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15/02/2012

Principe Valiente – La Reina y el Escudero








1949-1950
Harold R. Foster (argumento e desenho)
Manuel Caldas e Pedro Caldas (restauro)
Rafael Marin (tradução e posfácio)
La Imprenta (Uruguai, Setembro de 2011)
260 x 340 mm, 112 p., pb, brochado
680 pesos uruguaios / 25,00 €





1.       Acredito que pertenço à mais afortunada geração de leitores de histórias aos quadradinhos de sempre.
2.       É verdade que alguns poderão afirmar que preferiam ter vivido no início dó século passado para assistirem in loco aos primeiros passos da BD norte-americana nos jornais, nos anos 1930/1940 como contemporâneos da sua idade de ouro, ter acompanhado a explosão dos super-heróis ou o movimento undeground na década de 1960, ou, do outro lado do oceano, ter vivenciado o nascimento de Tintin, o boom da BD europeia pós-Segunda Guerra Mundial, a sua libertação temática pós-Maio de 1968…
3.       Mas a verdade é que – se todos estes e outros períodos foram estimulantes – nos dias de hoje, como nunca, conseguimos compreender a importância de cada um deles….
4.       ... e temos acesso a muitos dos grandes momentos dos quadradinhos das épocas citadas, em edições cuidadas e comentadas que são uma autêntica perdição para quem lê histórias aos quadradinhos.
5.       Para além disso - como todos os contemporâneos daquelas épocas – podemos acompanhar o muito e bom que é criado nos nossos dias.
6.       Dirão alguns que, daqui para a frente isso acontecerá sempre, mas permitam-me duvidar.
7.       Não só pelos avanços tecnológicos que poderão conduzir a BD para outros caminhos e outros suportes, pondo fim – a curto? médio? prazo - às edições em papel, pesadas na mão, em que se sente o cheiro da tinta, a textura do papel, que eu tanto prezo…
8.       … mas também pela questão geracional, pois hoje em dia reedita-se – em boa parte acredito eu – para aqueles que em crianças e jovens leram os quadradinhos hoje clássicos e que conheceram esses períodos tão estimulantes…
9.       … e não me parece que próximas gerações venham a ter esses mesmos interesses.
10.   Dito isto, em jeito de introdução (bem longa), permitam-me passar ao livro que hoje destaco, no terceiro e último dos três textos que As Leituras do Pedro dedicam aos 75 anos do Príncipe Valente.
11.   La Reina y el Escudero, é mais uma dessas reedições (quase) perfeitas de um clássico incontornável da BD, ou não fosse o seu responsável Manuel Caldas, cujo trabalho nunca é de mais salientar.
12.   Suspensa a edição portuguesa pelas (tristes razões) já conhecidas, perdidos os direitos para Espanha por força da força de uma editora “grande”, esta edição para o Uruguai (!) surge como bem-vindo oásis para os que admiram o trabalho de restauro, minucioso e perfeccionista que Caldas desenvolveu na (re)descoberta do traço original a preto e branco de Foster.
13.   Para não repetir o que já escrevi várias vezes sobre a obra, o autor e o trabalho de Caldas, referirei a variedade temática das várias histórias incluídas neste tomo,
14.   que “abarca o período das últimas pranchas publicadas em "O Mosquito" e das primeiras saídas no "Mundo de Aventuras", incluindo as pranchas que na época não se publicaram enquanto uma revista não retomou a série abandonada pela outra”, esclarece Manuel Caldas,
15.   o alto nível gráfico e narrativo que Foster mais uma vez demonstra,
16.   com especial destaque para o seu elevado sentido de humor e a cada vez maior humanização dos participantes.
17.   E também a harmonia com que a narrativa aventurosa combina com a temática familiar, a intriga palaciana e as questões sociais e políticas.
18.   E ainda, o protagonismo que ocupam nestas páginas a (rainha) Aleta e o (escudeiro) Arf, daí o sub-título do livro
19.   cujo desenho se mantém soberbo, preciso, expressivo e minucioso.
20.   Por isso, mesmo em tempos de crise, esta é sem dúvida uma daquelas obras incontornáveis, que pode – que deve! – ser encomendada. Aqui.



