12/02/2013

Zé Carioca – 70 anos – volume 1












Vários autores
Editora Abril (Brasil, Outubro de 2012)
133 x 190 mm, 304 p., cor, brochada
R$ 16,00



Se há personagem que combine bem com este dia de Carnaval que passa hoje - e há que o aproveitar enquanto existe nesta mascarada a que alguns ainda teimam em chamar país - ele é sem dúvida o Zé  Carioca.
No Brasil, os seus 70 anos foram assinalados por uma antologia em dois volumes, publicada pela Editora Abril, o primeiro dos quais trago aqui hoje. Este tomo, o primeiro, traça o percurso do papagaio brasileiro da Disney, desde a sua criação para o filme “Saludos amigos!”, na sequência de uma viagem do próprio Walt Disney ao Brasil, até à década de 1960, dando especial relevo à sua existência em papel.
O principal destaque vai para as tiras de jornal em que Zé Carioca nasceu nos quadradinhos, em Outubro de 1942, que são   publicadas pela primeira vez de forma integral (embora remontadas para se adequarem ao tamanho das páginas).
Para além disso, este tomo contém igualmente histórias seleccionadas da fase americana, do período em que se procedeu à substituição dos protagonistas de histórias das duplas Mickey/Minnie ou Donald/Margarida pelo papagaio e Rosinha (levada a cabo no Brasil, quando o material original não chegava para as encomendas...) ou do início da fase brasileira, que documentam a evolução (significativa) deste preguiçoso nato, em termos visuais, criativos e de carácter, bem complementada por textos que introduzem e contextualizam cada tema ou período temporal.
O segundo tomo, também já editado, acompanha o seu percurso desde os anos 1960 até aos nossos dias (ou quase) e inclui duas bandas desenhadas inéditas, produzidas no Brasil.
Como principais senãos da edição - para lá da já referida reformatação das tiras originais – ficam o formato reduzido (o habitual “formatinho” - compreensível (?) pelo equilíbrio necessário na relação qualidade/preço...), os problemas de encadernação que não permite abrir completamente o livro e dificulta a leitura das vinhetas junto à zona central do livro e a qualidade do papel.
O que é pena, pois a data, o conteúdo e o cuidado editorial justificavam uma edição maior, com melhor encadernação e papel.

(As imagens que ilustram este texto foram cedidas pelo Planeta Gibi Blog.)


11/02/2013

Frères d’Ombre









Jérôme Piot (argumento)
Sébastiant Vassant (desenho)
Futuropolis
(França, 10 de Janeiro de 2013)
195 x 265 mm, 1444 p., cor, cartonado
22,00 €



Resumo
Alain é revisor nos SNCF, os caminhos-de-ferro franceses. O seu destino vai-se cruzar com o de Kamel, um argelino entrado ilegalmente em França, a quem ajuda a escapar à polícia, primeiro, e a quem, depois, aloja durante alguns dias.
A recorrência de notícias na TV e nos jornais sobre terroristas islâmicos, levá-lo-ão a questionar o que está a fazer e a pôr em causa a amizade que entretanto se desenvolveu entre eles. No entanto, quando Kamel desaparece, Alain parte na sua peugada, enfrentando no seu próprio país um mundo diferente: o das comunidades de origem muçulmana.

