
Nascido tardiamente para a banda desenhada, optou por esta arte, porque o cinema é "muito caro". Nascido numa família de operários, começou por experimentar um curso na área da física, que deixou para "se tornar professor de ginástica, até isso se tornar incompatível com a BD".

A banda desenhada permite-lhe "dizer o que quero a um círculo maior do que o dos meus conhecidos. Permite-me compartilhar as minhas ideias com uma audiência mais vasta. É através da banda desenhada que mostro o Mundo como o vejo. Que mostro que ele não está bem". Ou mais ainda: "Isto é um eufemismo. O Mundo está mesmo muito mal.". Porque "acho que o homem é naturalmente mau. Se aparece alguém bom é porque trabalhou muito nesse sentido. Ser bom é um combate permanente contra a nossa natureza que é má." E que pode fazer um autor de quadradinhos contra isso? "Modestamente, nas histórias que conto, mostro os podres que há no Mundo, não proponho soluções, todos as conhecemos, mas tento dar uma visão ética."
Convidado do XI Salão de BD do Porto, já tinha estado em "Portugal, nos três anos seguintes à Revolução de Abril". Já se interessava por Portugal "e antes por Espanha, porque tanto um país como outro viviam sob um regime fascista, que os oprimia. Nunca os tinha visitado, porque havia um Salazar e um Franco. Com o levantar desta hipoteca vim a Portugal para respirar o ar que então se vivia. Achei fantástica a enorme quantidade de pinturas murais que havia". E se algumas das utopias de então passaram, "assim como aquelas que França viveu após o Maio de 68, pelo menos uma coisa ficou: a possibilidade de as pessoas poderem dizer o que pensam. E já não há Salazar!".

Autor atento à banda desenhada que se vai fazendo, entre os seus autores favoritos destaca "muitos velhos e alguns novos!" Velhos como Tardi, Pratt e Muñoz e Sampayo ("por causa de quem comecei a fazer BD") e entre os novos aprecia Blain, David B., David Mazzuchelli… No Salão do Porto destacou positivamente aspectos das obras de Rui Ricardo, Pedro Brito, Markus Huber, Jason Crane ou Marjane Satrapi.
O aparecimento de L'Association no panorama francófono e a influência que ele teve a nível europeu foram muito importantes, "pois, como são contemporâneos das facilidades das novas tecnologias de impressão abriram a porta a autores que têm uma mensagem a transmitir e interessantes e novas propostas gráficas, de renovação da própria linguagem da BD".
Para quem está a começar, diz que "não há segredos para ter sucesso em banda desenhada; para se progredir só há um processo: trabalhar, trabalhar, trabalhar; envelhecer, envelhecer, envelhecer".
(Versão revista e actualizada do texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 3 de Outubro de 2001)