26/08/2025

O Vento nas Areias

Lugar ao descanso, às viagens e à descoberta


'Numa viagem, tal como na vida - e não é a vida uma viagem? - temos de nos deixar ir ao acaso, abandonarmo-nos, para que surjam os encontros com pessoas, com lugares, com momentos, e para que o mundo se entreabra'
In O Vento nas Areias


Sendo, sem dúvida, uma leitura para os mais novos, que serão seduzidos pelo humor, as personagens divertidas e as constantes surpresas, O Vento nas Areias, mesmo cumprindo esse propósito plenamente, será sempre muito mais do que isso.

Dará muito mais aos adultos que se deixarem levar pela ternura do relato, pela ode à amizade e pelos subentendidos e comentários sobre a personalidade das personagens dos protagonistas que, sendo animais - Rato, Sapo, Toupeira, Texugo... - espelham à saciedade o que são os seres humanos e abordam temáticas tão sérias como orgulho descabido, a ilusão da auto-suficiência, as crises de meia-idade, a dificuldade de ser generoso ou o lidar com a perda.

Depois da muito oportuna reedição, em forma de integral, de O Vento nos Salgueiros, a Arte de Autor leva-nos de novo ao universo criado por Kenneth Grahame no traço de Michel Plessix, num volume que reúne os cinco álbuns originais do segundo ciclo das movimentadas aventuras daqueles animais.
Após explorarem os recantos do bosque em que habitam, desta vez, no final do verão antes das chegada do outono e depois do inverno que obriga muitos a partirem para outras paragens, o Rato, contrariado, o sapo e o Toupeira partem de forma inesperada e involuntária para o outro lado do mundo, para terras de árabes e desertos, onde os costumes, as crenças, os hábitos e a forma de estar são bem diferentes.

A leitura vai dividir-se entre o belíssimo traço de Plessix, que dota as suas personagens de um aspecto agradável e cativante e os cenários de um realismo mágico, o belíssimo trabalho de cor, a narração de sucessivas idas e vindas atribuladas, a excitação da procura do tesouro que os vai nortear, os sucessivos apontamentos de humor - protagonizados pelas moscas, os camelos... - espalhados pelas pranchas, que obrigam a uma atenção redobrada, e os grandes espaços por onde passeiam os protagonistas, misteriosos e desconhecidos, recorrentemente transformados em oásis de sonho, numa narrativa que transmite enorme serenidade em contraste com um ritmo enganadoramente inebriante.

Com diálogos ricos, as descrições necessárias para situar no tempo e no espaço o relato e as reflexões interiores de cada um, O Vento nas Areias revela-se uma leitura apaixonante e sedutora e também um convite ao descanso, às viagens e à descoberta, ideal para leitores cansados de um ano de trabalho que se sentem levados como que "num sonho acordado", como, em contexto bem díspar, cantava Fausto.


O Vento nas Areias - integral
Michel Plessix, segundo Kenneth Grahame
Arte de Autor
Portugal, Maio de 2025
236 x 285 mm, 160 p., cor, capa dura
37,50 €

(versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias, na página online e na versão em papel, a 16 de Agosto; imagens disponibilizadas pela Arte de Autor; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...