25/11/2009

Rides

Paco Roca (argumento e desenho)
Delcourt (França, Março de 2007)
200 x 263 mm, 104 p., cor, cartonado com sobrecapa com badanas


Velhos são os trapos, diz o adágio popular. Mas velhos seremos, também, todos nós, um dia, se o tempo nos deixar chegar lá. Se o corpo mandar. E, principalmentem, se a mente quiser. Porque, eu pelo menos acredito nisso, a velhice é um estado de espírito. Que faz de muitos "jovens", seres completamente senis, e de muitos "velhos", jovens na flor de idade.
"Rides", de Paco Roca, fala-nos da velhice. Não tanto enquanto estado de espírito, embora o conceito lá esteja subjacente, mas enquanto realidade incontornável. Isto, porque se passa quase totalmente num asilo - num lar de idosos, preferirão alguns, por soar mais "politicamente correcto".
Mas o que pode ter de "politicamente correcto" um lar como o que é aqui recriado - possivelmente espelho demasiado fiel (e em muitas casos até optimista) da triste realidade que estas instituições são - quando este não é mais do que um depósito de idosos, dividido em dois andares, o de baixo para os que ainda são autónomos, o de cima para os que pouco mais fazem do que vegetar à espera do fim, mas todos condicionados à mesma rotina estéril que apenas parece prepará-los (empurrá-los?) para o seu fim: acordar-tomar o pequeno-almoço-ver televisão-almoçar-ver televisão-jantar-dormir…
Narrativa ficcional, mas baseada em factos verídicos, que o autor viveu/ouviu contar/investigou, começa quando Émile é colocado no tal lar pelo seu filho (e nora…) quando os primeiros sinais da doença de Alzheimer se começam a manifestar, levando-o, cada vez mais frequentemente, a perder as memórias do presente, "refugiando-se" no passado - e atente-se na forma como Roca mostra isto graficamente, não só mostrando Émile quando era novo, mas, principalmente apagando as faces dos que o rodeiam ou deixando vinhetas/páginas em branco, dando uma força inusitada às consequências da sua doença.
A (in)adaptação de Émile, o seu relacionamento com os outros "hóspedes", as especificidades de cada um (da doença de cada um…), a sua progressiva perda de faculdades, num declínio inexorável e assustador, são narrados com crueza mas também ternura por Paco Roca e se o tom do relato é aparentemente leve e bem-disposto, ao que ajuda a sua linha clara, agradável, de traço
delicado, e com toques de bom humor - a velhice origina muitas situações caricatas - o todo incomoda e choca. Por vermos como a sociedade (lemos os outros? - só os outros….?) trata os seus velhos.
Por sentirmos que, um dia, podemos ser nós a estar lá.

(Versão revista e actualizada do texto originalmente publicado no BDJornal #18 de Abril/Maio de 2007)

As Leituras dos Heróis – Super Pig

(segundo Mário Freitas)

Pergunta - Se lesse banda desenhada quais seriam as preferidas do Super Pig?


Resposta – Leria Grant Morrison, David Soares, Nuno Duarte e, na literatura, Phillip K. Dick e Milan Kundera.

A melhor BD da década?

Encontrei por acaso esta lista que já tem os melhores (30) comics da década actual, apesar de ainda só terem decorrido 9 anos dela...
Que, vale o que vale – melhor, como todas as listas e prémios, tem o valor que quisermos.
Até porque, sendo americana, põe logo de parte, à partida, todas as obras que não chegaram aos EUA. E (quase, quase, quase) todas as de autores estrangeiros.
Eu, desta lista, li 11 livros e não teria dificuldades em colocar alguns num top pessoal deste género, a começar desde logo pelo notável Blankets, para mim um dos melhores livros que li nesta década - e nas outras todas!
E para vocês, quais as melhores bandas desenhadas que o século XXI já (vos) trouxe?

23/11/2009

As Leituras dos Heróis – Nick Raider

(segundo Gianfranco Manfredi *) Pergunta - Se lesse banda desenhada quais seriam as preferidas de Nick Raider?
Resposta – Penso que a banda desenhada favorita de Nick Raider seria Dick Tracy.