Desenvolvimento
Esta é uma história dos nossos dias. Talvez não – ainda? – uma história nossa, portuguesa – continuámos um país de brandos costumes, onde a imigração [muçulmana] é residual… - mas sem dúvida uma história franco-argelina, sob a sombra do 11 de Setembro.
Porque em França, a realidade é bem diferente e os laços com ex-colónias como a Tunísia ou a Argélia, bem como o grande número de descendentes de naturais desses países, tem levantado muitas questões em termos de convivência, segurança e terrorismo – tantas vezes marcadas pelo desconhecimento, a intolerância e o medo do que é diferente.
No caso de Alain, de alguma forma um inadaptado que vive com a mãe doente, a tudo o que atrás é citado acresce o facto de o seu irmão mais velho ter participado na Guerra da Argélia – e nas atrocidades (tortura, assassinatos…) que os franceses lá cometeram. Um segredo que ele pensa estar bem guardado mas que Alain conhece desde a adolescência.
Quanto a Kamel, é filho de um opositor ao regime argelino, que foi assassinado pelo poder e decide fugir do país para não ter que cumprir serviço militar. Uma vez pago o elevado preço pedido, tornar-se-á mais um clandestino a caminho de França, no interior de um contentor com mais uma dezena de homens.
A questão política é decorrente da temática abordada e é ela que dá o mote ao relato que expõe e questiona sem tomar partido nem dar respostas – a situação é demasiado complexa para isso.
Mas a verdade é que em “Frères d’ombre” prevalece o tom humano, em especial na primeira parte mais intimista, em que Alain e Kamel aos poucos se vão conhecendo e criando laços, mostrando que é possível suplantar as diferenças. Apesar de todas as dúvidas e incertezas – bem humanas – que de forma natural vão surgindo e são narradas, apesar de todos os erros e acções impensadas que provocam.
Traçado com uma linha ágil, que com frequência esquece os tradicionais limites para criar páginas de (enganadora) vinheta única em que é a acção que baliza as fronteiras de cada momento narrado, este romance gráfico na sua segunda metade assume um tom de quase thriller, quando Alain parte em busca de Kamel, nos arredores parisienses, entre as comunidades muçulmanas, vítimas do trabalho clandestino, em condições de quase escravatura, desejoso de saber se o argelino escapou à polícia e se conseguiu chegar a bom porto.

A reter
- A actualidade do relato. Um tema de presença constante em noticiários, mas que incomoda pelo lado realista da abordagem e por aquilo que revela.
- O tom humano que prevalece no conjunto.


09/02/2013

A arte de... Franco Caprioli




















Franco Caprioli
No centenário do desenhador poeta
Jorge Magalhães
GICAV
5,00 €



DVD com material inédito que é uma versão expandida da publicação lançada em Moura aquando da exposição dedicada ao mestre italiano.
Inclui os seguintes capítulos:
1) Monografia
2) Histórias do Mar - três histórias completas e inéditas no nosso país (em substituição de “Olac, o Gladiador”): Capitan Gambedilegno – Il Giornalino nº 13 (1972); Il mozzo del Sant’Elia – Il Giornalino nº 18 (1972); Balene d’assalto – Il Giornalino nº 22 (1973)
3) As 12 mais belas histórias de Caprioli – segundo as preferências de Fulvia Caprioli, Luiz Beira, Jorge Magalhães, Carlos Rico e Carlos Almeida
4) Galeria de Imagens – fotos e desenhos de família (por especial deferência de Fulvia Caprioli)
5) Con Franco Caprioli Nell’Aventura del Mare” – páginas antológicas do desenhador que ficou conhecido como “O Poeta do Mar”
6) Quadriculografia portuguesa e brasileira de Caprioli
7) Nota biográfica
8) Os herdeiros de Caprioli – uma breve referência aos filhos do artista, Fabrizio (já falecido) e Fulvia (que teve uma colaboração muito importante na realização de uma boa parte deste trabalho).

08/02/2013

Spirou par Rob-Vel












L’Intégrale 1938-1943
Rob-Vel
Dupuis
(Bélgica, 18 de Janeiro de 2013)
220 x 300 mm, 312 p., cor, cartonado
24,00 €




Resumo
Compilação das pranchas originais de Spirou criadas por Rob-Vel (e não só…), introduzidas por um dossier muito completo e bem ilustrado sobre a (atribulada) génese do herói.

