16/03/2012

MAB Invicta (III)

Local: Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto - Av. Rodrigues de Freitas, nº 265 (junto à Biblioteca do Porto, no Jardim de São Lázaro)
Data: 17 e 18 de Março de 2012
Horário: a partir das 10h30











Exposições
- Exposição de impressões de boa qualidade de páginas inéditas do Tex Gigante da autoria de Fabio Civitelli, a ser lançado na Itália em Julho deste ano, na série Tex Gigante, escrita por Mauro Boselli “La cavalcata del morto“.
- Homenagem póstuma a Sergio Bonelli com fotografias deste autor/editor nas viagens que fez e com texto de José Carlos Francisco, principal dinamizador da personagem Tex em Portugal.
- Sama - Exposição inédita de originais, prints e serigrafias deste novo e grande artista brasileiro.

Bancas presentes
- Invicta Indie Arts;
- FNAC;
- Editora Asa;
- Fabio Civitelli com o seu livro italiano “Il Mio Tex”
- Editor Dorival Vítor Lopes, da Mythos Editora, com o livro somente distribuído no Brasil: “Tex - A História da Minha Vida”
- Geral e Derradé com os seus livros editados pela Polvo.

Preço dos Bilhetes
- 3,50€ por dia
- 6,00€ sábado e domingo

Autores Presentes
Fabio Civitelli
Geral
Derradé
Rodolfo
Rui Dias de Sena

Presença do editor Dorival Vitor Lopes da Mythos Editora e da tradutora oficial do personagem Tex: Tizziana Giorgini

Fabio Civitelli, durante os dois dias em que estará presente no MAB Invicta, mostrará a todos os interessados outras belas páginas, trazidas por si, da história em exposição no evento, assim como as provas da capa dessa mesma história.
Fabio Civitelli terá também para mostrar a todos os fãs e admiradores todas as páginas (18) da nova história que já está a desenhar, que será publicada a cores em 2014 e cujo título provisório é “Delta Queen”.
Aos primeiros 100 interessados, Fabio Civitelli autografará o desenho de sua autoria, que mostra Tex num duelo na zona ribeirinha do Porto, num presente especial do desenhador italiano aos seus fãs que comparecerem no evento.

Programação
Nota: Devido a atrasos na programação do MAB no passado fim-de-semana, irão ser exibidos os seguintes filmes:
-15h30: Animações do projecto “Dialectus”: “No Mundo da Lua” e “Zeca e Zuzzie (1º episódio) e teledisco “Dead Soldiers”.
-16h00: Exibição do filme “Vinzent” do realizador alemão Ayassi, vencedor do prémio do jurí da crítica do Festival Internacional de Cinema Fantasporto em 2005 com introdução de Manuel Espírito Santo.



15/03/2012

John Carter






John Carter (2012)
Realização: Andrew Stanton
Intérpretes: Taylor Kitsch, Lynn Collins, Samantha Morton, Willem Dafoe, Thomas Hadden Church, Mark Strong, Bryan Cranston, David Schwimmer, Jon Favroeau
Duração: 132 minutos
Distribuição: ZON Lusomundo









John Carter: A Princess of Mars #1 a #5
Roger Langridge (argumento)
Filipe Andrade (desenho)
Marvel Comics (EUA, Novembro de 2011 a Matrço de 2012)
170 x 260 mm, 32 p., cor, comic-book
$ 2,99 US




Estreia hoje nos cinemas portuguesas o filme John Carter, inspirado no romance Under the Moons of Mars, da autoria de Edgar Rice Burroughs, publicado em 1912.

Esta estreia, acontece em simultâneo com a publicação do último dos 5 números da mini-série “John Carter: A Princess of Mars”, que o português Filipe Andrade desenhou para a Marvel a partir de um argumento de Roger Langridge, que de alguma forma serviu para recordar o universo fantástico que Burroughs, igualmente criador de Tarzan, desenvolveu ao longo de 10 romances.



