18/02/2021

J. Kendall #142

Ciao, amore...


De novo à volta com os (sub-)títulos, a escolha hoje recaiu num que tem uma tripla leitura: para mim, para Julia e para Myrna, no meu regresso - graças a mão (muito) amiga - à criminóloga de Garden City, em mais uma edição (dupla) em que o foco de Berardi está mais nas relações - voluntárias ou não - da sua protagonista do que propriamente nos enredos policiais que apresenta.


Ciao para mim

O primeiro 'ciao' [olá] do título, é a minha saudação ao regresso de Julia às minhas leituras, depois de uma (demasiado) longa ausência - consequentemente também aqui no blog.

Julia é, no meu caso, uma daquelas séries de ligação emocional cuja explicação racional me custa a fazer de forma totalmente satisfatória. Posso evocar a mestria narrativa de Berardi, a força interior de uma protagonista aparentemente frágil, o equilíbrio entre o relato policial e a exploração do lado humano dos intervenientes, a evolução de Julia - e com ela, da série - mas tudo isso me parece curto para justificar como me seduz desta forma uma revista mensal com muitos desenhadores, sujeita por isso a inevitáveis variações qualitativas, apesar de um nível médio sempre bastante interessante.

Como noutras coisas, concluo sempre que o melhor é esquecer as explicações e desfrutar das emoções. Podendo acrescentar que a leitura continuada, potencia e fortalece a ligação que eu sinto.



Ciao, amore para Julia

O segundo 'ciao' - o mais literal e completo, em toda a sua acepção, é para a criminóloga que em O Corpo Viajante inicia uma relação com o detective italiano Ettore Camiaso - daí ser esse o idioma do sub-título acima - que, na ideia de Giancarlo Berardi, deveria ser 'um relacionamento importante e duradouro'. Mas, na BD - como na vida - 'não dá para saber, nunca dá'. Nesta última, por razões óbvias, nas histórias aos quadradinhos, quando estas imitam o real ou quando os editores vetam opções que, na sua óptica, podem introduzir mudanças demasiado sensíveis nas personagens e interferir na sua relação com os leitores. Ou dos leitores com elas. Como aconteceu quando era suposto Julia engravidar...

Mesmo assim, este primeiro relato desta edição, assenta mais no estabelecimento de laços entre Julia e Ettore do que na descoberta em Itália, de um cadáver enviado dos Estados Unidos. Como sempre, com a questão psicológica a condicionar avanços e recuos, decisões - ou recusa de as tomar.


Amore para Myrna

Sei que há leitores que não gostam de Myrna em Julia, que a acham demasiado fictícia e até invulnerável, muito próximo de uma super-vilã, mas o facto de Berardi a utilizar de forma moderada e espaçada, transforma cada uma das suas histórias (com Julia) num momento especial, numa pequena pérola, numa situação limite sempre imprevisível - mesmo que um pouco à parte na cronologia da criminóloga.

Ou não, como demonstra este Myrna: Infância perdida, em que a serial killer se volta a aproximar da sua amore, do alvo da sua paixão (doentia).

E em que Berardi explora a infância de Myrna e os traumas que fizeram (?) - dela o que é hoje, para nos zurzir mais uma vez com a relação de amor/ódio entre as duas personagens femininas mais fortes destas Aventuras de uma criminóloga, evidenciando que afinal têm mais em comum do que aparentam e ambas são capazes de levar a outra a limites inimagináveis.

Com a violência explícita a atingir neste relato níveis raramente mostrados na série, é a questão psicológica - que Julia vai expondo à sua psicóloga e explode no (re)encontro final - que assume maior preponderância e acaba por marcar uma das mais significativas histórias desta série.


J. Kendall As aventuras de uma criminóloga #142
> O Corpo Viajante
G. Berardi e M. Mantero (argumento)
Valerio Piccioni (desenho)
> Myrna: Infância perdida
G. Berardi e L. Calza (argumento)
Steve Boraley (desenho)
Mythos Editora
Brasil, Setembro/Outubro de 2019
135 x 180 mm, 256 p., pb, capa mole, bimestral
R$ 24,90 / 8,00 €

(capa disponibilizada pela Mythos; clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)

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