11/12/2009

Dieu en personne

Mac-Antoine Mathieu (argumento e desenho)
Delcourt (França, Setembro 2009)
187 x 265 mm, 128 p., cartonado


Resumo
Numa fila de espera, um homem aguarda a sua vez. Quando finalmente é atendido, apresenta-se como Deus e revela não ter documentos ou domicílio conhecido.

Desenvolvimento
O pretexto é prometedor: Deus regressa à Terra que criou, para ver o seu estado, combater a solidão que sente e aprender a faculdade de rir. Um Deus (bem) humano…
Mas este também é um Deus que mostra a sua divindade, pois é capaz de saber quantas moléculas há numa sala num determinado instante ou de resolver postulados matemáticos ou físicos até então insolúveis.
E se a primeira reacção dos humanos é de incredulidade, depois a multidão passa à crença. A que se segue, inevitavelmente, num mundo globalizado, o interesse mediático e o aproveitamento comercial. O primeiro, analisando o facto de todos os ângulos, o segundo, potenciando o “criador” sob todas as formas: logótipos, livros, música, puzzles, canecas, jogos, campanhas promocionais, sessões de autógrafos, entrevistas, espectáculos, um site…
Mas depois, aos poucos – quando o efeito “novidade” desaparece -, surge uma onda de revolta pelos (muitos) “defeitos” encontrados na sua criação que, golpe de teatro, acaba por originar um processo judicial duma dimensão sem precedentes.
Ao longo desse julgamento, duma enorme incongruência, vão-se acumulando as situações caricatas, as mais absurdas pretensões, com todos – advogados, cientistas, feministas, sociólogos, imprensa, economistas, psiquiatras, filósofos – sem lugar para o homem comum? – a tentarem apresentar e definir Deus.
Um Deus que face a tudo isto se revela cada vez mais cansado e farto de tudo e cuja (breve) história terrena termina (?) com um longo comunicado difundido através da televisão…

Mais do que uma história aos quadradinhos, este é um ensaio em BD sobre Deus, melhor, sobre a forma como Ele é visto pelas pessoas, curiosamente sem que sejam citados ou apareçam religiões, igrejas ou os seus ministros, aqueles que geralmente se anunciam como possuidores d(e tod) a verdade. E sem que Marc-Antoine Mathieu pretenda de alguma forma ter (um)a palavra (final) sobre o assunto.
Em suma, é uma visão laica de Deus, explicou o autor, criada com muita ironia, apresentada de forma sóbria, apesar do traço caricatural, com uma planificação diversificada que ajuda a atenuar o peso e a profundidade das palavras que Mathieu utiliza com mestria, em diálogos bem estruturados.

A reter
- A originalidade da ideia base.
- A forma como Mathieu disserta sobre Deus, em banda desenhada.
- A força dos diálogos.

Curiosidades

- Flaubert, Sartre, Jung ou Einstein são algumas das personalidades citadas ao longo deste ensaio aos quadradinhos.
- Este álbum recebeu o Grand Prix de la Critique 2010, em França, atribuído pela Association des Critiques et Journalistes de Bande Dessinée (ACJBD), entre as 3607 novidades editadas naquele país entre novembro de 2008 e Outubro de 2009.
- Não inocentemente, o livro foi publicado a 9/09/09, o que invertido dá…

10/12/2009

As Leituras dos Heróis – Loverboy

(segundo Marte, aliás, Marcos Farrajota)

Pergunta - Se lesse banda desenhada, quais seriam as preferidas de Loverboy?

Resposta - O Loverboy é um beto, filho do neo-liberalismo cavaquista e neto da cultura cristã (dois momentos negros da História!) logo não lê BD nem outra coisa qualquer.
Talvez o manual de IVA ou o Milan Kundera e pouco mais, mas se lesse BD provavelmente iria ler o mais baixo e reles que houvesse no mercado…
Bom… o que há no mercado? Talvez o Warhammer ou Conan, o Bárbaro? Pior, o Tex… mas acho muito pouco provável.