Na base da história, que se inicia após o fim da Guerra da Secessão norte-americana, está o capitão John Carter que, perseguido por índios tem que se refugiar numa caverna de onde – de forma díspar na BD e no filme – acaba por ser transportado para o planeta Marte (cujos habitantes chamam Barsoom).

Aí, começa por descobrir que as suas capacidades físicas foram extraordinariamente aumentadas devido à diferença de gravidade, ao mesmo tempo que vai conhecendo as diversas civilizações marcianas que caminham em passo acelerado para a extinção, num planeta árido e quase deserto onde as raras cidades ainda existentes pouco mais são do que sombras de um passado glorioso.

Capturado primeiro pelos Tharks, gigantes verdes com cerca de 3 metros de altura e dois pares de braços, Carter acaba por conhecer a bela Dejah Thoris, princesa de Hellium, por quem se apaixona e a quem vai ajudar na sua luta pela libertação e preservação do planeta.

Se é a primeira vez que o cinema se ocupa desta obra de Burroughs – depois de uma tentativa em 1966, frustrada pelos custos envolvidos – este herói já vive aventuras nos quadradinhos desde 1939, primeiro no formato comic-book, depois nos jornais, onde chegou a ser desenhado por John Coleman Burroughs, filho do romancista.

Na banda desenhada, ao longo dos anos sucederam-se as adaptações e aventuras originais, umas mais conseguidas do que outras – incluindo uma estranha derivação que juntava três criações de Burroughs: John Carter, Tarzan e os heróis de Pellucidar (um mundo interior terrestre ainda habitado por dinossauros) – onde se podem encontrar as assinaturas de Gray Morrow, Jesse Marsh, Al Williamson ou Murphy Anderson, enre outros. A versão desenhada por último foi publicada em Portugal no Mundo de Aventuras, em 1974/1975 e, posteriormente, em álbum pela Agência Portuguesa de Revistas.

Se o ponto de partida – e o de chegada também - é o mesmo para as duas versões hoje em análise, a forma como desenvolvem as respectivas histórias, os locais em que a acção decorre e as personagens que exploram apresentam diferenças significativas - o que só abona a favor da imaginação de Burroughs - devendo, por isso, ser visto/lido mais como criações complementares do que como a mesma versão em suportes diferentes.
 
À BD, assente em tons bastante sombrios e onde eventualmente poderia haver cenas com cores mais fortes, apesar de menos pormenorizada, há que reconhecer um ritmo mais elevado, graças também ao facto de entrar directamente na trama, utilizando depois sucessivos flashbacks para contar o passado terrestre de Carter. A narrativa é bem explanada pelo traço esguio e anguloso de Andrade, como habitualmente muito dinâmico embora não muito detalhado, e assenta especialmente nos diálogos entre as personagens e nos combates individuais individuais, em detrimento de cenas de conjunto mais espectaculares ou de grandes combates aéreos.

No filme, que actualiza (e bem) alguns dos conceitos originais, criados há já 100 anos – como é o caso da questão das deslocações entre a Terra e Marte - depois de uma introdução algo longa e com pouco ritmo, que narra os antecedentes terrestres do protagonista, com a chegada a Marte, o filme ganha ritmo e consegue então prender o espectador, apesar das duas horas e pouco que dura.

Comum ao traço de Andrade e ao grafismo do filme são os corpos longos e esguios dos Tharks e os seus longos dentes (presas?), muito bem utilizados numa cena em que um rival afronta Tars Tarkas, que combinam bem com a decadência que reina em Barsoom.

O mesmo já não se pode dizer das naves espaciais que os diversos povos índigenas utilizam pois, apesar de visual e aerodinamicamente interessantes - claramente inspiradas em insectos voadores – se apresentam demasiado frágeis e pouco credíveis no contexto de decadência já citado, mesmo enquanto herança de tempos passados.

