18/09/2017

jardim de inverno

Sozinho na multidão







A solidão das grandes cidades e os encontros e desencontros que a vida proporciona - ou que nós nos proporcionamos na vida… - são os temas centrais deste melancólico e chuvoso jardim de inverno.
É a história de Sam - um Sam como tantos outros, com tantos outros nomes, que existem por toda a parte em cidades (com ou) sem nome como esta - barman de ocupação e solitário a tempo inteiro.
Solitário apesar dos músicos amigos que tocam no bar onde trabalha - mas que nunca ouviu porque “a ideia de ficar a divertir-me no local de trabalho não entusiasma…”.
Solitário apesar da relação que mantém com a bela Lili - solitária também ela, apesar da sua capacidade de perseguir os sonhos em que acredita.
Solitário porque busca em momentos fugidios o companheirismo, a interacção, o contacto, a partilha de que geralmente foge.
Solitário porque os pais não são mais que uma memória de quem se refugia.
Solitário porque tem medo de perder o (nada) que a solidão lhe traz, porque tem medo das implicações que a companhia pode trazer.
Solidão que começa a mudar - que começa a ponderar mudar, mesmo sem o saber - no dia em que uma infiltração de água vinda do apartamento de cima o obriga a contactar o vizinho, mais um solitário, só e marcado pelo tempo e pela vida, que o vai confundir com o filho e levar - forçar? - a abrir portas que considerava fechadas para sempre.
O argumento triste e melancólico de Renaud Dillies, é o retrato pungente de uma realidade que todos (re)conhecemos - mesmo quando na sua história - cinzenta - marcada por tons cinzentos e frios - e impessoais, irrompe um raio de sol e inesperados tons de verde (alegria, esperança) tão inesperados quanto o que, a par de Sam, o leitor vai descobrir - maravilhado.
É tudo isto - e o mais que esta minha leitura de jardim de inverno não mostra - que Grazia La Padula passou para o papel, com um traço fino que, não sendo bonito nem chamativo é servido por belíssimas e ajustadas cores e se mostra ideal para contar esta história. E é com ele que (nos) transmite toda a carga emocional que impregna o relato, fazendo de um livro fora das habituais classificações de estilo ou de género, uma leitura delicada e cativante, tocante e forte.

jardim de inverno
Renaud Dillies (argumento)
Grazia La Padula (desenho)
Kingpin Books
Portugal, Março de 2017
203 x 278 mm, 64 p., cor, capa dura
16,20 €

(imagens disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

1 comentário:

  1. Pedro Ferreira19/9/17 00:08

    Um dos bons álbuns que li este ano de 2017. Excelente oportunidade para apreciar o que de melhor oferece a nona arte.

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