08/06/2020

Luís Louro: “O Corvo veio a tornar-se algo muito maior do que eu alguma vez imaginei!”








Com a tranquilidade da BD nacional desfeita pela chegada de um herói inconsciente – toma lá o trocadilho, Luís Louro! – urgia falar com o seu autor para que se pudesse justificar. Se o fez ou não, cabe aos leitores decidir, após desfrutarem da entrevista que se segue, feita por meios electrónicos.

As Leituras do Pedro: Quatro álbuns do Corvo em 25 anos, são poucos ou são muitos?
Luís Louro: Nem são poucos nem são muitos, são os que há!!! :)
Do ponto de vista dos fãs serão poucos, claro… Do meu ponto de vista, sim gostava de ter feito outros tantos… Mas outros projetos surgiram, o que me proporcionou o crescimento óbvio entre este e o último Corvo em 2007! Não nos podemos esquecer também, que nesses 25 anos houve um hiato de 7 anos… Quando eu parei completamente (e definitivamente, pensava eu…) com a BD. Mas também aprendi com o Jim del Monaco que quando se fazem vários álbuns seguidos parece que perde valor… começam a ser ignorados, “- Olha é mais um…” E isso sempre me aborreceu bastante, pois o trabalho e dedicação são idênticos para todos… Passei pela mesma experiência recentemente com os Watchers e Sentinel. (O pobre Sentinel não teve metade da atenção da imprensa que teve o Watchers…)
Portanto, acho que este Corvo veio no momento certo. Estou de (in)Consciência Tranquila!!!

As Leituras do Pedro: O que representa o Corvo para ti?
Luís Louro: O Corvo foi o meu primeiro personagem a solo!!! Logo tem um lugar ENORME no meu coração! Foi a minha primeira aventura como argumentista… Acompanhou todos os meus momentos de ansiedade… medos, alegrias… E curiosamente veio a tornar-se algo muito maior do que eu alguma vez imaginei…
Com o Corvo alcancei novos voos… (Pun intended)… É um personagem que sempre acompanhou o meu crescimento como autor completo e nunca ficou datado. Está em constante evolução. (Como seria de esperar de um verdadeiro herói, claro está!) o Corvo tornou-se num ícone nacional, e está a caminho de se tornar num ícone Mundial!!! (Apenas aguarda resposta a uma carta de candidatura enviada aos Vingadores…) O Corvo começa a já não caber nas páginas de um álbum de BD!!! (Daí o facto deste novo álbum ter um formato maior… Aí está!)

As Leituras do Pedro: Porque regressaste agora ao Corvo?
Luís Louro: Pela primeira vez na minha carreira quando entreguei um álbum à editora (o Sentinel), continuei cheio de vontade de desenhar… Ao passar pelo estirador vi uma página de esboços da cara do Corvo que tinha feito em 2016… E essas caras começaram a chamar por mim… Literalmente, acreditem… EU NÃO ESTOU LOUCO!!! E comecei a fazer uns esboços neste novo traço mais dinâmico… quando dei por mim já tinha desenhado mais de 100 poses, entre o Corvo e o inflamável Combustão!!! Ora como não sou uma pessoa que goste de trabalhar para o boneco, tinha de rentabilizar todos este esforço (delicioso prazer…) E pronto comecei a pensar numa nova história.
É engaçado que o Corvo está sempre presente… Mesmo quando trabalho em projetos diferentes.

As Leituras do Pedro: E porquê o regresso a solo? A experiência anterior com o Nuno Markl não podia ter sido repetida?
Luís Louro: O Corvo é uma personagem muito minha. A experiência com o Nuno foi excelente, mas foi isso mesmo, uma experiência… O Corvo faz parte de mim e eu do Corvo… É algo muito intimo, que não gosto muito de partilhar… :) Acho que inconscientemente o Corvo tem cada vez mais traços da minha personalidade… Do meu humor, dos meus medos, e da minha coragem, claro… Afinal o Resplandecente Corvo é um HERÓI!!!

As Leituras do Pedro: O Corvo começa com um tom trágico no álbum de estreia; depois parece tactear em busca do seu caminho em O Regresso; em Laços de Família assume um tom de comédia ligeira e agora torna-se definitivamente um ‘super-herói’. Concordas? Porquê?
Luís Louro: Seria a meu ver a evolução mais apropriada para o nosso inolvidável herói… Neste último volume decidi dedicar-me a 100% ao Corvo, ao herói, deixando propositadamente o Vicente de fora. Este é um álbum mais “Dark” onde ficamos a conhecer melhor o Herói, e todas as questões que o incomodam…
É mais uma vez uma abordagem diferente dos anteriores, apesar de neste termos também uma parte dramática (mais encapotada) nos monólogos do nosso vingador (em breve, espero…) o que revela todo o seu desequilíbrio e alheamento em relação aos que o rodeiam… Não significa isso que o Vicente não volte…
O curioso é que houve muita gente que se apercebeu disso, dessa componente dramática mais oculta, outros deram pelo lado mais humorístico, outros pelo heroísmo com a grande batalha com o infame Combustão… E outros só viram mamas… :):):) Esta é a beleza de fazer BD!!!

As Leituras do Pedro: Neste álbum Lisboa é menos visível do que nos álbuns anteriores. Precisavas de descansar depois do protagonismo que lhe deste em Watchers/Sentinel?
Luís Louro: Não creio que seja menos visível… É apenas mais realista (afinal o Corvo é um herói de verdade!!!) Não é uma Lisboa tão espetacular, visual e fantasista, mas está lá como sempre. No Corvo tudo grita Lisboa!
Não significa isto que o Corvo seja um herói de Lisboa, como todos sabemos o Corvo e Robim (peço desculpa por me ter esquecido de mencionar o sempre fiel companheiro e parte intrínseca do duo dinâmico,) são enormes e fazem parte do património mundial… Não…?