Mas isto – bem como o comportamento caricatural e demasiado canino de Woola, o monstro de estimação de John Carter – são questões menores numa película que cumpre bem o papel de diversão assumido, no qual as imagens computorizadas e o 3D, sem deslumbrar, estão bem conseguidos e são funcionais, quer nas cenas mais povoadas, quer para definir a profundidade das cenas em grandes espaços abertos, contribuindo decisivamente para recriar na tela o imaginativo universo que Burroughs criou.

Sem brilhar intensamente mas também sem comprometer, os intérpretes sustentam bem os seus papeis, sejam eles os seres humanos ou aqueles gerados em computador, com destaque para os tharks cujos dois pares de braços funcionam muito bem no filme, ao contrário do que tantas vezes tem sucedido nos quadradinhos, onde frequentemente parecem um empecilho e um quebra-cabeças para os desenhadores.

Curiosamente, se a Marvel já anunciou uma sequela em BD, a mini-série “John Carter: The Gods of Mars”, por Sam Humphries (argumento) e Ramón Pérez (desenho) já para este mês, a Disney, que foi comedida na promoção do filme, tem-se mostrado mais discreta quanto a uma continuação, apesar do elevado investimento feito (cerca de 250 milhões de dólares), o que não deixa de ser algo surpreendente. Ou talvez não, porque os primeiros resultados não foram animadores, tendo o filme arrecado apenas 30 milhões nos EYA, embora de alguma forma compensados com os 70 milhões no exterior daquele mercado.

Indiscutível é que no universo criado por Edgar Rice Burroughs há muito mais para explorar.





14/03/2012

Yeshuah









Assim em cima assim embaixo
O círculo interno o círculo externo
Laudo ferreira (argumento e desenho)
Omar Viñole (arte-final)
Devir Livraria (Brasil, Dezembro de 2009 e Agosto de 2010)
165 x 240 mm, 160 p. e 136 p., pb, brochado
R$ 23,00 / R$ 22,50



Resumo
Biografia ficcionada da vida de Jesus Cristo, assenta numa profunda pesquisa bibliográfica não só das tradições católicas e dos evangelhos canónicos mas também de escritos apócrifos.
O primeiro tomo aborda desde a concepção e nascimento de Cristo até ao seu encontro com João Baptista e o segundo mostra a sua permanência no deserto durante 40 dias, o estabelecimento e consolidação do seu ministério e o seu primeiro encontro com Judas Iscariotes.

Desenvolvimento
São muitas as biografias de Jesus Cristo existentes, umas mais romanceadas do que outras, o que não deve surpreender numa sociedade ocidental que se diz cristã e seguidora dos seus ensinos - embora a prática o demonstre muito pouco…
E nos últimos anos, de forma recorrente, também por culpa do sucesso mediático de algumas delas, temos mesmo assistido a uma proliferação de obras, potencialmente polémicas, que, mais do que colocar em causa Cristo, têm questionado a imagem que ao longo dos séculos a Igreja Católica foi (de)formando dele.
Este tríptico de Laudo Ferreira e Omar Viñole – o terceiro tomo e último tomo deverá ser editado no segundo semestre do corrente ano – pode bem encaixar-se nesta (abrangente) corrente criativa.
Não porque se adivinhe ou perceba nele a vontade de chocar, não porque se apreenda alguma intenção de polemizar, mas porque, para o preparar, Laudo Ferreira documentou-se - de forma série e aprofundada – em grande número de obras – históricas, canónicas e apócrifas - indo bem mais além da visão tradicional de todos mais ou menos conhecida, ao mesmo tempo que contextualiza a sua narrativa numa época histórica precisa, da qual faz uma boa recriação gráfica.
Até porque, o seu intuito era – e conseguiu-o – humanizar as personagens ligadas aos eventos de que Jesus foi protagonista, primeiro Maria, a sua mãe, depois o próprio Jesus. Não só porque os apresenta como seres humanos com fraquezas, hesitações, problemas, questões e dúvidas em relação ao que deles é exigido, mas também porque os despoja dos traços místicos e/ou divinos que normalmente lhe estão associados.
Para isso, sem entrar em pormenorização de explicações para o que de sobrenatural existe na história tradicional cristã, Laudo Ferreira leva as personagens a procurarem no seu interior a força, as razões, as motivações para realizarem – nem sempre linearmente – os feitos que lhe são atribuídos – embora nalguns casos fique a dúvida de como conseguiram lá chegar, como no caso da cura do cego.
Com isso, consegue uma obra de grande densidade emocional, muito estimulante – que deve ser lida de espírito aberto, sem preconceitos – cujo conteúdo não é preciso aceitar mas cuja leitura pode até ajudar a afirmar as crenças daqueles que têm fé.