Loverboy #3 – (…) muda mas fica igual (…)

Marte (argumento)
João Fazenda )desenho)
Edições Polvo (Portugal, Novembro de 2001)
158 x 230 mm, 48 p., pb, brochado


A banda desenhada portuguesa não tem sido fértil em heróis, entendendo-se aqui o termo como referindo-se a protagonistas que passam de história em história, quer como personagens (quase) invencíveis, quer como simples condutores de narrativas mais abrangentes. E se nos primórdios ainda se conseguem encontrar alguns exemplos (frutos também da existência de revistas e jornais que permitiam uma publicação regular), na "moderna BD portuguesa", os dedos de uma mão sobram para os referenciar: o Espião Acácio de Relvas, confinado às páginas da revista "Tintin" (e a merecer reedição condigna), o Porto Bomvento, de José Ruy e, principalmente o Jim del Monaco, de Louro & Simões.
Agora, um outro nome começa a afirmar-se: Loverboy, que, depois de "O rebelde" e "A faculdade são dois ou três livros", regressa com "(…) muda mas fica igual (…).
Neste álbum, o traço de João Fazenda surge mais solto, mais estilizado, mais rebelde, quase escrevia "à imagem do herói", não fosse este álbum um retrato da passagem da juventude para a idade adulta. Passagem que vem depois da fase das bandas de garagem, e da entrada na faculdade, de que falavam os títulos anteriores escritos por Marte. Passagem despoletada por umas férias com os amigos e experiências com drogas, que têm como resultado o reconhecimento de um imenso vazio (houvesse mais com esta percepção…) e a necessidade de procurar algo mais da vida (o amor? uma relação estável? a necessidade de responsabilidade?).
O que ressalta deste terceiro livro é a vontade de mudar, de passar da adolescência (cada vez mais - e a culpa não é maioritariamente deles) vazia e fútil para a idade adulta, embora para isso seja necessário quebrar a própria auto-resistência, a comodidade de ser igual aos outros, resistir ao facilitismo instalado na sociedade.
Em termos do trabalho dos autores, o prosseguir no caminho agora esboçado, se de alguma forma pode implicar a perda de um público que se identifica com o anterior Loverboy, e que ainda não deu (não tem capacidade de dar) o mesmo passo em frente, embora arriscado é sem dúvida um desafio estimulante e, a médio prazo, capaz de dar a Loverboy uma consistência e uma dimensão já revelada pontualmente e que este álbum acentua.

(Texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 1 de Janeiro de 2001)

Tarzan dos Macacos

Condensação da novela de Edgar Rice Burroughs
Harold R. Foster (desenho)
Libri Impressi (Novembro de 2009)
230 x 215 mm, 72 p., pb, brochado com badanas

Resumo

A história de Tarzan, o rapaz branco adoptado pelos grandes gorilas africanos que cresceu como um selvagem e o seu posterior contacto com a civilização dos seus pais e com compatriotas, é um dos grandes mitos do século XX, criado na literatura e depois ampliado pelo força das imagens do cinema e da banda desenhada.

Desenvolvimento
Este tomo, recupera a adaptação para a 9ª arte da história original de Burroughs, publicada em 1929 e que ficou para a história como a primeira banda desenhada em estilo realista, num tempo em que toda a BD era cómica. O seu responsável gráfico foi Harold Foster – que viria a ficar famoso como criador do Príncipe Valente – que, com um traço ágil, nervoso e dinâmico, com um apreciável domínio do preto e branco e dos jogos de luz e sombras e uma multiplicidade de enquadramentos, recria de forma magistral a misteriosa selva africana, a selvajaria das suas criaturas ou a elegância do homem criado pelos macacos.
É um clássico que hoje, 80 anos depois, mantém toda a actualidade e modernidade porque, apesar do texto no rodapé das imagens, se trata de uma indiscutível sequência gráfica narrativa, em que as (soberbas) ilustrações muitas vezes quase dispensam o texto escrito.