14/02/2012

Manuel Caldas

“Foster deveria ter posto fim ao Príncipe Valente”








De há uns anos a esta parte, falar do Príncipe Valente, implica falar de Manuel Caldas, português da Póvoa de Varzim e profundo conhecedor da obra de Foster, a quem dedicou a monografia Foster & Val.
Ao seu trabalho de artesão apaixonado deve-se a melhor edição a preto e branco alguma vez feita da obra de Foster, criada a partir das páginas dos jornais e das provas originais ainda existentes, o que implicou muitas horas de trabalho em cada prancha, eliminando a cor e restaurando o traço original, que o leitor actual redescobre em toda a sua limpidez e esplendor. Com seis volumes de grande formato publicados em Portugal e Espanha, com os primeiros 12 anos da saga (1937-1948), actualmente prepara para um editor do Uruguai o segundo dos três livros correspondentes a 1949-1954.
Por isso, o assinalar dos 75 anos do Príncipe Valente não ficaria completo sem uma conversa com ele.

As Leituras do Pedro - 75 anos depois, ainda se justifica ler o Príncipe Valente?
Manuel Caldas - “Prince Valiant” é o clássico dos clássicos da banda desenhada americana dos jornais. É obrigatório lê-lo. Se se entra na sua leitura por obrigação (a reverência que se deve ter para com os clássicos), logo se descobre o prazer.

ALP - Qual o seu melhor período? Porquê?
MC - Todo o período fosteriano (até 1971) é um monumento da BD. E entre o que Hal Foster fez, o melhor do melhor são os primeiros 7 anos. O melhor do melhor apenas, pois Foster foi sempre muito bom no que fez. Eu descobri a série aos meus 11 anos, precisamente nos últimos tempos do autor, e mesmo assim a paixão foi instantânea e avassaladora.

ALP - E qual a melhor prancha do Príncipe Valente?
MC - Certamente que por maioria de votos ganha a da batalha sobre a ponte de Dundorn (em cima), que toda a gente conhece e é assombrosa. Mas eu tenho uma preferência muito especial pela 681 (em baixo), que fala da grandeza do mar, da grandiosidade e da graciosidade dos seus habitantes, dos fenómenos da natureza, da família, da infância, do regresso à pátria e ao conforto do lar.

ALP - O que pensas do Príncipe Valente do John Cullen Murphy e do Gary Gianni?
MC - Nunca me preocupei com seguir o que fizeram e fazem os sucessores de Hal Foster, mas conheço uma grande parte. O suficiente para poder dizer que (pelo menos comparativamente – e a comparação é inevitável) o que fizeram, e vão fazendo, é mauzinho e cada vez pior. “Prince Valiant” nunca devia ter passado para as mãos deles. Nem de nenhum outro autor. Foster deveria ter-lhe posto um fim, como, de resto, chegara a planear anos antes.

ALP - Durante quantos anos “O Primeiro de Janeiro” publicou o Príncipe Valente?
MC - Desde 19 de Abril do ano em que nasci (1959) até 30 de Abril de 1995. Portanto, durante 36 anos.

ALP - Qual a tua opinião sobre essa edição?
MC - Nos anos 50, 60 e 70 um jornal português publicar BD a cores era um verdadeiro luxo. Hoje, claro, temos de reconhecer que era bastante mal impresso.

ALP - Quantas edições do Príncipe Valente tens?
MC - Tenho parte de muitas, de muitos países. A minha preocupação nunca foi ter colecções completas. Primeiro foi a demanda de todas as páginas realizadas por Hal Foster e depois foi a busca das melhores reproduções de cada uma delas. É que na mesma edição há sempre páginas bem reproduzidas (raramente muito bem) mas também (a maioria) páginas mal ou pessimamente impressas

ALP - Qual a melhor edição a cores do Príncipe Valente?
MC - Actualmente a que a Fantagraphics publica é bastante boa, mas deixa na boca um enorme amargo: podia facilmente ser quase perfeita, mas desperdiçou a oportunidade ao reproduzir deficientemente o fabuloso material de base que usa.

ALP - E a preto e branco?
MC - A preto e branco têm uma qualidade como antes nunca se alcançara os seis volumes com os primeiros 12 anos da série (1937-1948), publicados em Portugal entre 2005  e 2007 e em Espanha entre 2006 e 2008. A estes deve acrescentar-se um sétimo volume (1949-1950) publicado há poucos meses no Uruguai.

ALP - Tens algum feedback sobre essa edição uruguaia?
MC - Sim, pois estou sempre em contacto com o editor, Rafael Maria Carrocio, que me deu inteira liberdade para fazer a edição como eu entendesse. A qual, na prática, é a continuação da edição que comecei a fazer para Espanha.

ALP - Quando sai o próximo volume?
MC - O contrato assinado e pago diz que este ano têm de sair dois volumes. Infelizmente, às vezes não é humanamente possível cumprir os contratos…

ALP - Vai ficar só pelos três previstos?
MC - Não pode! Para publicar a preto e branco todo o Príncipe Valente fosteriano como Deus manda (e não com a má qualidade com que está a ser publicado em Portugal desde que eu não tenho interferência na edição) faltarão ainda 8 volumes, e mais 5 em tamanho menor, com o período de Foster e Murphy.