A reter
- O dinamismo gráfico de uma obra que obriga a leitura atenta e ponderada.
- A consistência da narrativa, apesar de afrontar questões profundamente enraizadas na cultura e no senso comum ocidentais.

Menos conseguido
- Apesar de contribuir para a credibilização da obra, a utilização dos nomes originais dos diversos intervenientes, se não fará grande diferença à maioria dos leitores - dado o desconhecimento geral da cultura bíblica nos nossos dias - poderá causar alguma confusão – e quebra do ritmo de leitura - àqueles que estão mais familiarizadas com a Bíblia.
- O baptismo de Jesus por João Baptista, no final do primeiro tomo, segue o modelo católico, com o despejar de algumas gotas na sua cabeça. Algo pouco credível, ainda mais devido à investigação e à contextualização da acção na sua época histórica, sabendo que a palavra “baptizar” no original significa “imergir, mergulhar”…


13/03/2012

L'île au Trésor









D'après le roman de Robert Louis Stevenson
Sylvain Venayre (argumento)
Jean-Philippe Stassen (sesenho)
Futuropolis (França, 9 de Fevereiro de 2012)
215 x 290 mm, 96 p., cor, cartonado
17,00 €



Resumo
A procura de uma fortuna em dinheiro, no estaleiro de uma obra parada, é o mote desta história actual, decalcada de “A Ilha do Tesouro”, de Robert Louis Stevenson.

Desenvolvimento
Um dos mais célebres romances de aventuras, “A Ilha do Tesouro”, de Robert Louis Stevenson, ao longo dos anos foi por diversas vezes objecto de adaptações aos quadradinhos, incluindo – pelo menos uma – em português, pelo mestre Fernando Bento.
Mais ou menos fiéis, mais ou menos possuídas do espírito original da obra, todas elas – acredito eu – se ativeram às personagens, à localização e à época que Stevenson definiu no original.
Até agora. Porque esta L'île au Trésor transporta para a actualidade a trama base do romancista, embora mantendo os nomes dos intervenientes bem como o seu objectivo: encontrar um tesouro. Só que enquanto aquele era um “tesouro” tradicional – arcas cheias de ouro e jóias, esquecidas numa qualquer ilha (mais ou menos) deserta – agora trata-se de malas cheias de dinheiro que deveria ser utilizado para pagamento de luvas e financiamento ilegal de partidos, esquecidas num imóvel que deveria já ter sido destruído para dar lugar a outro, mas cujas obras foram suspensas.
Tudo começa quando um estranho viajante chega a um pequeno café-restaurante onde aluga um quarto e pede para o avisarem se aparecer alguém a perguntar por si. Só que o acaso gosta de frustrar as convenções humanas e o (re)encontro com os seus perseguidores acaba por se dar, conduzindo à sua morte mas também ao desaparecimento do seu segredo nas mãos da pequena Jacquot, filha do dono do café, recém-órfã de mãe e pai.
Na continuação, tal como uma ilha no meio de um bairro suburbano, aquele estaleiro vai ser alvo do confronto entre dois grupos, um ligado à sociedade que quer recuperar o seu dinheiro, outro formado por habitantes locais que querem com ele refazer as suas vidas. Mesmo que isso possa não passar de uma ilusão ou ter um preço – em memórias e vidas humanas – demasiado alto a pagar.
Entre estes últimos está a pequena Jacquot, que vai descobrir como a vida pode ser dura e negra. Tão negra como a sua pele. Tão negra como os tons escuros e sombrios que Stassen escolheu para tratar a trama que Venayre lhe confiou, tornando mais duro e agreste o traço linha clara que é a sua imagem de marca, mas que aqui surge (quase) despojado das cores quentes e vivas que noutras obras o têm tornado mais agradável. Mas revelando-se igualmente eficaz na condução do leitor ao longo da história, durante a qual vai descobrindo – com surpresa – os paralelos entre a trama original e a que agora desfruta, sem o deixar esquecer que, apesar deles, esta é uma história – dura, violenta - nova, bem ancorada no nosso tempo.