Desenvolvimento
Há obra que se lêem com paixão, para outras é necessário utilizar a razão. É o caso desta.
Há muito sabedor que Rob-Vel tinha sido o criador (gráfico) de Spirou, quase nada tinha visto até hoje desses primeiros passos da carismática personagem. Ao saber desta edição, rapidamente subiu para o topo das minhas prioridades e a sua leitura impôs-se naturalmente. E, é sem dúvida pelo seu tom documental que ela se torna valiosa, pois esta é a primeira vez que todas as pranchas desenhadas por Rob-Vel são disponibilizadas após a sua publicação original, pois até esta data uma única vez tinham sido reproduzidas, em dois tomos, de tiragem limitada, no já muito distante ano de 1975.
Delineado por Jean Dupuis em 1937, para ser a figura principal de uma nova publicação dedicada aos mais novos que ele pensava editar, baptizado em reunião familiar dos Dupuis, Spirou seria entregue ao francês Rob-Vel, colaborador de “Le Moustique”, uma outra publicação da editora, e com vocação para desenhar grooms!
Dessa forma, a 21 de Abril de 1938, Spirou saltava (literalmente) do papel, para se tornar – ninguém o adivinhava ainda - um dos mais representativos e duradouros heróis da banda desenhada franco-belga.
O Spirou original, ainda em busca de definição, foi evoluindo sem rumo fixo, consoante as necessidades de cada episódio: traquinas, espertalhão, patriota, com um irmão gémeo (!), fumador, apreciador de bom vinho, responsável por esquemas de honestidade duvidosa, cientista, ventríloquo, detective, monarca, manager de um pugilista, astronauta… Um faz-tudo, em suma, no qual identificámos muito pouco do herói que hoje tão bem (re)conhecemos.
É dessa forma que protagoniza as suas primeiras 27 pranchas aos quadradinhos, episódios humorísticos auto-conclusivos. Depois, a 17 de Outubro desse mesmo ano, arranca a sua primeira aventura longa – 92 pranchas. Por elas e pelas seguintes, para lá de Rob-Vel, entretanto condicionado pelo serviço militar e pela ocupação da Bélgica pelos nazis, passarão a sua esposa, Blanche, Luc Lafnet e diversos colaboradores que permaneceram anónimos. Disso se ressente a obra, com o traço e a própria planificação a variarem segundo a inspiração e o estilo de cada um. Como curiosidade, fica uma nota para o facto de as duas últimas pranchas – que terminam bruscamente essa primeira narrativa longa – terem sido realizadas por Jijé, que poucos anos volvidos, a partir de 1944, haveria de deixar uma marca fundamental na série, modernizando-a e criando o temperamental Fantásio.
O mote desse relato primeiro relato em continuação – na qual Spirou, pela primeira vez, assumirá o papel de viajante pelo mundo – é, sem dúvida, curioso e original: Bill Honey, um norte-americano hospedado no hotel onde Spirou trabalha, recebe uma fabulosa herança, que perderá se não conseguir gastar um milhão por mês. Spirou encarregar-se-á de o ajudar, evitando que a fortuna vá cair nas mãos de outro.
Nela – como nos outros episódios posteriores, ao fim de poucas páginas, o ponto de partida é esquecido, coadjuvantes desaparecem misteriosamente e as peripécias e os locais da acção desdobram-se e multiplicam-se, tudo ao sabor da inspiração no momento criativo…

Esta belíssima edição, revela-se assim, antes de tudo, um documento fundamental, que descobre a génese de Spirou e espelha a forma de narrar aos quadradinhos, na Bélgica, nos anos que antecederam a II Guerra Mundial. E cuja leitura, uma vez terminada, nos faz pensar que só o talento único de dois génios dos quadradinhos, Jijé e Franquin, tornou possível que este Spirou se tenha tornado naquele que hoje conhecemos.

A reter
- O valor documental de uma edição deste calibre: foi preciso esperar 75 anos para ficar disponível a (longa) génese de um dos mais importantes heróis da BD franco-belga.
- O livro em si: um objecto magnífico, surpreendentemente leve (para a sua dimensão), bom papel, boa impressão.
- O dossier que abre o volume e detalha o percurso criativo dos autores do groom mais conhecido da BD.