As Leituras do Pedro: Em Laços de Família há o esboço de uma capa onde se lê o título: "Inconsciência tranquila". Coincidência? Ideia antiga? Aproveitamento?
Luís Louro: Ora esse título surgiu-me ainda antes do Laços de Família… E sempre gostei muito dele. Como não sabia se o Corvo iria ter mais aventuras, ou se alguém até lá se iria lembrar deste trocadilho… (Eu sei que foi de génio… Mas nunca se sabe se anda por aí mais algum…) resolvi pôr por brincadeira a anunciar brevemente no Corvo III.
Passado todo este tempo, a primeira coisa que me veio à cabeça quando pensei no Corvo IV foi esse título… E ainda tive de andar às voltas durante um tempo para me lembrar dele… (Sim, este belo génio nunca mais se lembrou que o tinha posto no álbum anterior…)
Mas pronto, esta é a história… A propósito, também já me lembrei de outro “genial” para um próximo volume… Resta saber se se enquadrará na história e, mais importante… Se haverá próximo volume… :)

As Leituras do Pedro: Um dos factores mais marcantes deste quarto álbum do Corvo, é a tua passagem da Asa para a Ala dos Livros. O que te fez mudar?
Luís Louro: Tudo na vida tem o seu tempo… Estive na Asa 30 anos, desde 1989!!! A certa altura queremos algo diferente, queremos sempre ser mimados, valorizados e respeitados... Mas chega um momento, como em todas as profissões, que se tivermos uma proposta mais interessante temos de seguir em frente.
Na Asa tive momentos maus, bons, excelentes, estranhos… Mas todos me deixam saudades, para além disso continuo a fazer parte da Asa com outros trabalhos.
Com a Ala dos Livros estou a ter um apoio a que não estava habituado… Realço a “incansável” Luísa, sempre ao meu lado a promover o meu trabalho, agora finalmente com outro tipo de apoio da editora.

As Leituras do Pedro: A Ala dos Livros já anunciou a reedição do Alice para Outubro. Há mais reedições a caminho?
Luís Louro: Para já não… Isto tem sido um turbilhão… A mudança de editora com o Corvo, agora também a Alice… Tudo num ano atípico como este não é fácil.

As Leituras do Pedro: Nos últimos anos, o autor que tinha deixado a BD, proporcionou-nos os regressos de Jim del Monaco e do Corvo e o duplo díptico Watchers/Sentinel. O que vem aí a seguir?
Luís Louro: A reedição do Alice, claro!!! Eheheh…
Agora preciso de respirar um pouco e pensar no futuro… Confesso que fiquei bastante entusiasmado com o resultado deste novo Corvo e, como disse antes… o Corvo nunca anda longe dos meus pensamentos… Mas por outro lado dois volumes seguidos da mesma personagem… hhhmmm….. Veremos o que o futuro nos traz…

As Leituras do Pedro: Paralelamente, a propósito da pandemia de Covid-19, criaste Os Covidiotas no Facebook. Como surgiu a ideia?
Luís Louro: Como disse antes ando cheio de vontade de desenhar… E quando começou esta pandemia e tivemos de ficar em casa (apesar de eu passar a maior parte do meu tempo em casa…) comecei a sentir uma pressão de estar em casa sem fazer nada numa altura que vai ficar para sempre na memória do mundo.
Aí comecei-me a aperceber de uma série de situações ridículas ligadas a esta pandemia… E como sempre quis experimentar um traço mais simplificado para cartoon, esta era a oportunidade perfeita… Comecei por pensar em fazer 4 ou 5… e acabei por chegar aos 150!!! Tudo isto também com o incentivo e acompanhamento de todos os amigos e seguidores das redes sociais, que têm sido o meu constante apoio!!!
Inclusive esta semana estava a trabalhar nos extras para o Alice e esqueci-me de pôr à hora habitual a tira do dia… Recebi logo dois ou três recados a puxar-me as orelhas… :):):)

As Leituras do Pedro: Ate quando vão continuar?
Luís Louro: Pois, não sei… Apenas sei que se for realmente para álbum, vou deixar uma parte inédita… Logo isto vai ter de parar brevemente…

As Leituras do Pedro: Está prevista a sua edição em livro? Quando? Já não devia estar a acontecer?
Luís Louro: Sim está tudo a ser tratado… Como já disse, não está a ser um ano fácil, mas esperemos que seja para breve pois é um tema que mesmo que a pandemia acabe em breve (esperemos) ficará para sempre na história mundial! (assim como o Corvo, não nos podemos esquecer…) :):):):)

(imagens disponibilizadas por Luís Louro e pela Ala dos Livros; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

1 comentário:

  1. Uma excelente entrevista a um dos nossos melhores desenhadores e argumentistas nacionais, quando lemos o Corvo contamos com um desenho excelente, historias fora do vulgar, alguns easter eggs que falham á primeira leitura.
    Depois de ler esta entrevista, dá uma grande vontade de o comprar, ler de novo o resto corvo e ir relembrar a Alice.
    Como seguidor dos OS-COVIDIOTAS gostei muito de saber que poderá haver uma edição em papel, olhando para os comentários no Facebook compradores não vão faltar.

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