A reter
- A força gráfica de um clássico com 80 anos.
- O notável trabalho de restauro das ilustrações originais de Foster (explicado no final do volume) feito por Manuel Caldas a partir de quatro edições, aproveitando de cada uma o melhor de cada desenho, num trabalho de rigor, minúcia, entrega e paixão que o ocupou durante algumas centenas de horas e faz desta edição a primeira em todo o mundo a apresentar, completamente restaurada e em todo o seu esplendor, a feliz conjugação dos talentos de Burroughs e Foster.

Menos conseguido
- Eu sei que possivelmente não havia (economicamente falando) outra solução para a montagem deste livro, que publica duas tiras por página dupla: como cada tira tem 5 vinhetas, no topo da primeira página temos 3 vinhetas e mais duas no topo da segunda página e, depois, 2 vinhetas no fundo da primeira página e 3 no fundo da segunda. No entanto, pessoalmente, preferia apenas uma tira por página, o que implicaria um livro mais baixo e comprido. Esquisitices, dirão alguns...

Curiosidades
- Tarzan dos Macacos é considerada a primeira banda desenhada realista.
- Todos os que leram o (magnífico) Tarzan de Joe Kubert, poderão descobrir nesta edição como ele se inspirou (tantas vezes) no original de Foster.
- O mesmo se passou com Frank Frazetta, por exemplo para desenhar a capa mostrada aqui ao lado, claramente inspirada na última vinheta da página 35 (em baixo).

(Versão revista e aumentada do artigo publicado originalmente a 5 de Dezembro de 2009, na secção de Livros do suplemento In’ da revista NS, distribuída aos sábados com o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias)

09/12/2009

As Leituras dos Heróis – Mathias


(segundo Giancarlo Malagutti, com desenho original e uma saudação de Itália *)

Pergunta - Se lesses banda desenhada quais seriam as tuas preferidas Mathias?

Resposta – Mas eu leio banda desenhada! Em casa temos muitas delas, são do papá mas eu também as leio. Martin Mystère, Tex, Alan Ford e até Astérix… e tantos outros de que agora não me recordo. A mim agradam-me Astérix e Benoit Brisefer, mas o meu preferido é Zagor. Lê-o também a minha amiga Anna embora diga sempre que não gosta de westerns.

* com a preciosa intermediação de José Carlos Pereira Francisco

08/12/2009

Mucha

David Soares (argumento)
Osvaldo Medina (desenho)
Mário Freitas (arte-final)
Kingpin Books (Portugal, Outubro de 2009)
184 x 260 mm, 36 p., pb, brochado com badanas


Marcando o regresso de David Soares à BD, depois de um interregno em que o romance – “A Conspiração dos Antepassados”, “Lisboa Trunfante” - teve a sua preferência, este livro mostra-o à vontade no tratamento de um tema – o terror – que lhe é grato.
Trata-se de uma história simples e banal, é verdade, mas incómoda pelo proximidade da ideia base – baseada numa premissa da peça surrealista “Rhinocéros”, de Eugène Ionesu - e pela forma aberta como é narrada, sem princípio nem fim, o que deixa no ar a ideia de que o que acontece nela pode voltar a ocorrer… num lugar perto de si! Sem levantar qualquer ponta do véu, para não estragar o efeito surpresa, sempre necessário no género, refiro apenas que se trata de uma história quase sem palavras, muitas vezes muda até, mas com muitas moscas, cujo zumbido incómodo e inquietante parece ouvir-se nas pranchas, como “se essa fosse a única banda sonora possível”, escreve, inspirado, Pedro Moura na introdução.
Responsável pelo argumento e pela planificação, Soares entregou o desenho a Osvaldo Medina - revelado com o magnífico “A Fórmula da Felicidade” - aqui coadjuvado pela arte-final de Mário Freitas, que dá espessura e um tom mais rude e grotesco ao traço mais fino e delicado de Medina, ajudando à composição do clima de medo e insegurança que transpira do relato e nos fará olhar para as moscas (nojentas e) banais de uma forma (bem) diferente após a sua leitura.