Curiosidades
Simples coincidência ou Rob-Vel era leitor do Tintin de Hergé?
Deixo três momentos – que não são os únicos – que parecem inspirados (?) nas aventuras do “repórter que nunca escreveu uma linha”…

Spirou (1942) / Tintin (1930)



 Spirou (1939) / Tintin (1934)


2.º Encontro Editorial de BD Europeia - Madrid 2013


NetCom2 Editorial
15, 16 e 17 Fevereiro 2013









São três dias de sessões de autógrafos, sorteios, entrevistas e curiosidades sobre as colecções que publicamos.
Vamos projectar um documentário muito interessante sobre Jacques Martin que recuperamos e legendamos em castelhano.


Contaremos com a presença de 4 desenhadoresh

- Jean Pleyers (Keos, Jhen, Viajes de Jhen-Gilles de Rais)
- Emilio van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob)
- José Luis Povo (Miquel Mena)
- Marco Venanzi (Alix, Masquerouge, Hidalgos, Viajes de Jhen-Los Templarios)

PROGRAMA
SEXTA-FEIRA, 15 de Fevereiro
17h00 a 17h30 – Breve apresentação geral do editor. Entrevista com Jean Pleyers.
17h30 a 19h30 – Sessão de autógrafos com Jean Pleyers (Jhen, Keos, Viajes de Jhen-Gilles de Rais) e Emilio Van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob).
19h30 a 20h30 – Projecção do documentário “Jacques Martin - Los héroes de papel nunca mueren” (1).
20h30 a 21h30 – Sessão de autógrafos com Marco Venanzi (Alix, Masquerouge, Hidalgos, Viajes de Jhen-Los Templarios), Jean Pleyers (Jhen, Keos, Viajes de Jhen-Gilles de Rais) e Emilio Van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob).

SÁBADO, 16 de Fevereiro
10h00 a 11h00 – Projecção do documentário “Jacques Martin - Los héroes de papel nunca mueren” (1).
11h00 a 11h30 – Apresentação, por parte do editor, das novidades para 2013 (2).
Perguntas e sugestões da assistência.
11h30 a 11h45 – Entrevista a Emilio Van der Zuiden.
11h45 a 13h30 – Sessão de autógrafos com Marco Venanzi (Alix, Masquerouge, Hidalgos, Viajes de Jhen-Los Templarios) e Emilio Van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob).
13h30 a 16h00 – As salas permanecem abertas para compra de livros.
16h00 a 17h00 – Projecção do documentário “Jacques Martin - Los héroes de papel nunca mueren” (1).
17h00 a 18h00 – Aventuras e suspense durante a Grande Guerra. Conversa com os autores de Las aventuras de Miquel Mena, Pablo Herranz e José Luis Povo.
Curiosidades na realização do álbum, making-off e início da preparação do 2º volume.
18h00 a 18h15 – Entrevista com Marco Venanzi.
18h15 a 21h00 – Sessão de autógrafos com José Luis Povo (Miquel Mena), Marco Venanzi (Alix, Masquerouge, Hidalgos, Viajes de Jhen-Los Templarios), Jean Pleyers (Jhen, Keos, Viajes de Jhen-Gilles de Rais) e Emilio Van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob).

DOMINGO, 17 de Fevereiro
10h30 a 13h30 – Sessão de autógrafos com José Luis Povo (Miquel Mena), Marco Venanzi (Alix, Masquerouge, Hidalgos, Viajes de Jhen-Los Templarios), Jean Pleyers (Jhen, Keos, Viajes de Jhen-Gilles de Rais) e Emilio Van der Zuiden (Margot, Las chicas del tío Bob).

