Acelerar outra vez nas ruínas de Tóquio
Escrevi pela primeira vez sobre Akira já lá vão 35 anos. Na altura, era um caso muito especial por ser um dos primeiros mangas - BD japonesa como hoje quase todos sabem e então muitos ignoravam - a ser publicado no ocidente.
Agora, mais de três décadas depois, impõe-se - continua a impor-se - pela sua qualidade intrínseca e é isso que justifica a nova edição portuguesa da Distrito Manga, acabada de chegar às livrarias nacionais. E isso acontece na chamada 'edição definitiva', de formato generoso, com o sentido de leitura original da direita para a esquerda e a preto e branco como Katsuhiro Otomo o concebeu, em pranchas realistas, ultra-violentas, plenas de dinamismo e acção, acentuados pelo uso de linhas de movimento, um traço ágil e cativante e uma intriga densa e irresistível.
A esta nova (re)leitura, depois da iniciação na edição espanhola da Dragon Glénat e de novo mergulho na edição portuguesa da Meribérica-Líber surgida na mudança de século, naturalmente faltou o factor descoberta de então e a componente de antecipação científica, uma vez que a narrativa decorre em 2019, nas vésperas de uns Jogos Olímpicos, após uma guerra nuclear iniciada em 1982 com o lançamento de um novo tipo de bomba em território nipónico.
Por todo este peso, foi com algum receio que voltei a Kaneda, Tetsuo e aos seus companheiros, nas loucas corridas noturnas de mota pelas estradas abandonadas e semi-destruídas de Neo Tóquio, numa história consistente, desenvolvida em crescendo, em que investigação genética secreta, poderes paranormais, conspirações políticas e um exército com demasiados poderes e ambições convivem lado a lado com a sede de liberdade dos mais jovens, o confronto entre os seus gangues pelo domínio das ruas e dos pequenos contrabandos ilegais e a atracção/repulsão entre Kaneda e Kei.
Se o factor descoberta se perdeu, saiu reforçada a nostalgia e poder ler de uma só vez quase 400 páginas, ao contrário das parcas 64 que contava a edição espanhola em que descobri Akira, dá uma outra dimensão a experiência de leitura intensa e vibrante que, literalmente, nos arrasta pelas corridas noturnas, a fuga à autoridade, o mistério das personagens precocemente envelhecidas e com poderes paranormais e o suspense de um relato que não permite uma única paragem para reflectir ou retomar o fôlego, enquanto ressoa continuamente a pergunta: afinal quem ou o que é Akira?
Akira
- Livro 1
Katsuhiro
Otomo
Distrito
Manga
Portugal, Junho de 2025
178
x 256 mm, 362 p., pb e cor, capa mole
28,85
€
(versão revista do texto publicado na edição online do Jornal de Notícias a 20 de Junho de2025 e na edição em papel do dia seguinte; imagens disponibilizadas pela Distrito Manga; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão; clicar nos textos a cor diferente para saber mais sobre os temas destacados)
Qual é a diferença entre esta edição, e estou a falar só do 1º volume, e a edição da JBC Portugal, de 2019, premiada no Amadora BD? O formato é exatamente o mesmo.
ResponderEliminarTanto quanto se consegue avaliar as edições são idênticas. O que falta saber é se há um verdadeiro compromisso por parte da editora em colocar todos os volumes no mercado e em que prazo. E isso, infelizmente, não foi divulgado.
EliminarHá vídeos no YouTube que comparam as duas edições
EliminarJá li o "Akira" há muitos anos (na edição americana da "Dark Horse") e admito que gostava muito de ter a colecção completa. Mas não vou arriscar gastar dinheiro em um ou dois volumes, sem saber se há compromisso em publicar a coleção toda.
ResponderEliminarÉ chato porque depois há o risco do efeito da "pescadinha de rabo na boca": o cliente não compra porque não publicam tudo; o editor não publica tudo porque o cliente não compra.
Veremos... se a Ditrito Manga arriscar, então terão o meu dinheiro.
Antonio e Ronan,
EliminarA dimensão da editora à partida será garantia suficiente mas, como é óbvio, se os leitores não comprarem, o plano editorial pode ser revisto...
No final, a principal questão é sempre a mesma: se as vendas não correspondem às expectativas - aos valores necessários para garantir o investimento - as editoras terão de repensar a aposta.
Boas leituras!
A editora já disse que apesar das vendas que não vão cancelar a publicação. Até deu o exemplo que a serie Eden Zero que estão a publicar é de todas as series a que esta a vender menos mas que mesmo assim vão publicar até ao fim. As editoras de manga não se podem dar muito a esse luxo por senão ficam queimadas no Japão e depois não vão conseguir licenciar outras obras.
ResponderEliminarEssa é então uma boa notícia para os leitores portugueses.
EliminarBoas leituras!
Viva "anónimo" (não sei porque é que as pessoas não se identificam...) julgo que o que indica, a confirmar-se, não deixa de ser positivo. Porém, continua a falta uma posição "oficial" da editora de compromisso, ou seja, uma calendarização da série que indique aos leitores uma efectiva intenção de lançar e fechar a série em prazo razoável (não de 3, 4 ou 5 anos...). Como disse, a editora e leitores, todos ficariam a ganhar.
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