A reter
- A interessante transposição da obra de Stevenson – das suas personagens, da sua estrutura original – para os nossos dias, colando-a a uma temática bem actual.
- O trabalho gráfico de Stassen, de planificação simples e tradicional, mas de uma elevada eficácia e legibilidade.

12/03/2012

Iznogoud Président








Les nouvelles aventures d’Iznogoud d’après Goscinny et Tabary
Nicolas Canteloup e Laurent Vassilian (argumento)
Nicolas Tabary (desenho)
IMAV Éditions (França, 21 de Fevereiro de 2012)
220 x 295 mm, 48 p., cor, cartonado
11,00 €



Resumo
Este álbum marca o regresso de Iznogoud, “o grão-vizir que quer ser califa no lugar do califa”, agora com uma nova equipa criativa: os argumentistas Nicolas Canteloup (humorista e imitador) e Laurent Vassilian (autor dos textos para Canteloup) e o desenhador Nicolas Tabary (filho de Jean Tabary, co-criador de Iznogoud juntamente com René Goscinny).
A filha deste último, Anne Goscinny, é a responsável pela publicação do livro, pelas IMAV Éditions.
Como é habitual na série, criada há 50 anos, Izonogoud pretende tornar-se califa no lugar do califa Haroun El Poussah, embora desta vez o caminho passe por… umas eleições presidenciais!

Desenvolvimento
Por isso, não pensem os leitores mais apressados após a leitura do título da obra que o grão-vizir virou costas à ditosa Bagdad e é um dos concorrentes às presidenciais francesas – para as quais, no entanto, possuía a estatura adequada…! – ou tem em vista a presidência lusa, pois as suas ambições não se coadunam com a reforma de miséria que esta paga!
Iznogoud, mais um dos muitos casos de retoma de heróis clássicos, em que a BD francófona é cada vez mais fértil – crise de criatividade ou procura do sucesso fácil? - mantém neste regresso as características que lhe são bem conhecidas: o desejo de poder a todo o custo, a invenção dos mais surpreendentes estratagemas para conseguir os seus fins, a fidelidade (não recompensada) do seu criado Dilat Larath, a pachorra e bonomia da califa…
A isto tudo, acrescenta uma grande dose de actualidade, sucedendo-se os gags em torno da (baixa) estatura de Sarkosy e da presença ao seu lado de uma grande mulher, os anacronismos como as referências ao Fez-bouc, ao Kentuky Freud Chicken, às greves (dos carrascos), à guerra do golf(o), à crise do petróleo, à crescente invasão chinesa do ocidente ou à psicanálise, a participação de Mario Bross e Barak Obama (aliás Yessoui Khan), escândalos sexuais (ou quase) e truques - baixos eleitorais – não, não é piada! - que alimentam os muitos trocadilhos e jogos de palavras que se em muitos casos fazem jus à (pesada) herança recebida de Goscinny, aqui e ali se revelam algo excessivos e mesmo desadequados do espírito da série.
A isto, pode-se acrescentar uma história equilibrada e construída de forma estruturada, apesar da progressiva perda de ritmo pela inclusão de demasiados pormenores e alguns excessos de texto, apesar do bom achado consubstanciado na personagem do Grande Lâkan (baseado em Jacques Lacan, psicanalista francês, 1901-1981), um psicanalista antes do seu tempo, cuja verve leva (quase) todos os seus pacientes a mudarem a sua vida e de objectivos e que surge como figura tutelar ao longo de toda a trama e com um papel bem determinante no seu desfecho devido ao seu desejo de… ser grão-vizir no lugar do grão-vizir!
 