ALP - Existem muitos originais do Príncipe Valente do Foster?
MC - Nas mãos de coleccionadores existem bastantes, e na biblioteca americana à qual Foster deixou o seu espólio estão, se a memória do que li não me falha, umas três centenas.

ALP - Quanto podem valer?
MC - Não tanto como os do “Tintin”, mas, a um negociante do ramo, com um pouco de sorte, pode-se comprar um por pouco mais de 5 000 dólares. Nos últimos anos, o original mais caro vendido pela casa leiloeira Heritage ultrapassou os 33 000 dólares. Trata-se da página 1123.

ALP - Tens algum?
MC - Pode ser que venha a ter quando, na minha velhice, tiver liquidado ao banco o empréstimo da casa. Tentei há um ano e tal comprar uma vinheta (também se vendem vinhetas  soltas, pois Foster recortou muitos dos seus originais para oferecer partes deles aos admiradores), mas desisti quando ultrapassou os 150 dólares. Era uma vinheta com um sentido muito especial para mim: a única em que a palavra Portugal aparece, quando o barco em que viaja Valente faz escala no nosso país.


06/01/2012

Cisco Kid - "Lucy, Flor Roja y Belle"








Rod Reed (argumento)
José Luís Salinas (desenho)
Colecção Cómics de Prensa
Libros de Papel (Espanha, Dezembro de 2011)
280 x 235 mm, 88 p., pb, brochado
16,50 €


1.       Descobri Cisco Kid na minha adolescência, nuns velhinhos fascículos encadernados da Colecção Audácia, em casa da minha avó.
2.      Casa que, aliás, foi fértil em proporcionar-me descobertas de revistas dos anos 1930 a 1960, deixadas pela minha mãe e tios e que hoje estão na minha “biblioteca”.
3.      Talvez por isso, apesar de depois o ter (re)encontrado com alguma regularidade no Mundo de Aventuras, para mim, as aventuras de Cisco são a preto, branco e uma cor, no caso o vermelho desmaiado com que o vi pela primeira vez.
4.      E foi essa a recordação que me veio de imediato à memória, quando olhei para a capa desta nova incursão de Manuel Caldas pela edição de bandas desenhadas clássicas norte-americanas.
5.      Com a edição, como habitualmente, bem enquadrada por um texto introdutório, conciso mas bastante completo e interessante, da autoria de Manuel Andrés.
6.      Incursão que, como não poderia deixar de ser, foi feita com a minúcia, rigor e competência habituais, o que permite desfrutar das tiras inicias de Cisco Kid como, possivelmente, nunca até hoje tinham sido publicadas.
7.      E, reconheço, é um prazer admirar o traço realista, fino, elegante e dinâmico do argentino José Luís Salinas, nesta edição, em que os pretos – sim, o interior é “apenas” a preto e branco! – têm uma nitidez e um brilho inigualáveis!
8.      E, maior é esse prazer, nas vinhetas e pormenores reproduzidos num formato próximo dos originais de Salinas, sem que o seu traço perca com isso.
9.      Foi com esse (soberbo) extra, que recordei este pouco convencional western, protagonizado por um invulgar cowboy, decidido e bom atirador como todos os heróis, mas igualmente romântico e conquistador, sempre mais preocupado com as – belíssimas – mulheres com que se cruza, do que com os perigos proporcionados por facínoras e peles-vermelhas.
10.  Porque, se a base da trama de cada história – e neste tomo são três – encaixa facilmente nos estereótipos do género, com juízes pouco honestos a criar esquemas duvidosos para se apoderarem de terras, traficantes de armas a tentar provocar guerras entre índios e brancos ou aventureiros em busca de minas de ouro perdidas, elas integram igualmente temáticas bem mais originais.
11.   Por um lado, o tal tom romântico, (por causa dele?) reforçado pelo protagonismo que é dada às personagens femininas – no caso, a Lucy, a Flor Roja e a Belle presentes do título deste volume.
12.   Depois, porque esse protagonismo existe também porque elas são bem mais do que seres frágeis e indefesos a necessitar do abraço protector e acolhedor do herói; Lucy, Flor Roja e Belle são (muito) belas e sensuais, ninguém duvide, mas também activas e inteligentes, interventivas e resolutas, provocando mais a acção do que o próprio Cisco.
13.   Este facto dá um tom de emancipação feminina a este western, temática claramente presente aliás na narrativa inicial - aquela com que Cisco se estreou nos quadradinhos, em tiras diárias, a 15 de Janeiro de 1951, num prolongamento da sua pré-existência como protagonista de um romance de O. Henry e de alguns filmes.
14.  Finalmente, em todas as histórias há também uma nota de humor, que as aligeira, dada por Pancho, mexicano como Cisco, mas em tudo o mais diferente dele: gordo, desajeitado, amante de comida e de dormir e fonte inesgotável de gags.
15.   A talhe de foice ao que atrás ficou escrito, acrescento que o presente volume recolhe, num tamanho apreciável, todas as tiras publicadas pelo King Features Syndicate desde a estreia de Cisco até 13 de Outubro de 1951.
16.   E, esclarecendo quem possa pensar o contrário, não se trata do primeiro volume da reedição integral da obra mais conhecida de J. L. Salinas porque, afirma Manuel Caldas no preâmbulo, não dispõe “de material de reprodução com a qualidade” que os seus critérios editoriais exigem.
17.   O que não tem que ser negativo pois, em alternativa, Caldas propõe-se que - se houver “público para apoiar (ou alguém com ganas de, por puro amor à arte, ajudar)” - este seja o tomo inaugural da colecção Cómics de Prensa, que num futuro que se deseja próximo, incluirá  títulos como Casey Ruggles (já em preparação!), Scorchy Smith, Dickie Dare, Gasoline Alley, Jed Cooper, Drago ou outros.
18.   Por isso, mesmo estando em espanhol, por favor tratem de comprar o livro, que até só chegará às livrarias (do país vizinho…) em Fevereiro, directamente ao editor porque receberão a reprodução de uma tira no formato original em que foi desenhada e, mesmo “só” a preto e branco, esta é mais uma daquelas edições imperdíveis como tantas outras que Caldas (nos) tem proporcionado.