20/11/2009

Tex Edição Histórica #73 e #74

Giovanni Luigi Bonelli (argumento)
Erio Nicolò (desenho)
Mythos (Brasil, Setembro e Novembro de 2007)
136 x 177 mm, 260 + 260 p., pb, brochada


Resumo

Uma misteriosa personagem, apoiada por importantes figuras de Washington, interessada em apossar-se dos terrenos da reserva onde vivem os navajos chefiados por Tex, consegue fazer com que este seja condenado a 20 anos de cadeia por um assassínio que não cometeu. Depois, consegue a nomeação de um agente indígena de sua confiança o que obriga Kit e Jack Tigre a guiar os peles-vermelhas para o interior da reserva.

Desenvolvimento
Para além de ser uma das maiores histórias de Tex (mais de meio milhar de pranchas) esta é também uma das histórias mais apreciadas pelos fãs. Justamente, diga-se, não só pela forma como está escrita e se desenvolve (quase sempre) em bom ritmo, mas porque foge ao que é habitual na série. Porque Tex, em grande parte dela é apenas espectador ausente, porque se vê condenado por um assassinato que não cometeu, porque tem que experimentar (embora de forma breve – e a obra teria ganho se a sua estadia no presídio de Vicksburg fosse mais extensa) a vida na prisão para onde geralmente envia os seus adversários - pelo menos aquele que não despacha no imediato com uns quantos tiros certeiros… - , porque o protagonismo é entregue a Kit Carson e Kit Willer.
Todos estes aspectos estão bem interligados numa trama bem urdida, passe algum exagero na facilidade com que Tex cai na armadilha inicial, mas merece destaque em especial a forma como a situação na reserva se degrada e, fosse outra a série, a certa altura do relato quase poderíamos acreditar que “A grande intriga” narrava o fim das aventuras de Tex.
Claro está, que com o ranger isso não poderia acontecer e no final tudo se resolve a contento dele e dos seus amigos, com o esquema desvendado e os bandidos derrotados, mas, até se chegar a esse ponto, são várias as inflexões no argumento e os momentos de dúvida ou suspense introduzidos, o que faz deste western, em que a amizade desempenha um papel marcante, uma obra cuja leitura desperta e prende o leitor.
Uma referência – por ser pouco vulgar em Tex – para o papel importante desempenhado por uma mulher, no caso a bela e bem feminina Myra Solano, um dos elos principais da tramóia que se abate sobre o ranger, desenhada primorosamente por Nicolò, com a sua beleza a destacar-se ainda mais em contraste com as feições duras com que o desenhador italiano dotou a maior parte dos protagonistas masculinos. Referência ainda para o seu bom domínio da planificação e para a utilização de uma grande variedade de enquadramentos, com os quais consegue tornar dinâmicas mesmo longas sequências em que as personagens apenas conversam.

A reter
- A originalidade do argumento, considerado no conjunto das histórias de Tex.
- O bom trabalho gráfico de Nicolò.

Menos conseguido
- A excessiva provocação de Tex à sua futura suposta vítima.
- A facilidade como um homem com o passado do ranger é condenado como se fosse um desconhecido.
- Alguns desajustes temporais na narrativa.

Curiosidade
- Aquando da publicação original, a história prolongou-se por cinco números do título mensal do ranger e, no caso presente, obrigou a dividi-la por dois números da colecção Tex Edição Histórica, que geralmente publica histórias completas
- Ambas as edições trazem introduções, de Júlio Schneider (no #73) e de Sergio Bonelli (#74).

(Texto publicado originalmente no Blog do Tex, em 13 de Novembro de 2009)

19/11/2009

Lançamento - Blake & Mortimer – A Maldição dos 30 Denários T.1

Jean Van Hamme (argumento)
René Sterne e Chantal De Spiegeleer (desenho)
ASA (Portugal, Novembro de 2009)
56 p. cor, cartonado


“A Maldição dos Trinta Denários” é o título do novo álbum de Blake e Mortimer que amanhã chega às livrarias de França, Bélgica e Portugal. Ou pelo menos deveria, pois a maldição citada no título parece ter-se estendido à gestação e lançamento da obra.
Desde logo, porque o autor escolhido para o desenhar René Sterne, começou por demorar imenso tempo para o desenhar, devido ao extremo rigor e perfeccionismo que sempre empregou nas suas obras.
Depois, porque a morte o levou em Novembro de 2006, quando ainda só tinha terminado uma vintena de páginas daquele que era o maior desafio da sua carreira. Finalmente, no que a nós diz respeito, porque problemas na impressão atrasaram a chegada do álbum aos armazéns da ASA, pelo que possivelmente nem todas as livrarias nacionais o receberão amanhã.
Décimo nono tomo das aventuras de Blake e Mortimer, a nova história, de novo escrito por Jean Van Hamme (“O caso Francis Blake”, “O Estranho Encontro”), cujo desenho foi terminado por Chantal De Spiegeleer, esposa de Sterne e também autora de BD, começa com a ida de Mortimer à Grécia para comprovar uma notícia arqueológica fantástica: a descoberta dos 30 denários que Judas recebeu por ter traído Jesus Cristo. Isto ao mesmo tempo que começa a circular a notícia da fuga de Olrik da prisão onde se encontrava detido…
Depois, bem, depois leiam o álbum… e aguardem pela sua conclusão no segundo tomo, previsto para 2011.

