando - em nome próprio e de tantos que viveram situações similares - um capítulo (o seu, felizmente ainda inacabado) da história da banda desenhada em Portugal, onde podemos rever e/ou reconhecer situações recorrentes no meio e muitos daqueles que viveram ‘por dentro’ (d)a banda desenhada portuguesa nas décadas recentes.

O mérito de Derradé, é a forma como consegue expor-se, com a falsa aparência de não se levar muito a sério, mas sem deixar de se afirmar nas suas convicções, sem cair na auto-comiseração ou na facilidade de apontar as culpas aos outros.

E, acima de tudo, por, depois de fracassos e desilusões, de afastamentos e adeuses (supostamente definitivos), ter sido capaz de ultrapassar tudo e voltar, pelo seu amor à BD, pelo direito ao humor e como afirmação de autor que quer ter voz activa.

Este livro, prova-o. Os (seus) leitores, agradecem.


O Fogo Sagrado
Derradé
Escorpião Azul
Portugal, Outubro de 2021
170 x 240 mm, 72 p., pb, capa cartão com badanas
12,50

(imagens disponibilizadas pela Escorpião Azul; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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