Fim
Cerca
de 14 meses e 14 volumes depois, chega ao fim a colecção Clássicos
da Literatura em BD.
Não foi um percurso linear - como os números atrás podem dar a
entender - nem sempre foi pacífico nem
consensual,
mas dificilmente poderia terminar melhor.
Porque
termina com uma adaptação de um romance de autor português: Amor
de Perdição,
de Camilo Castelo Branco.
Porque
termina com uma adaptação assinada por autores portugueses: João
Miguel Lameiras e Miguel Jorge. Reforça, por isso, a sua relevância em relação à importância que concedi há semanas ao lançamento de Os Maias.
Porque
termina com uma das melhores adaptações que a colecção viu - e
com uma boa adaptação tout
court,
não venham já aí os habituais Velhos do Restelo questionar os
termos de comparação.
Escrito isto, considerados estes quesitos, isso não invalida que na colecção haja adaptações mais conseguidas e adaptações menos conseguidas e - sim, são coisas diferentes - bandas desenhadas melhores e bandas desenhadas piores.
Mas adiante.
Saltando a divagação atrás, regresso à introdução para começar pelo fim. Repetindo-me, voluntariamente, volto a escrever: ter sucesso numa adaptação significa que esta última tenha vida própria no novo suporte. É o caso deste Amor de Perdição em BD.
Não seria fácil, até, dado o tom epistolar do original, mas JML foi capaz de reter o importante, retirar o supérfluo - dadas as exíguas 48 páginas disponíveis - e sem deixar mesmo de sublinhar o tal tom epistolar, pela introdução de algumas cartas durante o relato.
Concedo que aqui e ali podia ter aliviado (mais) a carga de texto, eliminando um ou outro recordatório ou balão de diálogo desnecessários mas, globalmente, o livro está equilibrado e possibilita um bom ritmo de leitura. E uma leitura que permite abarcar perfeitamente, quer os hábitos e costumes da época - que tão importantes são na propiciação do drama central do relato - quer a paixão a dois (e a três), entre Simão Botelho e Teresa de Albuquerque (e Mariana da Cruz).
Como cereja no topo do bolo, JML não se coibiu de espalhar pelo relato umas quantas referências que só os leitores habituais de BD apanharão.
Miguel Jorge - que há não muito tempo tinha assinado uma outra banda desenhada de época, A Viagem mais Longa - apresenta aqui um traço mais solto - e mais moderno em relação a outros livros da colecção - com um bom cunho realista, embora geralmente sem grandes pormenores nos fundos das vinhetas, possivelmente devido aos prazos a cumprir. Revela alguma falta de dinamismo, mas isso não é comprometedor na maioria do relato, especialmente porque as personagens correspondem às que 'vimos' quando lemos o romance de Camilo.
Apoiado na maior parte das vezes numa planificação mais tradicional, em duas ou três pranchas (duplas) atreve-se a experimentar soluções mais ambiciosas que conferem um maior dinamismo e são uma ajuda na mudança de ritmo de uma narrativa que essencialmente avança através de diálogos.
Nota final
Vinco de novo a importância desta colecção - fora do âmbito estrito dos leitores de BD - pela mediatismo que alcançou, através de anúncios recorrentes na RTP, parceira do projecto; por ter efectivamente chegado a outros leitores, como comprovam os volumes que foram esgotando; pela boa divulgação que teve nas livrarias, graças aos expositores próprios criados para o feito.
E, finalmente, por ter possibilitado a adaptação de dois romances portugueses - Os Maias e este Amor de Perdição.
Por tudo isto, uma segunda ‘dose’ de Clássicosda Literatura em BD faria todo o sentido. Fico à espera.
Amor
de Perdição
Adaptação
do romance homónimo de Camilo Castelo Branco
Clássicos
da Literatura em BD #14
João
Miguel lameiras (argumento)
Miguel
Jorge (desenho)
Levoir/RTP
Portugal,
2 de Novembro de 2021
210
x 285
mm, 57
p., cor,
capa dura
1o,90
€
(imagens disponibilizadas pela Levoir; clicar nesta ligação para descobrir mais, ou nas mostradas aqui para as apreciar em toda a sua extensão)
Sem comentários:
Enviar um comentário