Curiosidade
- A edição portuguesa conta com duas capas diferentes, uma igual à da edição original, aqui ao lado, para os 5000 exemplares da tiragem normal, e outra, desenhada de propósito para Portugal, no início deste post, para uma tiragem especial de 1000 exemplares para as lojas FNAC.

BD para o Natal – Krazy + Ignatz + Pupp

Escrevo aqui o primeiro de uma série de posts com sugestões de prendas de Natal aos quadradinhos, porque acredito que um livro é – sempre foi, sempre será – uma das melhores prendas que se pode oferecer. No Natal, ou noutra altura qualquer, claro está!
Embora (quase) todos os livros aqui referenciados em As Leituras do Pedro sejam boas prendas, vou tentar fugir do óbvio e acredito que a minha segunda sugestão vai ser uma bela e agradável surpresa para (quase) todos.
Mas enquanto essa não chega, para já, fiquem com:


Krazy + Ignatz + Pupp
Uma Kolecção de Pranchas a Kores Kompletamente Restauradas
George Herriman (argumento e desenho)
João Ramalho Santos (tradução)
Álvaro Pons (introdução)
Manuel Caldas (restauro)
Libri Impressi (Portugal e Espanha, Novembro de 2009)
230 x 324 mm, 48 p., cor, brochado


Por várias razões.
Desde logo, embora razão menor, porque a “marca” Manuel Caldas é sinónimo de qualidade e excelência, patente nesta edição cuidada e esmerada, com uma cuidada tradução - e não percam a oportunidade de ver o que ela exigiu! - e que inclui a reprodução de uma prancha no tamanho em que foi desenhada originalmente (40 x 60 cm), a que se deve apontar o facto de ter “apenas” pouco mais de quatro dezenas de pranchas…
Depois, principalmente, porque Krazy Kat, publicada entre 1913 e 1944 - nas belíssimas e inigualáveis pranchas dominicais coloridas só a partir de 1935 -, é um clássico incontornável, de uma modernidade surpreendente. Apesar de as personagens se limitarem praticamente aos três vértices de um estranho triângulo amoroso composto por uma gata (às vezes gato?!) – Krazy Kat - apaixonada por um rato – Ignatz -, que só deseja atirar-lhe tijolos à cabeça, o que faz com que seja preso pelo cão guarda – Pupp – que por sua vez suspira por Krazy. E da sua trama se reduzir à exploração das várias formas como um tijolo pode ser lançado e das várias maneiras como pode atingir o(s) seu(s) alvo(s), sendo que no final de cada prancha auto-conclusiva Ignatz acaba (quase, quase) sempre na cadeia.
E tudo (ou só) isto decorre no cenário surreal de Coconino County, cuja paisagem muda de aspecto e configuração a cada vinheta. Literalmente.
Pelo meio, o autor consegue jogar com os códigos da própria BD, pondo as personagens a desenharem-se a si mesmas ou à própria história, dando o protagonismo a um capacho onde se lê “Bem Vindo”, usar pirilampos para iluminar a acção – parte dela – durante um eclipse ou não ser capaz de concluir a numeração das vinhetas…
Ou…
Comprem antes o livro, melhor dois livros (pelo menos), um para lerem, o(s) outro(s) para oferecer(em) e, como eu, vejam como noções como “tempo” e “espaço” não fazem sentido em Coconino County – deixam de fazer também para nós durante a leitura - e vivam a “experiência sensorial que deslumbra o espectador de hoje tanto como no seu tempo deslumbrou Picasso, Cummings e Kerouak, os quais viam nas suas páginas o cume da arte do século XX” como escreve Álvaro Pons na (inspirada) introdução e tornem possível que depois desta (tão curta) selecção, venha outra mais alargada ou até, Kem çabe, a Kolecção Kompleta de Krazy Kat Kompletamente Restaurada…

Ah! E já agora, peçam o livro directamente ao editor, porque funcionando como (não) funciona o mercado e a distribuição em Portugal, é possível que de outra forma não o consigam antes do Natal…

18/11/2009

As Leituras dos Heróis – Tex (II)


(segundo Alfonso Font *)

Pergunta - Se lessem banda desenhada quais seriam as preferidas de Tex, Kit Willer e Kit Carson?

