20/10/2010

Snuff #1 – La mélodie du bonheur

Philippe Nihoul (argumento)
Xavier Lemmens (desenho e cor)
Delcourt (França, septembre 2010)
240 x 320 mm, 48 p., cor, cartonado)

Resumo

Ethan Fargo vive desiludido desde o acidente em que perdeu a mulher e a filha. Arrasta-se pelas ruas de Brooklyn proclamando o seu ódio aos pombos e ao golfe e tendo como único centro de interesse as comédias musicais.
Mas tudo vai mudar no dia em que, (não) por acaso, se vê envolvido roubo num estranho e violento.

Desenvolvimento
Este não é um álbum para ser levado a sério – linearmente – porque falha no argumento, que tem alguns pontos obscuros. Desde logo e principal : o que leva Ethan a ser escolhido e a aceitar a missão que lhe é proposta? Pontos obscuros que poderão vir a ser (ou não) esclarecidos nos dois restantes tomos previstos.
De qualquer forma, merece ser lido porque a sua história, desbragada e muitas vezes divertida é, antes de mais, uma homenagem/piscar de olhos a realizadores como Tarantino, ao policial negro tradicional, a uma certa cultura – actual e muito presente a diversos níveis – de hiper-violência. Por isso, preparem-se leitores para muitos tiros e cenas violentas, com destruição a rodos e cérebros, braços e pernas a explodir. Num relato que - ironia maior… - tem como base um ‘snuff movie’ - filmes, geralmente artesanais, com cenas reais de tortura e assassinato, filmados de modo cru, sem quaisquer efeitos especiais.
A emoldurar tudo isto, está uma interessante – apesar de baseada em estereótipos reconhecíveis… - galeria de personagens. O protagonista, Ethan Fargo, é alguém que bateu no fundo e não tem vontade nem motivos para voltar à superfície, que desperdiça o seu tempo lançando bolas de golfe para o mar, insultando os pombos que pousam no beiral da sua janela ou vendo comédias musicais, a única coisa que ainda o anima (e faz viver ?).
A meio do álbum, primeiro envolto num manto de mistério, depois revelando-se (ou será que o argumento ainda nos vai surpreender por aqui ?), surge Alejandro Gutierrez, ex-membro proeminente de uma ditadura da América Latina cuja filha enveredou por veredas revolucionárias e acabou como protagonista involuntária do tal snuff movie; por isso, Guttierrez, magnata sem escrúpulos, pretende contratar Ethan para o vingar, tendo começado por apagar o seu passado e dar-lhe uma nova identidade.
Ao seu serviço (será… ?) está ‘Ismael’, o assassino impiedoso e violento que fala por citações bíblicas e se apresenta como anjo protector de Ethan, desenrascando-o por mais de uma vez. E que, a espaços, parece até mais (talhado para) protagonista do que Ethan.
Em segundo plano, mas com papéis relevantes em cenas específicas, surgem dois meliantes trapalhões e pouco dotados, o dono e o amigo da loja de DVDs que Etah frequenta e um tenente da polícia da tal ditadura latina, habituado a trabalhar ao ritmo do cassetete e dos subornos.
Com eles, de forma sarcástica e mordaz, onde se multiplicam referências e piscadelas, Nihoul desenvolve uma história desenvolvida em ritmo moderado – para dar tempo para a violência crescer e o sangue jorrar?! – suficientemente divertida e interessante para dar vontade de (pelo menos) ler o próximo tomo.
O traço de Lemmens, primeiro motivo para me interessar pelo álbum, é uma linha clara dinâmica mas angulosa, que tem por base uma planificação tradicional, mas com a qual o desenhador consegue transmitir o ritmo desejado. E onde se encontram alguns bons achados como o tratamento gráfico de Ismael ou o bom trabalho ao nível da cor, baseada em tons maioritariamente frios, mesmo quando predominam os vermelhos e os amarelos, bem utilizada para definir e destacar em cada pranchas apenas os pontos fulcrais.

A reter
- Confesso-me fã deste género de traço, uma espécie de linha clara dura que evoca o grande Serge Clerc, embora sem a sua elegância.
- O humor dos diálogos, bem conseguidos.
- Posso enganar-me, mas este tríptico ainda reserva algumas reviravoltas surpreendentes.

Menos conseguido
- Pode vir a ser explicado nos dois tomos previstos para a conclusão de Snuff ou até ser desnecessário tendo em conta o espírito do relato, mas neste primeiro volume as razões para a escolha de Ethan como braço vingador e a sua aceitação da tarefa são de todo obscuras e até pouco credíveis.

Curiosidade
- É bastante estranho nos dias que correm, mas para além das (poucas) cenas em que a filha de Gutierrez é torturada e morta e de figurantes completamente anónimas que apenas servem para preencher umas poucas vinhetas, nas páginas de Snuff – até agora - não há uma única personagem feminina.

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