Um grande amor ao sabor das vagas
Com "uma lata de sardinhas em óleo" como mote, que a edição original francófona, de cantos redondos emulava bem mais do que a portuguesa, Um Oceano de Amor, recém-editado pela ASA, é uma bela e emotiva história de amor.
A abrir, a vida dura dos pescadores: acordar cedo, comer um 'bucha', despedir-se da mulher e partir para o mar. Com sol ou com chuva. Com vontade ou sem ela. E com a detestada lata de sardinhas em óleo para o almoço.
E esperando que ao fim do dia, o regresso ao porto de abrigo, a casa e à mulher que o espera, seja uma realidade.
Porque existe esse outro lado da moeda, por vezes esquecido, a vida da mulher de pescador que fica em casa ou no cais, de coração nas mãos, rezando aos santos da sua devoção, pelo regresso do seu companheiro.
Até à vez em que, à hora habitual, nas horas seguintes, um dia depois, ele não regressa. E passado o primeiro choque, as emoções descontroladas, o cérebro que desdiz o coração, a mínima esperança faz da mulher um furacão, capaz de levar tudo à frente.
Mas, nesta história, que é bem mais do que até aqui aparentou, que liberta ternura, bom humor e "daquilo que aumenta o coração", como alguém cantava, há ainda espaço para uma gaivota temperamental com uma costela ecologista, para um alerta contra a pesca exaustiva e outro relativo à crescente poluição dos mares. E até, sendo intemporal, sem precisar datas, há igualmente lugar a uma figuração de Fidel Castro, ele mesmo.
Mas, o grande achado de Um Oceano de Amor é que a história é narrada sem uma única palavra, sem um único balão de fala, deixando ao desenho expressivo, agradável e muito dinâmico, a tarefa de mostrar ao leitor o que vai acontecendo, como tudo se vai passando. Mais do que isso, conhecendo em simultâneo o que se passa no mar revolto e na Bretanha natal, abre-se à sua interpretação única e personalizada, o que garante que não existem duas visões iguais deste relato, numa bela demonstração das amplas potencialidades narrativas da banda desenhada
No final, se é verdade que se diz que "a fé remove montanhas", Um oceano de amor vem demonstrar que este sentimento faz cruzar os oceanos e ultrapassar todos os medos.
Um
oceano de amor
Wilfrid
Lupano
(argumento)
Grégory
Panaccione
(desenho)
ASA
Portugal,
Fevereiro de 2025
206
x 275 mm, 224
p., cor,
capa mole
24,90
€
(versão revista do texto publicado na edição online do Jornal de Notícias a 7 de Março de 2025 e na edição em papel do dia seguinte; imagens disponibilizadas pela ASA; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
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