Ser surpreendido, continua a ser um dos prazeres que a leitura [de BD] me provoca. Depois da agradável surpresa que foi No caderno da Tangerina, Rita Alfaiate volta a surpreender[-me] com uma história cujos ecos que me tinham chegado primavam pela dissemelhança de opiniões.
[Conselho:
(re)leiam No caderno da
Tangerina
antes de se embrenharem na descoberta de Tangerina.
Acreditem que fará toda a diferença.]
Aquela, era a história de Spike e
Tangerina, dois adolescentes claramente desadaptados numa sociedade
que prima pelo desejo de normalização global, assente na interação
difícil entre ambos, nos segredos que escondiam e nos monstros que
os atormentavam. Narrativa aberta, com interpretação livre deixada
a cargo do leitor, revelou-se uma das boas surpresas da (jovens) BD
nacional no ano passado.
Dividido
entre a boa impressão - e as consequentes altas expectativas - e os
ecos díspares, abri
Tangerina com
algum receio e a primeira constatação
foi que o desenho, se perdeu alguma da ingenuidade sedutora que
apresentava antes, fruto do ganho de maturidade que um segundo livro
- e algumas curtas - proporciona(m), tornou-se mais seguro e há um
melhor e mais proporcional preenchimento das vinhetas, de onde
desapareceram os fundos vazios que se multiplicavam na obra original,
No caderno da Tangerina.
A
par disso, mantém a mesma agilidade e uma planificação variada e
dinâmica.
De seguida, surgiu uma impressão de
estranheza, de déjá vu,
pois as cenas iniciais eram as mesmas do livro anterior. Uma
comparação entre pranchas, permitiu descobrir rapidamente o
‘segredo’: as cenas eram as mesmas, mudava o protagonista - que
alterna entre Spike e Tangerina - ou seja, a mesma história é agora
contada de um ponto de vista diferente.
O que no primeiro livro víramos pelos olhos dele, agora é-nos
apresentado por ela.
Se
é verdade que esta opção de Rita Alfaiate acabará por anular a
liberdade interpretativa que o primeiro livro concedia, a maneira bem
conseguida como
ela preenche os hiatos existentes e desvenda os segredos que
permaneciam ocultos na primeira parte, contando
uma outra história com (praticamente) as mesmas premissas,
tornam este díptico uma leitura estimulante, interessante e
aconselhável.
Tangerina
Rita Alfaiate
Escorpião Azul
Portugal, Maio de 2019
160 x 230 mm, 80 p., pb, capa mole
com badanas
11,50 €
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