(1)   Documentário: “Jacques Martin - Los héroes de papel nunca mueren”. Uma reportagem de 50 minutos que o canal France-3 realizou pouco antes de Jacques Martin falecer.
Entrevistas com o autor, retrospectivas da sua vida e dos seus personagens, curiosidades sobre como criou Alix, o seu trabalho com a Hergé, entrevistas a Roger Leloup, Jean Pleyers, Patrick Weber, etc…
Temos o documentário legendado em castelhano e temos autorização para projectá-lo. Um grande esforço que mereceu a pena e que, sem dúvida, os fãs de Alix e Lefranc apreciam. No final do documentário vamos sortear livros biográficos de Jacques Martin, relacionados com o conteúdo do documentário.

(2) Novidades: Para além de comentar os lançamentos de 2013, esta 2.ª reunião irá apresentar três novidades:
- Alix: La sombra de Serapis (com Marco Venanzi)
- Jhen: El secreto de los Templarios (com Jean Pleyers)
- Las chicas del tío Bob: (com Emilio v.d. Zuiden)
Também estará disponível o número 19, de Fevereiro, da revista gratuita NetComic.

(Texto da responsabilidade da organização)

07/02/2013

Lucky Luke contra Pat Poker












Morris
ASA/Público
(Portugal, 6 de Fevereiro de 2013)
215 x 285 mm, 48 p., cor, brochado com badanas
4,95 € (com o jornal)



Resumo
Primeiro dos 15 álbuns da nova colecção de Lucky Luke disponibilizada pela ASA e o jornal Público, este álbum inclui dois episódios complementares:  “Limpeza em Red-City” e “Tumulto em Tumbleweed”, no qual Lucky Luke enfrenta um mesmo adversário: Pat Poker, um jogador sem escrúpulos.

Desenvolvimento
Há obras que ficam marcados pela passagem do tempo; esta, datada de 1953, é uma delas. Curiosamente, esse efeito deve-se menos à inexorável sucessão de horas, dias, meses, anos que todos sofremos, do que à evolução que o “cowboy que dispara mais rápido do que a própria sombra” experimentou nos anos seguintes.
Aliás, uma marca distintiva deste livro – dos livros iniciais de Lucky Luke – é a hesitação que se nota em Morris entre o western (puro) semi-caricatural e o registo maioritariamente humorístico.
E, na verdade, se no conjunto este último (já) prevalece, ainda há nesta (e nas outras) história(s) uma série de apontamentos de um registo mais duro. Veja-se, a título de exemplo, quantos adversários Luckey Luke (literalmente) despachou a tiro nesse percurso (e o próximo álbum desta colecção, “Fora-da-lei”, nisso é paradigmático); repare-se no cigarro (permanentemente) no canto da boca; atente-se no que ele faz à doninha mal-cheirosa (p. 10)…
Frutos, também, de épocas e formas de narrar aos quadradinhos diferentes (e não, isso não implica que sejam obrigatoriamente piores, eram apenas outras, possivelmente menos artificiais, mais verdadeiras…), que, afinal, conferem a este “Lucky Luke contra Pat Poker” fundamentalmente um papel documental.
Até porque, nessa hesitação (de Morris) sobre qual o rumo a seguir, Lucky Luke acaba por surgir algo indefinido e algumas situações encaixam menos bem no todo, o que valoriza ainda mais a influência que Goscinny veio a ter na personagem e na série, fazendo dela uma referência incontornável na BD de humor.
O que não belisca nem diminui o talento gráfico do autor completo que Morris era então, (já) dono de um traço inconfundível e capaz de tornar dinâmica (mesmo) uma narrativa assente numa planificação tão rígida e tradicional como neste caso.

A reter
A diferença que faz, no preço final do álbum, uma tiragem de 750/1000 exemplares (o normal hoje em dia na maioria das edições nacionais de BD) ou a tiragem maior necessária para distribuir com o jornal - que eu suponho não deverá ultrapassar os 3 mil exemplares...


