12/12/2016

Paper Girls #1










De narrativa de fundo social a comic fantástico, este é o percurso traçado por Brian K. Vaughan neste primeiro volume de Paper Girls.

A história passa-se no final dos anos 1980, muito bem documentados ao nível das sucessivas referências que o argumentista espalha – e que a tradução teve o cuidado de explicar quando necessário - nos Estados Unidos, algures na América profunda, numa cidadezinha de Cleveland que poderia ser outra qualquer, ainda perdida em preconceitos sociais, sexistas e religiosos.
Como pano de fundo – e sombra sobre os americanos – há o conflito Irão/Iraque – e, em consequência, as relações tensas com a (ainda) União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).
As protagonistas são quatro adolescentes que desempenham uma função que geralmente – via filmes e séries de TV - associamos a rapazes: são entregadoras de jornais. Por isso, levantam-se de madrugada todos os dias, recolhem o molho de jornais à porta de casa, enrolam-nos presos com um elástico e vão de bicicleta lançá-los de porta em porta.
A história arranca na madrugada do Halloween e o primeiro capítulo - que corresponde ao primeiro comic – prenunciava uma orientação diversa, baseada na exploração dos tais preconceitos atrás referidos, outorgando-lhe um tom realista baseado na crítica social e no choque provocada pelas diferenças entre as protagonistas – aspectos que nunca abandonam a narrativa mas que deixam de ser os primordiais.
Erin, a mais jovem tem 12 anos, é católica (num contexto maioritariamente protestante) e anda num colégio particular devido à sua melhor condição económica.
MacKenzie , a mais velha, é a rebelde local; a única a frequentar o ensino público, fuma, lidera, é assediada pelas autoridades, foi pioneira como ‘paper girl’ e tem uma existência atribulada devido aos antecedentes de alcoolismo da mãe, que a obrigaram a formar um carácter forte e decidido. Tiffany é negra e também tem uma boa situação económica, tal como KJ, a judia ‘pagã’ e cérebro do grupo.
As quatro conhecem-se na sequência de um mau encontro entre Erin e três adolescentes apostados em divertirem-se – e algo mais? – à custa dela.
Findo o intróito de umas três dezenas de pranchas, no qual Vaughan traça um retrato já bastante completo do grupo e define as escalas de valores e de relacionamentos entre elas, o tom muda abruptamente e passamos a estar perante um relato de ficção científica quando a cidadezinha de Stony Stream é invadida e dominada (aparentemente?) por seres desconhecidos de aparência – e linguagem - estranha e assombrada por estranhas criaturas.
Começa então um relato (que se pressupõe) de resistência e sobrevivência, ainda com muito em aberto e imensas respostas por dar, apesar de Vaughan ir deixando aqui e ali pistas que permitem ao leitor intuir um pouco do que está a acontecer tal como a última prancha confirmará, o que no entanto não impede que no final do presente volume o leitor se sinta pouco menos que perdido face aos futuros desenvolvimentos. Aliás, Vaughan prima pela forma como (se vai divertindo) a surpreender o leitor, em especial no final de cada capítulo em que subverte tudo o que era dado por garantido.
O traço está entregue a Chiang – e reparem como Vaughan escolhe sempre excelentes desenhadores e este é mais um – senhor de um desenho desenvolto, agradável, expressivo e dinâmico e bem servido pelas cores de Matt Wilson apropriadas à madrugada em que decorre a maior parte da acção.
No final de um volume surpreendente e de bom ritmo, fica a dúvida e a curiosidade sobre a forma como Vaughan vai gerir as situações que criou, numa narrativa ainda com muito em aberto.

O livro foi editado com duas capas diferentes; a amarela, alternativa, aqui ao lado, esteve à venda em exclusivo durante a Comic Con 2016.

Paper Girls #1
Brian K. Vaughan (argumento)
Cliff Chiang (desenho)
Matt Wilson (cor)
Devir
Portugal, Dezembro de 2016
170 x 260 mm, 144 p., cor, capa mole
ISBN: 978-989-559-322-4
9,99 €


(imagens disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as apreciar em toda a sua extensão)

2 comentários:

  1. Uma boa surpresa ja andava para comprar o original.Ate tenho aqui 1 Image First dessa serie.

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  2. Estou ansioso por isto! Pena ser de capa mole, mo entanto, ao menos o preço é compatível com a qualidade da edição. Já o sexo criminoso convidou-me sem hesitações na compra da versão inglesa deluxe.

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