Em
anos recentes, tem-se falado - e escrito - recorrentemente como o
mercado português de banda desenhada tem crescido. Por um lado, na
quantidade, que é visível
nas estantes e nas
bolsas vazias
de
quem compra BD; por outro, na qualidade, que é inegável, de obras e
edições. E, num terceiro aspecto não menos importante, na
diversificação de públicos, tendo acabado de vez - penso eu - a
velha ideia de que há em Portugal um pequeno núcleo de leitores de
BD que compra tudo.
O
recente Amadora BD mostrou este mesmo mercado a dar mais um salto em
frente, ao serem propostas obras que recuperam clássicos nacionais
ou que reflectem sobre a BD - nacional, mas não só...
[Ainda em relação à questão da diversificação de públicos, acessória em relação ao tema que hoje me interessa, diria que neste momento existem vários núcleos - chamemos-lhes assim - que compram obras de determinado género; e que, mais importante, existe um público que geralmente não lê BD, mas que compra títulos específicos.]
Regressemos ao tema base, a edição de clássicos e de obras que pensam a BD
No primeiro caso, temos dois livros da Polvo - O Terror Negro e Zodíaco - com obras de Jayme Cortez, autor português que fez carreira - e sucesso- no Brasil que recuperam algumas das suas obras mais emblemáticas, aproveitando de alguma forma o interesse que as exposições de originais em Beja e na Amadora suscitaram. E, também na mesma editora, a recuperação de alguns Contos Populares Portugueses, na versão muito bem humorada e, aqui e ali, até subversiva, de Artur Correia.
Conhecer o passado - no caso, da BD nacional - é importante pela sua preservação e, inclusive, porque algumas obras que pensaríamos datadas, revelam surpreendentes frescura e resistência ao tempo - como acontece nestes casos.
A um outro nível, surgem duas das três obras ‘teóricas’ propostas por A Seita. Variantes, com apresentação e páginas de homenagem a obras marcantes dos quadradinhos nacionais até final do século passado, e Conversas de Banda Desenhada, com entrevistas a alguns dos mais relevantes autores nacionais actuais.
[E poderá ser um exercício curioso comparar estes nomes - e a consequente análise da situação numa e noutra época - com os que estão presentes no (único outro) livro de entrevistas sobre BD editado em Portugal (até agora), Formas de pensar a BD - Entrevistas do Bdesenhada.com, editado em 2007 pela pedranocharco, do saudoso Machado Dias.]
São duas obras de alguma forma complementares por abordarem épocas sucessivas, que contextualizam, revisitam e de alguma forma pensam o percurso dos quadradinhos em solo luso e nos apresentam os autores por um prisma que, em muitos aspectos, é menos evidente para os leitores.
O terceiro livro, (por muitos já chamado a ‘bíblia”) Tex, mais do que um herói, é uma obra imponente com cerca de meio milhar de páginas, que esmiúça uma das criações mais famosas da BD europeia - e revela a paixão e carinho que o seu autor, Mário João Marques lhe devota.
Estes seis livros - e é curial acrescentar aqui a reposição em livrarias de edições revistas, melhoradas e/ou acrescentadas, de obras mais recentes - Tu és a mulher da minha vida, ela a mulher dos meus sonhos e O Fado ilustrado - também por A Seita, representam o acréscimo - pioneiro e tímido (para já) de mais dois segmentos editoriais a um mercado com limitações de tamanho, com certeza, que se abre, assim, a novas dimensões e ganha uma outra credibilidade que ainda lhe faltava.
Já escrevi aqui no blog sobre Variantes e com certeza voltarei a algumas destas edições, sem pejuízo do que agora fica escrito.
Sei que estas obras - clássicos e livros teóricos - têm um público (ainda mais) específico (e ainda mais limitado), dentro daqueles que compram banda desenhada, mas isso não lhes retira importância e até releva sa apostas - corajosas - de A Seita e da Polvo. E justifica que os leitores que à partida lhes passariam ao lado, se atrevam - também - a espreitar - e a comprar - alguma(s) delas de acordo com os seus gostos e preferências.
O mercado agradece.
A Seita
- Conversas de Banda Desenhada, Carina Correia e João Miguel Lameiras
- Tex, mais do que um herói, Mário João Marques
- Variantes, Júlio Moreia e vvaa
Polvo
- Contos Populares Portugueses, Artur Correia
- O terror negro, Jayme Cortez
- Zodíaco, Jayme Cortez
(imagens disponibilizadas pelas editoras A Seita e Polvo; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar no texto a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
Seria interessante se alguém resgatasse a produção nacional de Jayme Cortez, em complemento ao trabalho que está a ser desenvolvido no Brasil. De qualquer forma, os parabéns á Polvo por apostar num mercado que por cá tem pouca tradição. Apenas lamento o formato demasiado reduzido e o pequeno número de páginas dos volumes - talvez tivesse sido preferível reunir tudo num único volume (ou dois)...
ResponderEliminarSim, idealmente seria assim, mas do que conheço da obra do Jayme Cortez publicada em Portugal, parece-me algo mais datada do que estas produções brasileiras.
EliminarE concordo que a edição da Polvo só teria ganho se fosse em formato maior, porque o tipo de detalhe do traço dele sairia a ganhar.
Boas leituras!