De Espanha...
Costuma
dizer-se
que ‘De
Espanha nem bom vento nem bom casamento.’
e faço
a citação mesmo sabendo quem
me conhece como gosto pouco de ditos e provérbios, embora aceite
que possam
ter um fundo de
verdade ou da
chamada sabedoria popular.
No
caso
vertente, não
sei a
razão ou
a justeza do
que atrás ficou escrito. Nem
me interessa.
Mas
sei, e escrevo-o com segurança, que
de Espanha tem
vindo muita
e boa banda desenhada e
podia até vir mais.
No primeiro caso, temos por aí, obras de Miguelanxo Prado, David Rubin, Paco Roca, Jordi Lafebre, Antonio Altarriba, Kim que têm - justa e naturalmente - conquistado e satisfeito os leitores portugueses.
No segundo, para citar apenas leituras (mais ou menos) recentes, poderíamos ter - e eu tive, feliz e felizmente - ElPacto, Ronson ou, no caso vertente, este Contrition.
Contrition que, para além da óbvia (após a leitura) alusão ao acto (religioso) da contrição, no caso, é uma cidade da Florida, nos Estados Unidos, onde, de certa forma, são acantonados, como numa prisão a céu aberto, onde aparentemente são livres, mas da qual não podem sair, criminosos com cadastro sexual, nomeadamente pedófilos, restringidos pelas regras que os obrigam a manter distância de escolas, parques infantis...
É nela que esta história começa - e é em boa parte nela que quase toda decorre - com a morte de um deles, queimado em vida. Suicídio, como quase todos desejam, por ser mais fácil e a perda não ser relevante ou algo mais, é a pergunta que vai fazer Marcia, uma jornalista local com aspirações a mais do que as páginas de mexericos e trivialidades, iniciando uma investigação em que as respostas - a vontade de as dar - custam a aparecer.
Para isso, de forma que se torna quase obsessiva, confronta o seu chefe de redacção, assume o fim da relação já pouco viva e o consequente afastamento do filho ainda de colo, numa estranha dedicação a um tema espúrio mas que simboliza bem tudo o que a obra congrega.
Remexendo em passados, aproximando-se de alguns dos detidos e daqueles que lhes dão apoio ou os controlam, Marcia vai mergulhar numa história incómoda - para nós leitores - questionando opções, justificações e acções, acima de tudo porque evidencia que também nesta temática tão chocante, fracturante e capaz de provocar extremismos mesmo em gente aparentemente sensata e equilibrada, nem tudo é a branco e negro.
Mas, é a branco e negro, contrastante e vincado, como já conhecemos de Keko na Trilogia do Eu, que a Arte de Autor e a Ala dos Livros editaram por cá, que é narrada esta história opressiva, cinzenta e opaca, que nos grita que não podia ser de outra forma, ou não seja ela um espelho do negrume d(e )a(lgumas) alma(s) humana(s).
Carlos Portela, guionista de séries de sucesso da TV espanhola, conduz-nos por um relato consistente sobre as origens do mal e a necessidade e o poder da redenção, que até talvez preferíssemos não ler - mas que devemos parar para desfrutar - pois questiona ideias feitas, preconceitos e aparências erróneas, sem justificar nem defender, mas obrigando-nos a reflectir e a tomar posição.
Contrition
Carlos
Portela (argumento)
Keko
(desenho)
Norma
Editorial
Portugal,
Abril
de 2023
195
x 60
mm, 1684
p., pb,
capa dura
25,00
€
(imagens disponibilizadas pela Norma Editorial; clicar nelas para as apreciar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
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