Resposta – Sem o saber ao certo, porque cavalgo com Tex somente nos momentos de acção e não sei o que faz nos momentos de relaxamento, ousarei dizer que lê Corto Maltese e também que sorri condescendente quando lê as histórias que, pobres de nós, se referem à sua própria vida, logo Tex lê Tex. Surpreende-se sempre com as coisas extraordinárias que sucedem a Dylan Dog, ainda que esta seja a personagem preferida do seu filho Kit. Enquanto Carson, quando sabe que não está a ser observado por ninguém, lê Tintin, sobretudo porque o Capitão Haddock é o seu favorito!


* com a preciosa intermediação de José Carlos Pereira Francisco

Lançamento - Sonho sem Fim

Pedro Couceiro (história)
Hugo Jesus (argumento)
Rui Ricardo (desenho)
ASA (Portugal, Novembro de 2009)
221 x 293 mmm, 48 p., cor, cartonado


Se a vida de algumas pessoas dava um (ou vários) livros, Pedro Couceiro é certamente um deles, por isso não surpreende que amanhã, dia 19 de Novembro, seja apresentado, no Hotel Tivoli (Av. da Liberdade, 243, em Lisboa), "Sonho sem Fim", um álbum de banda desenhada que relata a vida do piloto, já disponível nas livrarias.
Editado pela ASA, tem argumento de Hugo Jesus, que publica o seu primeiro livro, e desenho de Rui Ricardo, o mesmo de “Jogos Humanos”, “Canção do Bandido” (ambos com Paulo Patrício) ou “Superfuzz” (com Esgar Acelerado).
Na origem do livro está uma paixão antiga de Pedro Couceiro pelos quadradinhos, que com esta obra de tom didáctico pretende transmitir a mensagem de que na vida nada é impossível quando se acredita e trabalha por isso, para que “todas as crianças e não crianças que têm um sonho por realizar possam ter uma visão mais optimista do futuro", afirma o piloto.
Antes do pequeno cantor e do campeão das pistas, o livro aborda o percurso do homem, através de pequenos acontecimentos que ajudaram a moldar a realidade e a construi-la “em cima de sonhos, cimentando bases para o meu futuro e vendo sempre o amanhã como um dia melhor que o de hoje”, diz, para reforçar a ideia.
Embaixador da Unicef para Portugal desde 1995, Pedro Couceiro decidiu que as receitas deste livro reverterão exclusivamente a favor das Aldeias SOS, instituição que visitou no início da sua carreira internacional e que o marcou profundamente pela obra que desenvolve em prol de tantas crianças. Para isso conseguiu a parceria da Navigator, que forneceu o papel, da Lithoformas, que realizou a impressão e encadernação, e da Leya-Asa, responsável pela produção e distribuição do álbum. Sem estes apoios “não teria conseguido realizar mais este sonho e, em especial, angariar verbas extras para uma causa tão nobre”.

(Versão revista do artigo publicado no Jornal de Notícias de 17 de Novembro de 2009)

Le Télescope

Jean Van hamme (argumento)
Paul Teng (desenho)
Casterman França, Novembro de 2009)
242 x 321 mm, 86 p., cor, cartonado


Resumo
Julien, Marcello, Charles, René e Louis somam em conjunto 300 anos; Jo, a bela e sensual desconhecida que regularmente espreitam através de um telescópio, pela janela do apartamento em frente ao de Julien, não passou ainda dos 25.
Eles, estão no ocaso da vida, com os sonhos perdidos e as esperanças desvanecidas; sobrevivem, apenas, em grande parte devido à amizade que há muito os une. Ela, habituada a viver de luxos conseguidos à custa do seu corpo e dos seus (falsos) afectos, tem ainda muitos sonhos para cumprir.
O encontro dos seis, vai ter consequências (in)esperadas.