(Artigo publicado originalmente 28 de Novembro de 2009, na secção de Livros do suplemento In’ da revista NS, distribuída aos sábados com o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias)

07/12/2009

Lady S. #6. Salade portugaise

Jean Van Hamme (argumento)
Philippe Aymond (desenho)
Sébastien Gérard (cores)
Dupuis (Bélgica, Novembro 2009)
217 x 298, 48 p., cor, cartonado


Resumo
Shania Rivkas é uma jovem estoniana que trabalha como intérprete no Parlamento Europeu, em Estrasburgo. E é também Lady S., uma agente que, por vezes, trabalha às ordens da CIA.
Neste sexto tomo das suas aventuras, um imprevisto, involuntariamente relacionado com a preparação de um atentado terrorista da Al Qaeda, mais importante que os de 11 de Setembro, obriga-a a partir de urgência para Lisboa, para seguir uma pista que a pode levar a encontrar o pai, que julgava morto há uma dúzia de anos.

Desenvolvimento
Tudo começa, quando a sua companheira de apartamento, a bela Kadija, sempre sedenta de sexo, a convence a participar num jantar a quatro. Durante a refeição conhece Kader Bessaoui, um jovem e interessante professor islâmico.
Só que, desde logo, nem tudo é o que parece neste início de álbum, com (quase) todos os participantes a esconderem segredos e a assumirem ser o que não são, num desenrolar de situações – dois fugitivos mortos pela policia, um CD escondido na bolsa de Shania, um atentado da Al Qaeda em preparação, a notícia do aparecimento do pai da protagonista, a perseguição encetada por russos e muçulmanos radicais, uma atribulada refeição á sombra da ponte 25 de Abril, diversos atentados, uma animada perseguição pelas ruas lisboetas, um vistoso acidente automóvel…. - que se tornam cada vez mais intrigantes, até ao (também) inesperado final.
Esta é uma série típica da banda desenhada de aventuras de matriz franco-belga, dinâmica, com muita acção, ritmo elevado, suspense q.b., diversas surpresas e vitória final da protagonista, dos bons.
Pelo meio, Van Hamme, com a sua habitual competência, cria alguns laços com os tomos anteriores – que explicam alguns aspectos mas cuja leitura não é necessária para a compreensão deste episódio -, gere com eficácia as situações, puxa os cordelinhos certos, introduz diversos elementos surpresa, faz algumas inflexões no rumo da narrativa e, com isso, prende e cativa o leitor, que, sem dar por ela, percorre página após página em busca do desfecho que concederá algum descanso à adrenalina.
Aymond, sem deslumbrar, mas também sem erros de relevo, cumpre bem o seu papel, melhor nos cenários, pormenorizados e credíveis, do que no tratamento da figura humana, à qual falta um pouco mais de dinamismo.

Curiosidades
- Para nós, portugueses, este álbum apresenta a particularidade de dois terços das suas páginas se desenrolarem em Lisboa e arredores, a começar logo pela capa, que apresenta uma boa perspectiva da cidade e do castelo de S. Jorge. Algo raro, mesmo em obras de autores nacionais.
- A protagonista viaja num avião da TAP.
- Uma das cenas finais do livro utiliza de forma no mínimo curiosa um dos eléctricos lisboetas.
- Os diálogos incluem um balão num português impecável.
- E há também uma Amália (era inevitável o lugar comum) e – mácula desnecessária – um Manoël…

04/12/2009

BD e Literatura - L’Hôte

Jacques Ferrandez (argumento e desenho)
Galimard (França, Novembro de 2009)
235 x 315 mm, 62 p., cor, cartonado


Resumo

Este álbum baseia-se num conto de Albert Camus, retirado de “L’Exil et le Royaume”.
É a história de um preso acusado de ter morto um familiar, que é entregue a um professor para este o levar até à prisão. Por pano de fundo tem a (sombra da) guerra (de libertação) da Argélia.