06/02/2013

Hägar: horrendo e quarentão












Há 40 anos, a 4 de Fevereiro de 1973, um novo herói de BD estreava nas páginas de 136 jornais norte-americanos: tinha por nome Hägar, the horrible e teve um sucesso retumbante, tendo chegado a publicar-se em 1800 jornais de 58 países.

Embora adoptando o tom tradicional das tiras diárias familiares, Hägar distinguia-se por ser um vicking que vivia um milénio antes da data da sua estreia nos jornais, em plena idade das trevas, para a qual ele contribuía entusiasmado.
A comicidade advinha tanto dos muitos anacronismos existentes na série, quanto da convivência entre os diferentes membros: Hägar, tão intrépido conquistador quanto submisso marido; Helga, a sua mulher, que usa os maiores cornos da casa, símbolos de poder entre os vickings; Hamlet, o filho, que prefere a leitura à natural violência da época e quer ser dentista; Honi, a filha adolescente que almeja seguir o pai nos combates. A galeria de personagens é ainda enriquecida com Eddie Felizardo, lugar-tenente de Hägar, que não faz jus ao nome e dotado de pouca inteligência; Lute, o trovador pacifista que aspira ao coração de Honi; o dr. Zook, o curandeiro local e Snert, o cão de Hägar.



O seu criador foi Dik Browne (1917-1989), que na sua bibliografia já registava o desenho de “Hi and Lois”, outra tira diária bem-sucedida. Surgido quando já contava 56 anos, uma idade em que muitos criadores já entraram em declínio, Hägar permitiu-lhe cumprir o principal propósito: deixar à família um legado que lhes permitisse viver sem sobressaltos.
Ainda em publicação nos nossos, dias, agora assinado por Chris Browne, que assumiu a série quando o seu pai faleceu, em Portugal – onde foi terrível, abominável e horrendo - Hägar passou de forma discreta pelas páginas do Mundo de Aventuras, tendo conhecido uma primeira edição em álbum, em 1993, por parte dos Livros Horizonte. Em 2008 a Libri Impressi, de Manuel Caldas, propôs-se fazer a sua reedição integral cronológica, mas o projecto ficar-se-ia por dois volumes, correspondentes às tiras diárias publicadas em 1973 e 1974.

(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 5 de Fevereiro de 2013)


Lançamento e Exposição de VSAdH/EdWB/IpAN (uDdPL)


Data: 8 de Fevereiro a 8 de Março
Local: Nouvelle Librairie Française, Avenida Luís Bívar, nº 91, Lisboa
Horário: de 2.ª a 6.ª, das 10h30 às 19h30h; Sábados, das 10h às 12h30









A Nouvelle Librairie Française e a Associação Chili Com Carne convidam para dia 8 de Fevereiro, às 19h ao Lançamento e Exposição de VSAdH/EdWB/IpAN (uDdPL) ou Variações Sobre o Anjo da História /Ensaio de Walter Benjamin /Inspirado por “Angelus Novus” (um desenho de Paul Klee) de Ilan Manouach e Pedro Moura, uma co-edição bilingue (português e francês) de La Cinquième Couche e Montesinos.
Lançamento do livro e inauguração da exposição (10 desenhos originais de Manouach) às 19h.
Exposição patente até dia 8 de Março.

Este é o novíssimo projecto do artista grego Ilan Manouach e do escritor português Pedro Moura, VSAdH/ EdWB/ IpAN (uDdPL), ou Variações Sobre o Anjo da História/Ensaio de Walter Benjamin/Inspirado por “Angelus Novus” (um Desenho de Paul Klee), uma colecção de quarenta e oito poemas em prosa baseados - mas em permanente fuga - na possivelmente mais famosa imagem de Walter Benjamin, acompanhados por desenhos que exploram tensões quase insuportáveis entre texto e imagem.
Co-publicado por La Cinquième Couche, uma editora de banda desenhada experimental belga, e a Montesinos, a chancela editorial de P. Moura, com textos em francês e português, VSAdH/ EdWB/ IpAN (uDdPL) é também um objecto que desenha habitar a zona desmilitarizada e densa que existe entre os domínios da ilustração, da banda desenhada, dos livros de artista, das colaborações, das artes do livro, da reprodutibilidade e de um misticismo impoluto pós-tecnológico.