Desenvolvimento
Após esse encontro, os cinco velhos – não haja medo de o escrever, são-no já nos corpos e nas mentes – vão viver seis semanas de sonho (para eles…) e reencontrar uma razão para (voltarem a) viver – vão como que rejuvenescer. Ou para viverem pela primeira vez, esgotando-se fisicamente, esgotando os seus recursos financeiros, como se tivessem todo o tempo do mundo para se recuperarem.
Jo – surpreendentemente – desse contacto, desse tempo, desses encontros, descobre que a vida pode ser bem diferente, que os sonhos não têm que seguir sempre os mesmos caminhos, que a felicidade pode ser menos custosa e estar mais perto do que imagina.
Dessas curtas seis semanas, nasce uma curiosa proposta: tirar partido das informações sigilosas que a bela jovem reuniu enquanto acompanhava um poderoso construtor com fortes ligações ao poder político para que os cinco homens façam fortuna. E, quem sabe, a façam (de novo) feliz.
Com esta base, Jean Van Hamme, longe dos relatos de acção (XIII, Largo Winch, etc.) que o celebrizaram, constrói uma trama de crítica social, sobre a velhice e a (consequente) perda de ilusões, o amor e os seus custos, e as ligações entre a imobiliária e a política.
Fá-lo com a competência habitual, sem deslumbrar mas divertindo, multiplicando as surpresas, mudando o rumo da narrativa a seu bel-prazer, da crónica quotidiana à intriga financeira e ao policial, com toques de humor e ternura, para a terminar como um verdadeiro conto de fadas. Em que todos casam e vivem felizes para sempre. Ou quase.
Que se perdoa e aceita, porque por vezes é preciso acreditar nos sonhos. Nem que seja nos dos outros.
Paul Teng, holandês, 54 anos, foi o escolhido para colocar em imagens este conto urbano, ao qual aplicou um traço semi-realista que evoca o de Boucq, com o qual criou personagens distintas e consistentes, seres humanos vulgares, não super-heróis nem modelos ou actores, sobressaindo apenas os traços da bela Jo.

Curiosidade
- Este álbum é a adaptação de um romance da autoria do próprio Jean Van Hamme, datado de 1992.

17/11/2009

Johan et Pirlouit #4 - Les Années Schtroumpfs

Peyo (argumento e desenho)
Dupuis (Bélgica, Outubro de 2009)
218 x 230 mm, 276 p., cor, cartonado

Resumo
Johan foi criado por Peyo em 1946, num gag de apenas 4 vinhetas em que era louro. O autor recuperá-lo-ia mais tarde, já com cabelo preto, para protagonista de uma série medieval de capa e espada, de tom humorístico, acentuado pela formação de uma parelha com Pirlouit, a partir do terceiro tomo da série.
E se ela era a preferida do seu criador, hoje é mais conhecida por nas suas páginas terem surgido pela primeira vez os célebres Schtroumpfs, cujo sucesso obrigou Peyo a abandonar progressivamente Johan et Pirlouit, ao cabo de 13 álbuns e algumas histórias curtas.
Este quarto e último volume da reedição integral inclui os álbuns “La guerre des 7 fontaines”, “L'anneau des Castellac”, “Le pays maudit” e “Le sortilège de Maltrochu”, todos datados dos anos 60 e os últimos escritos e desenhados por Peyo, então em paralelo com as primeras aventuras dos anõeszinhos azuis.

Desenvolvimento
A participação destes últimos numa das histórias, aliás, faz perceber porque tiveram mais sucesso que os dois heróis em questão, devido à sua originalidade.
Porque “Johan et Pirlouit”, uma banda desenhada de humor e acção, dentro de um género então popular, não tinha maiores ambições do que o distrair e dispor bem, o que, refira-se consegue com eficácia.
As histórias revelam a construção semana a semana, sem argumento nem ritmo definido, para além de uma ideia geral, adivinhando-se que Peyo – como todos os seus colegas de então, homem de mil e um heróis e histórias – ia descobrindo as façanhas dos seus heróis ao mesmo tempo que as contava aos seus leitores.
Apesar disso, a sua leitura não permite descobrir lapsos de maior ao nível dos argumentos, que combinam aventura, feitiçaria, seres fantásticos ou misteriosos, humor e acção em doses equilibradas, sejam os heróis movidos pelo desejo de ajudar um fantasma a reencontrar paz de espírito, um náufrago a reconquistar o seu ducado, o seu rei a redescobrir a alegria de viver ou um príncipe transformado em cão a recuperar a forma humana. Tudo no meio de muitos perigos, diversas surpresas, inúmeras peripécias, gags divertidos e actos de coragem, no final dos quais os heróis vencem sempre e o bem prevalece.
O traço de Peyo, ágil, vivo, expressivo e agradável, contribui para uma leitura agradável, fluida e dinâmica.

