Fascinação
‘De Silver nunca mais se ouviu falar.’
R. L. Stvenson, in A Ilha do Tesouro
Ao
longo de décadas de leituras, são muitas as personagens que nos
marcaram, que nos fascinaram e deixaram uma marca indelével. Pelo
seu heroísmo, humor, ternura, disponibilidade, coragem, solidão,
crueldade, predisposição para o mal…
E,
muitas delas, com certeza, ficaram bem para lá do momento em que,
terminada a leitura, encerramos o livro. Deixando o desejo de saber o
que lhe(s) aconteceu depois, o que foram
as suas vidas
após a malfadada palavra ‘FIM’…
Long
John Silver,
de Mathieu
Lauffray
e Xavier
Dorison,
recusando
ser uma continuação de A
Ilha do Tesouro,
imagina
o que se passou com o pirata John Silver, depois dos acontecimentos
narrados por Robert Louis Stevenson.
Para muitos, aliás, esta personagem dúbia, tão capaz de gestos carinhosos quanto das maiores chacinas é o verdadeiro protagonista daquele romance e é em torno dele - e não do jovem Jim Hawkins - que tudo gira. Visão impossível na época, quando os bons eram compensados e os maus castigados, mas perfeitamente aceitável nos dias de hoje em que entre o preto e o branco há uma imensa gama de cinzentos… Pelo menos enquanto o ‘politicamente correcto’ não for lei absoluta.
O arranque da narrativa, neste primeiro dos quatro volumes da colecção ASA/Público em curso, para lá do motivo em si que a desencadeia, uma viagem às Américas, em busca de uma das fabulosas cidades douradas de Incas ou Astecas, tem muito em comum com o romance original, fazendo, por isso, a ponte perfeita entre aquela obra e esta divagação aos quadradinhos.
É verdade que em primeiro plano, surge a devassa lady Vivian Hastings que, caída na pobreza e grávida, após a prévia partida do marido em busca da tal utopia, após receber uma carta do conjugue que julgava morto e agora a condena ao convento, decide, numa clara fuga para a frente, partir, não em busca dele mas sim do tesouro. E para isso, alia-se a Long John Silver, com a intermediação, entre o forçada e o voluntária, de um certo doutor Livesey.
Neste volume, longo intróito em que Vivian, Livesey e Silver surgem já como personagens centrais bem delineadas e caracterizadas e este último exibe de novo o fascínio já mostrado em A Ilha do Tesouro, ficam assim lançadas as bases para (mais) uma grande aventura, comentada em off e mostrada ao vivo, de uma forma crua e sórdida que garante que não haverá limites.
Graficamente, Lauffray apresenta um traço duro e agreste, adequado ao tom geral do relato, mas aqui e ali já ostenta algumas belas composições de página, daquelas que o fizeram um dos autores a seguir actualmente, ficando a garantia que, neste particular, os próximos volumes serão (ainda) mais deslumbrantes.
Long
John Silver #1
Lady Vivian Hastings
Xavier
Dorison e Mathieu Lauffray (argumento)
Mathieu
Lauffray (desenho)
ASA/Público
Portugal,
Setembro
2021
240
x 320
mm, 68
p.,
cor, capa dura
10,90
€
(imagens disponibilizadas pela ASA; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
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