A reter
- O humor presente na maior parte dos trocadilhos e jogos de palavras.
- A colagem à actualidade francesa, o que poderá ser, sem dúvida, (mais) um trunfo para o êxito desta obra no país de origem mas um óbice à sua tradução.


Menos conseguido
- O visual menos conseguido do califa Haroun El Poussah, que contrasta com o restante trabalho gráfico de Nicolas Tabary, equilibrado embora algo parco em cenários e pormenores.
- A perda de ritmo ao longo do livro e os excessos de texto já referidos.


11/03/2012

Jean Giraud/Moebius (1938-2012)









Jean Giraud, aliás Moebius faleceu ontem aos 73 anos, num hospital francês, onde estava internado há cerca de uma semana. Um cancro vitimou um dos maiores criadores que a banda desenhada já conheceu.
Natural de Nogent-sur-Marne, em França, onde nasceu a 8 de Maio de 1938, Giraud após publicar as suas primeiras bandas desenhadas e cumprir o serviço militar, em 1958 conheceu Jijé, de quem se tornaria ajudante na realização de Jerry Spring, e cujo traço emulou nos primeiros episódios das aventuras de um certo Tenente Mike Blueberry, criado com Jean-Michel Charlier, para a revista Pilote, em 1963.
Progressivamente, Giraud viria a encontrar o seu próprio estilo, realista, vigoroso, limpo e pormenorizado, impondo-se como um dos grandes desenhadores realistas da banda desenhada francófona. Após a morte de Charlier, em 1989, assumiria também os argumentos, despojando Blueberry do seu lado mais espetacular e da acção a rodos que eram a sua imagem de marca, para conferir um tom mais intimista, humano e místico ao mais importante western que a BD deu a conhecer.
Seria no entanto como Moebius, a sua segunda personalidade para a BD, revelada também a partir de 1963, que este criador de excepção se revelou um visionário, abrindo novas perspectivas e potencialidades à narração em quadradinhos. Assumindo um traço linha clara, límpido e luminoso, Moebius imaginou universos fantásticos, em que combinou ficção-científica, fantástico, policial e registos mais intimistas, como até então a BD nunca tinha visto.
Fundador da editora Humanoides Associés e da mítica revista Metal Hurlant, Jean Giraud/Moebius, entre muitos outros galardões foi distinguido com o Grande Prémio de Angoulême em 1981. Para lá da BD, participou na concepção gráfica e/ou no story-board de películas cinematográficas como Dune, Aliens, Maitres du Temps, Tron ou Starwatcher.
Com mais de 60 álbuns escritos e/ou desenhados, a solo ou em parceria com Jean-Michel Charlier, Alejandro Jodorowsky, Dan O’Bannon ou Stan Lee, Jean Giraud/Moebius foi um dos grandes criadores contemporâneos e a sua obra influenciou de forma indelével gerações de artistas gráficos.
Em Portugal, a estreia de Giraud foi promovida directamente em álbum pela Editorial Ibís, em 1969, com “Fort Navajo”, primeira aventura do Tenente Bluberry, que regressaria dois anos mais tarde, na revista Tintin. As suas aventuras foram integralmente publicadas em português, primeiro pela Meribérica e, mais recentemente, pela ASA numa parceria com o jornal Público.
Quanto a Moebius, estreou-se entre nós pela Futura em 1983, com a saga do Incal, estando igualmente editadas entre nós obras fundamentais como A Garagem Hermética, Arzach ou o Mundo de Edena.