PVP: 18 euros (20% desconto para associados) à venda na loja online da CCC, Matéria Prima, Livraria Sá da Costa (Rua Garrett, Lisboa), Artes & Letras, Fábrica Features e brevemente na Trem Azul, Letra Livre, Mundo Fantasma, Kingpin Books...

Um movimento contraditório de dissolução e acreção de um processo de mitificação do mundo. As ruínas da História, tais como descritas por Walter Benjamin, assumem muitas formas, e muitos são os gestos que procuram restaurá-las, deslocá-las ou então abandoná-las de vez.

As configurações são por isso inúmeras, e as metamorfoses incessantes. VSAdH/ EdWB/ IpAN (uDdPL) não é mais do que uma sucessão de capturas das formas que se molda nessa tempestade caleidoscópica. As palavras de Pedro Moura apresentam uma paisagem a um só tempo desolada e vibrante populada por personagens dantescas, descritas ora vaga ora meticulosamente, emprestando vozes diferentes a ensejos diferentes, todas detectáveis na mesma localização. Os desenhos de Ilan Manouach, através de várias estruturas e fontes, moldam as proporções exactas destes fragmentos em ruína.

Ilan Manouach e Pedro Moura já haviam colaborado, mas como comissário e artista. Todavia, as afinidades de ambos foram imediatamente instigadas, encontrando um campo comum electrificado nos seus interesses pelas ruínas da tessitura da realidade, pela natureza efémera da beleza (e a beleza do efémero), pela falibilidade do monumental e a monumentalidade dos dejectos, pelos umbrais entre a vida e a morte, e por execuções precisas e automáticas dos gestos de desenhar e escrever com fim à evasão das costumeiras mistificações da arte, procurando antes concretas fantasmagorias que acabam de despontar.

O filósofo alemão Walter Benjamin - com a sua imagem potente do crítico como aquele que mortifica a obra de arte, que a despoja e desnuda, para transformar o objecto prístino em ruínas e, no seio delas, procurar libertar o seu fogo interior - tornar-se-ia o condutor desta colaboração. O fragmento do “Anjo da História” é um enigma. Tratar-se-á de um desenho de Paul Klee que espoletou um conceito em Walter Benjamin? Ou um ensaio descritivo-criativo sobre uma figura previamente existente? Existirá noutras paragens? Faz sentido falar de exisrência, seja ela actual ou virtual, neste caso?

VSAdH/ EdWB/ IpAN (uDdPL) tenta revisitar esse lugar de encontros para instigar outros tantos.

Ilan Manouach é o criador de uma mão-cheia de livros que redefiniram a forma da banda desenhada, tais como Le lieu et les choses e Frag, tal como a relação entre texto e imagens com Limbo. Muitos dos seus projectos artísticos exploram “encontros fortuitos” lautreamontianos entre arte site-specific, a instalação, a apropriação, artes gráficas e música, área na qual ele é igualmente um virtuoso saxofonista e manipulador de electrónica.

Este é o primeiro livro de Pedro Moura enquanto escritor, embora tenha publicado contos, poemas e literários objectos não-identificados noutros locais (inclusive uma opereta). Ele é sobretudo um crítico de banda desenhada, escrevendo para o blog Lerbd. No domínio da banda desenhada, ilustração e animação, já trabalhou como professor, tradutor, comissário, escritor, documentarista e editor.