Desenvolvimento
Aliás, pode bem dizer-se que a Argélia protagoniza esta (estranha) história, de tal forma ela é omnipresente, quer nos grandiosos cenários com que Ferrandez enche as páginas em que a acção se desenrola, quer como contexto sociopolítico de fundo, quer como matriz cultural das (poucas) personagens envolvidas. E, principalmente, na forma como a narrativa, pausada, quase muda, respira (e transpira) o país.
Algo quase inevitável em Camus – argelino de naturalidade e de vocação – como salienta Boualem Sansal na introdução em que defende a necessidade de releitura das obras do autor longe dessa sombra, para as valorizar mais.
O local central de “L’Hôte”, é uma pequena escola, perdida numa inóspita região montanhosa, onde um professor – branco, mas argelino – lecciona – e ajuda, e alimenta, e compartilha o que tem com – os poucos alunos que se recusa a abandonar, mesmo sob a ameaça do confronto civil.
A sua paz, é quebrada pela chegada de um polícia, com quem tem um laço familiar e afectivo forte, que o vem requisitar para ir entregar o preso – um indígena, se assim se me permite escrever - que o acompanha numa prisão a um dia de distância – a pé – porque a situação de tensão social o impede de o fazer pessoalmente. Apesar da recusa passiva do professor, o preso é-lhe entregue.
O resto da trama – o final desse dia, a noite e algumas poucas horas do dia seguinte – decorre numa situação de tensão latente entre duas formas de viver e pensar diferentes, embora com mais pontos de contacto do que inicialmente se suporia. Tentando tratar o preso com humanidade - como igual, algo impensável então – deixando-o livre e a dormir no mesmo quarto, o professor não deixa de temer pela sua vida. O preso, receoso do que o espera, não compreendendo a atitude de quem agora o escolta, também surge algo perdido numa situação que não buscou.
Após o pequeno-almoço, partem para o destino – a prisão anunciada. Aparentemente, porque o propósito do professor é diferente, como o demonstra ao chegarem a um local onde deixa ao detido escolher o destino: a cidade onde está a prisão ou a liberdade junto das tribos nómadas
Não vou revelar a escolha, nem as consequências (eventuais) dela para o professor – e são estas que marcam sem dúvida o tom do relato, que é antes de mais uma ode à liberdade, ao direito ao livre arbítrio e ao desejo de conviver com a diferença. Apesar do tom pessimista desse mesmo final, sem dúvida uma das marcas fortes da escrita de Camus.
Jacques Ferrandez, também argelino, com uma planificação em que utiliza muitas vezes pranchas (ou pelo menos grandes vinhetas) duplas, traçadas com belas aguarelas, em que enquadra (outr)as vinhetas em que decorre a acção, consegue dar o protagonismo ao país, à agreste paisagem, quase lunar, conseguindo belos efeitos e retardar a leitura, pausando-a e reforçando sensações de silêncio, solidão, impotência…
As excepções são os dois diálogos – do polícia com o professor e deste com o detido – aparentemente simples e directos, mas com inúmeras implicações de vária ordem, que obrigam a uma e outra releitura para interiorizar completamente o peso das palavras e, mais ainda, dos incómodos silêncios que as permeiam.

A reter
- A forma como a Argélia – a sua paisagem, o seu espírito(?) – se impõe na planificação e está interiorizada na narrativa de Ferrandez.
- O final, forte, inesperado, imprevisível, que reforça a sensação de solidão e impotência que são permanentes ao longo do conto.

Menos conseguido
- A forma menos feliz como estão desenhados os protagonistas, algo rígidos e pouco expressivos.

03/12/2009

As Leituras dos Heróis – Nathan Never

(segundo Michele Medda *)

Pergunta - Se lesse banda desenhada quais seriam as preferidas de Nathan Never?

Resposta – Em minha opinião, Nathan Never leria as bandas desenhadas de Oesterheld, sobretudo Mort Cinder e Ernie Pike.