Relidas hoje, com o distanciamento que o tempo e a época actual permitem, as aventuras de Johan et Pirlouit valem pelo reencontro com uma ingenuidade genuína que a banda desenhada de então tinha – para o bem e para o mal… – e que nos nossos dias raramente ostenta.

A reter
- O completo dossier sobre Peyo e Johan et Pirlouit, com documentos inéditos ou raros, que serve de introdução ao álbum.
- O baixo preço – apenas 22 € para quase 300 páginas coloridas e uma edição sem nada a apontar - uma agradável surpresa, habitual nas reedições integrais francófonas.

Curiosidade
- Uma das histórias curtas publicadas neste volume têm origem num concurso da revista Spirou, que desafiou os seus leitores a legendarem uma BD de 4 páginas elaborada por Peyo. Entre os participantes, contou-se um certo… René Goscinny!
- Em Portugal, onde foram publicados em revistas como “O Cavaleiro Andante”, “Zorro”, “Jacaré” ou “Spirou” (2ª série), Johan passou a Joanico ou João (conforme os casos) e Pirlouit foi rebaptizado como … Pirolito! Estavam à espera de quê?
- A União Gráfica editou mesmo três álbuns com as suas aventuras: “O Juramento dos Vickings” (5º álbum da série), “A Flauta de Seis Schtrumpfs” (9º, mais tarde reeditado pela Verbo na forma de romance ilustrado) e “O Anel dos Castellac” (11º).

16/11/2009

As Melhores Tiras de Nico Demo


Maurício de Sousa (argumento e desenho)
Editora Globo (Brasil, 2003)
137 x 208 mm, 96 p., pb, brochado


Nico Demo é uma criação “esquecida” de Maurício de Sousa, nascida no Jornal da Tarde em 1966, que durou até finais da década de 70 e que tem tanto de surpreendente quanto de inesperado pelo humor negro e o politicamente incorrecto que perpassam por boa parte destas tiras.
Porque se nalgumas delas facilmente vemos o Cebolinha ou o Cascão no lugar do protagonista de sorriso maldoso e cabelo a lembrar os chifres do Demo (!), se a linguagem e os elementos específicos da banda desenhada, continuam a servir como mote para alguns gags e se a maior parte das piadas tem como base situações do quotidiano, como é habitual em Maurício, na maior parte das tiras podemos descobrir um autor com um humor bem diferente daquele que associamos à Turma da Mônica ou às suas outras criações. Um autor capaz de brincar de forma provocatória com temas socialmente delicados como a pobreza ou a morte, ou não seja Nico Demo egoísta e egocêntrico, capaz de furar as bolhas provocadas por alguém que se afoga em vez de o ajudar ou de beber a água que lhe trazem para apagar um incêndio e que ignora valores como a solidariedade, a entreajuda ou o companheirismo.
Aliás, também graficamente Nico Demo é diferente, com o traço arredondado de Maurício aqui tornado mais “agreste” por um efeito de “serrilha” nos contornos, o que reforça o (mau) carácter do protagonista.
Nico Demo foi criado como tira diária muda em jornais brasileiros, provocando ao longo do tempo de publicação inúmeros protestos e pedidos de suavização do humor até ao ponto do autor desistir dele, considerando que o seu Dem(óni)o tinha surgido antes do tempo. O que se lamenta.
A boa notícia é que a Panini Comics tem em preparação no Brasil a reedição integral das (mais de 2500) tiras de Nico Demo.

As Leituras dos Heróis – O Menino Triste


(segundo João Mascarenhas*)

Pergunta: Se lesse banda desenhada quais seriam as preferidas de O Menino Triste?

Resposta – Ele lê muita coisa. Praticamente um pouco de todos os estilos. Mas os seus preferidos são efectivamente o Jirô Taniguchi e o James Kochalka. Deste último tem uma preferência pelo seu "Magic Boy".


(* a quem agradeço a bela ilustração original que encabeça este post)
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