(Texto da responsabilidade da organização)

05/02/2013

Tex Gigante #27 - A Cavalgada do Morto









Mauro Boselli (argumento)
Fabio Civitelli (desenho)
Mythos Editora (Brasil, Outubro de 2012)
185 x 275 mm, 242 p., pb, brochado
R$ 19,00 / 10,00 €



Resumo
A morte em condições enigmáticas de um antigo ranger, seguida da aparição de um pretenso cavaleiro sem cabeça, leva Tex, Kit Carson, Kit Willer e Jack Tigre a regressar a Pilares, correspondendo a um convite do seu amigo El Mourisco. 
Irão descobrir uma antiga história, violenta e trágica, na origem de uma vingança que deverão impedir a todo o custo.

Desenvolvimento
Embora a alguns isto possa soar estranho, a verdade é que este era um dos livros aos quadradinhos mais aguardados de 2012. Dentro do seu segmento específico, evidentemente, que, diga-se, pela sua dimensão, está longe de ser negligenciável, mas também fora dele. E não só porque estamos em presença de um “Textone” (o nome original dos “Tex Gigante” em Itália).
Tal como acontece recorrentemente noutras áreas temáticas da BD, a expectativa devia-se primordialmente à sua parte gráfica, ou não fosse Fabio Civitelli, sem dúvida o mais categorizado desenhador de Tex dos últimos anos, o escolhido para ilustrar este livro.
E o mínimo que se poderá dizer, é que o artista italiano não defraudou os seus fãs nem as esperanças nele depositadas. Ajudado pelo formato do álbum, o seu desenho brilha mais, pois permite realçar a qualidade e a precisão do seu traço fino e expressivo, apreciar o realismo com que retrata tanto cenários urbanos, quanto paisagens desertas ou zonas montanhosas, fogosos cavalos ou seres humanos. (E aqui justifica-se um aparte para realçar as mulheres de Civitelli – e elas têm um pouco mais de protagonismo neste Tex Gigante do que é habitual – o que faz desejar a sua arte numa série em que elas tivessem presença mais destacada).
Amante da precisão, do detalhe, do pormenor, do rigor e da qualidade, Civitelli brilha a grande altura e com ele a técnica que desenvolveu ao longo de muitos anos a desenhar o ranger Bonelli. E, neste campo, revela-se insuperável o pontilhismo que utiliza para definir sombras, volumes e ambientes nublados ou noturnos, sendo justo destacar a longa sequência passada no interior da montanha, no cemitério índio, onde a névoa e a escuridão são quase palpáveis à bruxuleante luz das tochas.
Quanto à história em si – que apesar de tudo o que para trás fica não pode ser passada para segundo plano, pois isso faria desta BD uma obra menor – é consistente e está bem construída. Os avanços narrativos são feitos de forma calculada, com mudanças de local e de protagonistas em cada pico de acção ou suspense, quase como se se tratasse de capítulos a publicar numa revista – o que ajuda a embarcar o leitor no tom predominante.
É verdade que tem uma longa introdução – talvez demasiado longa, defeito recorrente em Tex – que condiciona uma equilibrada exploração do desfecho, mas é ela que contextualiza e explica a restante acção e a origem do morto sem cabeça que cavalga à noite como lúgubre premonição para aqueles a quem irá tirar a vida.
Cavaleiro sem cabeça (literalmente?) esse que está na origem do (pouco vulgar) tom fantástico que a história assume, a espaços próximo mesmo do suspense e do terror – visível na fantasmagórica aparição ou na viagem ao além de Eusébio e cujo auge se divide entre a já citada (e conseguida) cena no cemitério índio e o confronto final - e que é a nota distintiva do relato.

A reter
- O desenho de Civitelli, (não) suficientemente elogiado acima.
- O (inusitado) tom fantástico da história.
- Para todos os efeitos, o curto intervalo entre a publicação original e o lançamento desta edição no Brasil.

Menos conseguido
- O final algo abrupto, o que infelizmente não é novidade nem em Tex, nem em Tex Gigante.

Nota final
- A utilização de imagens em italiano, provenientes directamente de Fabio Civitelli (via Tex Willer Blog) deve-se ao facto de terem uma qualidade muito superior à que poderia obter num scanner a partir da edição brasileira.

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