Quanto a romances, por sua vez, recordo-me que mostramos livros na sua biblioteca mas não me lembro em que história. Parece-me que seriam “The Grapes of Wrath”, de John Steinbeck, “Ten Little Niggers”, de Agatha Christie, e “The Lord of Rings”, de Tolkien. E, seguramente, tudo de Chandler!


* com a preciosa intermediação de José Carlos Pereira Francisco

BD para o Natal – De Profundis

De Profundis Miguelanxo Prado ASA (Portugal, Setembro de 2008) 300 x 212, 88 p., cartonado, edição com DVD
“De Profundis” é a história de uma relação intensa e apaixonada de um pintor pelo mar, contada na forma de filme animado por Miguelanxo Prado. Conhecido (e aclamado) como autor de BD, o autor galego, aquando da sua passagem pelo Fantasporto, em 2007, definiu-o ao JN como “uma pesquisa artística para relacionar a pintura, a música e as novas tecnologias da imagem, um projecto extremamente pessoal" no qual se empenhou "durante quatro anos: os dois primeiros na pré-produção, e os dois seguintes de dedicação total e exclusiva", porque fez "todos os desenhos - em pintura a óleo - necessários para a animação". Mas desengane-se quem pensa ir assistir a uma película animada por computador, em 3D, com ritmo frenético e (algum) humor; Prado optou pela animação tradicional e um ritmo contemplativo, “para quem é capaz de estar 15 minutos a ver um pôr-do-sol no mar". O que não impede que neste filme, talvez como nunca, o desenho virtuoso de Prado brilhe, reluza, cative e atraia, realçado pela forma pausada como a acção decorre, qual mergulho extasiado no mar que o protagoniza, ao som da música original (indissociável da animação) de Nani Garcia “um amigo, músico de Jazz, com larga experiência de escrita de música para cinema e televisão", cujas composições, interpretadas pela Orquestra Sinfónica da Galiza, marcam o ritmo, acentuam a narrativa, exprimem emoções e sensações e são o único som dos 75 minutos deste filme sem diálogos, produzido pela Continental Producciones, em co-produção com a Desembarco Produccións e a Zeppelin Filmes. A história, lê-se na versão em banda desenhada (ou texto ilustrado…?), editada pela ASA, começa numa “casa no meio do mar, que tinha uma torre voltada a Poente, uma escadaria que se estendia pela água adentro e, a Levante, uma árvore que floria entre Março e Abril”. Nesta minúscula e estranha ilhota, um lugar de todo improvável, que desde logo marca o tom do filme, fantástico e maravilhoso, mais próximo do sonho do que da (nossa) realidade cinzenta, “viviam, apaixonados, uma mulher que tocava violoncelo e um pintor fascinado pelo mar e pelas suas criaturas…”. Pintor que, após um naufrágio, enceta uma viagem iniciática pelo misterioso fundo do mar, onde redescobre tudo o que já pintou - memórias que desconhecia serem-no – de desfecho fantástico.
Mais aberto no filme, que apela mais à descoberta, à capacidade de nos maravilharmos; mais directo no livro, de respostas mais concretas. Na origem desta história, simples e maravilhosa, combinação onírica de fantasia e lendas marítimas, está a paixão pelo mar (da Corunha, onde o autor vive). Prado acredita que os portugueses "que vivem com o mesmo Atlântico que me inspirou" e que têm “uma cultura marítima e uma relação próxima com o mar, terão uma sensibilidade especial para entender a história, o seu lado onírico, a mitologia de sereias e monstros marinhos, os sonhos e terrores que o mar inspira". E, se a gestação de "De Profundis" coincidiu com a catástrofe do petroleiro "Prestige", Prado nega "a ideia de denúncia”; o filme tem “uma clara vocação de redenção, uma espécie de ritual propiciatório, um pedido de perdão. Pretende recuperar o oceano na sua concepção mais limpa, mais brilhante, mais tradicional. É um conto, com muita poesia". (Versão revista e actualizada de dois textos publicados no Jornal de Notícias em 17 de Novembro de 2008 e em 28 de Julho de 2009)