10/03/2012

Death Note











#1. Aborrecidos
Tsugumi Ohba (argumento)
Takeshi Obata (desenho)
Devir (Portugal, Janeiro de 2012)
130 x 190 mm, 200 p., pb, brochado
9,99 €



Resumo
Shinigami, um dos lendários deuses da morte, deixa cair na Terra um Death Note – Caderno da Morte - que é encontrado por Light Yagami, um excelente estudante.
Qualquer nome escrito num Death Note leva essa pessoa à morte, de ataque cardíaco ou da forma que for descrita no caderno.
Yagami decide utilizar o Death Note para livrar o nosso planeta do mal, começando a matar assassinos e outros criminosos violentos, o que acaba por chamar a atenção das autoridades a nível mundial, que encarregam da sua investigação L, um investigador prestigiado cuja verdadeira identidade ninguém conhece.

Desenvolvimento
Por tudo o que já li sobre Death Note, confesso que este era um dos mangas que estava no topo da minha lista de preferências. A sua edição em português foi, por isso, uma excelente (surpresa e) novidade. E poderá ser mesmo um dos lançamentos do ano, assim a Devir lhe dê continuidade, editando em português, com regularidade os 11 volumes restantes.
Conhecendo apenas este primeiro tomo, confesso-me desde já rendido à obra de Ohba e Obata, mesmo se duas questões sensíveis ficam para já (quase) por aflorar: o direito de provocar a morte a outrem – a recorrente questão da justificação da pena de morte; a razoabilidade de combater o aborrecimento matando outros.
Porque, os dois protagonistas, Shinigami e Light, encontram-se extremamente aborrecidos (daí o título deste tomo), funcionando o Death Note como uma (estimulante) distracção para ambos. Distracção perigosa, sublinhe-se porque Light, apesar da aparente bondade das suas acções – erradicar o mal da Terra – no fundo quer tornar-se senhor absoluto do mundo e não hesita em eliminar mesmo os inocentes que se atravessem no seu caminho.
Apesar disso, o transformar do enredo essencialmente num relato policial – apesar do tom fantástico e de terror inerente – acaba por não desiludir de forma alguma, pois o argumento está extraordinariamente bem escrito e desenvolvido, não só pela forma como vai sendo exposto e aprofundado o funcionamento do Death Note, mas também pelas sucessivas surpresas e volte-faces que o argumento vai tendo, pela forma como Light explora as “instruções de uso” do Death Note.
Na verdade, o duelo de génios que se estabelece entre Light e L, assente sobretudo num enorme suspense, embora com alguma acção e um fundo de terror psicológico, tem tudo para prender e apaixonar mesmo aqueles que geralmente desdenham da banda desenhada vinda do oriente.
O desenho de Obata, que acompanha bem a trama, tem para mim um senão: o aspecto do deus da morte, demasiado caricatural, a fazer lembrar o Joker de Batman, nas suas versões mais espalhafatosas. O que contrasta com alguns apontamentos hiper-realistas que Obata vai introduzindo em momentos específicos para acentuar aspectos cruciais da história.
Mas pondo isto de lado, é de toda a justiça realçar a grande legibilidade do desenho, um bom tratamento ao nível do ser humano, uma planificação ponderada e diversificada, com grande variedade de planos e o bom uso de trama em páginas bem preenchidas que – contrariando o que tantas vezes acontece no manga – obrigam o leitor a demorar-se, assimilando (também) assim os pormenores – que são muitos - do argumento.

A reter
- A edição de Death Note em Português. Mais um contributo para a construção (?) de um nicho de mercado que a ASA iniciou com Dragon Ball e Yu-Gi-Oh?
- A excelência do argumento, sólido, consistente, bem estruturado e que recorrentemente surpreende o leitor.
- O clima de suspense e terror psicológico que perpassa pelas páginas de Death Note.

Menos conseguido
- O ar “apalhaçado” de Shinigami.
- A repetição das páginas 137 a 144.


Nota
- Apesar de este livro estar em português, a utilização de imagens em inglês para ilustrar este texto deve-se à impossibilidade de obter boas imagens no scanner sem destruir completamente o livro…

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...