Chegados a 1987-1992 e ao volumoso livro que
nos resume mais cinco anos da vida de Riad Sattouf, apetece escrever
que, não trazendo nada de novo, continua a revelar um pedaço da sua
- e também já nossa - história de vida, de forma consistente,
convincente e irresistível. Porque, quero ser claro, o grande mérito de
Sattouf é - mais do que aquilo que conta, a forma como o sabe
contar.
Arriscando-me a chocar alguns, confesso aqui e
ali alguma falta de paciência para a imagem de perpétuo
desgraçadinho que o Riad de papel ostenta: filho de pais separados -
pelo espaço, a cultura e a religião (ou a ausência dela) - com o
pai árabe entre o alheado e o radicalizado, a mãe cancerosa, o
bullying que sofre nas escolas - a francesa e a Síria - e
desenraizado - naquele país árabe é branco e judeu; em França,
escuro e árabe, parece - qual Calimero chorão - a vítima número
um de todas as desgraças, parecendo que não há nada que não lhe
aconteça…
Mas, suplantada essa irritação que já vem de
trás, há em O Árabe do Futuro
todo um mundo - dois mundos em choque, para ser mais exacto - para
descobrir, num retrato social que, não esquecendo a parcialidade
inevitável de quem narra o que viveu (segundo os seus olhos), é bem
revelador de uma realidade que sendo mais evidente em França, está
aos poucos a crescer também entre nós
As diferenças sociais e culturais, o estar
dividido entre a religião ritualista e (até) fanática do pai e o
ateísmo da mãe, a inevitabilidade de ser agora adolescente, com
todas as mudanças físicas e psicológicas que isso acarreta a
acrescentar a tudo o mais, a dificuldade de encontrar um lugar para
si nos diferentes meios, onde se sente - e é! - sempre o divergente,
o discrepante, o distinto, fazem do Riad Sattouf de papel - à imagem
e semelhança do que aconteceu (certamente?) ao de carne e osso, pese
embora a distorção espelhada com que este eventualmente se
reflectiu naquele… - um autentico ‘tolo no meio da ponte’ sem
saber ao que se agarrar, o que escolher, como se afirmar, em que
direcção seguir.
…sem que o leitor, seja capaz de (o)
abandonar (n)uma leitura em que coexistem um realismo terno, um humor
triste e um retrato fiel, embora esbatido e atenuado, de alguns dos
grandes problemas das sociedades multi-culturais e multi-raciais cada
vez mais disseminadas.
O Árabe do Futuro #4
Ser Jovem no Médio Oriente 1987-1992
Ria Sattouf
Teorema
Portugal, 1 de Setembro de 2020
240 x 171 mm, 280 p., cor, capa mole com
badanas
23,90
€
(imagens
disponibilizadas pela Teorema; clicar nelas para as aproveitar em
toda a sua extensão)
AVISO Á NAVEGAÇÃO - confirmem se o vosso exemplar não está marcado por água ou humidade num carderno (note-se no corte superior do livro com papel enfolado). Reparei nisto ontem na Feira do Livro - todos os exemplares estavam assim...
ResponderEliminarDeverão ser exemplares circunscritos à Feira, é por isso que não gosto muito de feiras do livro, o pessoal todo a manusear enquanto come gelados e outras coisas e suja tudo e depois o arrumar e voltar a colocar nas bancas.
ResponderEliminar@Superbeasto Infelizmento o defeito é de produção e não de manuseamento o que indica uma evidente falta de cuidado no acompanhamento da mesma. Num volume recente com preço de capa de quase €24, convenhamos que é, no mínimo confrangedor. Só espero que a restante tiragem não sofra do mesmo problema...
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