Israel - Sketchbook

Ricardo Cabral (texto e desenhos)
ASA (Portugal, Outubro de 2009)
172 x 236 mm, 214 p., cor, cartonado


Este é um livro sem histórias, um livro que desfia – em belos desenhos presos no papel - lembranças, sensações, instantâneos, pequenos momentos banais, daqueles pequenos momentos banais que, todos juntos, formam horas, dias, meses, uma vida.
É um livro com muitas histórias, tantas as que possamos imaginar relacionadas com cada lugar que nos mostra, tantas as que possamos adivinhar em cada rosto que retrata, tantas quantas as que possamos intuir na vida de cada pessoa que cruza as suas páginas.
É um livro com uma única história, a vivida por Ricardo Cabral ao longo de várias viagens a Israel, porque esta é uma obra pessoal: – são as suas impressões, as suas sensações, é o seu olhar transmitido pelos seus desenhos e pelas suas (poucas) palavras.
Um Israel menos mediático, onde não encontramos o país “vencedor da Guerra dos Seis Dias” nem o “opressor dos palestinianos”, mas onde ainda há o Muro das Lamentações, a Igreja do Santo Sepulcro ou a fronteira com Gaza. Mas, acima de tudo, o Israel anónimo, desconhecido, ignorado, tão mais real, feito de paisagens diferentes mas vulgares, de ruas e quiosques, de desertos e praias, habitado por gente diferente, que fala uma língua diferente, mas que é igual àquela com quem nos cruzamos todos os dias. Um Israel que Ricardo Cabral nos revela com os seus desenhos, quase sempre de base fotográfica, mas cujo traço ganha maior espontaneidade, mais vida, mais força quando usa (só ou também?) o esboço do momento.
E se o desenho é agradável, revelador, se prende e dá vontade de mergulharmos nele, o que mais se salienta é a cor, as cores - que o fundo negro das páginas faz sobressair, num contraste bem conseguido - que em muitas páginas parecem bem mais do que tintas aplicadas num papel, transmitindo, quase, o calor abrasador ou a brisa do fim da tarde, que nos fazem procurar o sol que projecta esta ou aquela sombra ou os elementos que as provocam.

(Artigo publicado originalmente 28 de Novembro de 2009, na secção de Livros do suplemento In’ da revista NS, distribuída aos sábados com o Jornal de Notícias e o Diário de Notícias)

Nas bancas – Edições Mythos

Estão já nas bancas nacionais as revistas da brasileira Mythos Editora que um atraso alfandegário impediu que fossem distribuídas em Novembro.
Eis a sua relação:
Tex #449 - Chantagem Infame, de Claudio Nizzi e Giovanni Ticci

Tex Colecção #241 - A Mesa dos Esqueletos, de G. L. Bonelli e Giovanni Ticci.
Tex Edição de Ouro #34 - Além da Fronteira, de Claudio Nizzi e Raffaele Della Mónica
Zagor #98 - Pirâmide de Sangue, de Moreno Burattini e G. Ferri
Zagor Extra #62 - Luta Sem Quartel, de Toninelli e Donatelli
J. Kendall – Aventuras de uma criminóloga #55 - Enigmas Mortais, de Giancarlo Berardi, L. Calza e Ernesto Michelazzo
Magico Vento #84 - Punho de Aço, de Gianfranco Manfredi e Mario Milano
Conan, o bárbaro #71


Também já nas bancas está a revista Mundo dos Super-Heróis #14 (Editora Europa), com um dossier Stan Lee e artigos sobre Watchmen, Joe Bennett, Darkseid e Constantine, entre outros.

02/12/2009

As Leituras dos Heróis – Ken Parker

(segundo Ivo Milazzo *)

Pergunta - Se lesse banda desenhada quais seriam as preferidas de Ken Parker?
Resposta – Todas aquelas cuja sintonia entre texto e desenho conseguem envolver-me e oferecer-me alguma emoção.

* com a preciosa intermediação de José Carlos Pereira Francisco
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