23/09/2011

Manuel Caldas

“Seduzido pela BD”
Chama-se Manuel Caldas, é português, mora na Póvoa de Varzim e dedica-se a reeditar bandas desenhadas clássicas norte-americanas como o Príncipe Valente, Lance, Krazy Kat ou, em breve, Cisco Kid, restauradas com paixão e minúcia.
A paixão pela BD nasceu “antes dos seis anos quando guardava o suplemento “Pim-Pam-Pum” de “O Século”. Ninguém me chamou a atenção para a BD, foi ela que me seduziu”, afirma.
Mais tarde, aos 11 anos o pai mostrou-lhe “o Príncipe Valente, de Harold Foster, publicado no Primeiro de Janeiro, que tinha uns desenhos muito bem feitos”. “Fulminado”, com o tempo constatou “que a história era também magistral e que havia na série uma unidade sublime” pelo que não descansou enquanto não a conheceu toda.
Nasceria aí a vontade de editar essa saga medieval – analisada no seu estudo “Foster e Val” - sonho que começou a concretizar em 2005, sob o selo “Livros de Papel”, entretanto transformado em “Libri Impressi”. E “quando o “Príncipe Valente” se revelou um êxito de vendas”, fez as contas e verificou “que se fizesse dois volumes por ano ganhava mais do que na escola onde era um simples (e insignificante) auxiliar de acção educativa. Assim, como não cair na tentação de deixar um emprego onde era impossível qualquer realização pessoal para fazer exclusivamente o que mais gostava?”
Aos primeiros volumes do Príncipe Valente, sucederam-se outros títulos: “Ferd’nand”, que os leitores do Comércio do Porto seguiram durante anos, “Hagar, o horrendo”, outro clássico do humor, ou “Lance”, um western humanístico. Mais recentemente, "Os Meninos Kin-Der", “Krazy Kat”, “Dot & Dash”, “O Corvo”, “O Livro do Buraco” ou “Ele foi mau para ela”, uma novela gráfica muda de 1930. Não tanto por opção, mas devido a desentendimentos com a pessoa com quem editava o “Príncipe Valente”. Por isso, a “vida como editor tornou-se mais difícil, pois depressa constatei que nenhuma outra banda desenhada das que me interessam vendia como a de Foster”. No entanto, tem “sobrevivido e apesar de a nível económico ser mais tranquilo voltar para a escola”, onde se encontra com “licença sem vencimento” nunca se arrependeu da opção que assumiu.
A par das edições nacionais, Manuel Caldas tem editado também para o mercado espanhol. O salto foi dado “quando alguns espanhóis viram o “Príncipe Valente” em português e começaram a pedir uma edição na língua deles” Entusiasmado, decidiu avançar e as coisas acabaram por “se tornar mais fáceis quando fui contactado pela principal distribuidora espanhola de livros e revistas de BD”. Agora, afirma, “se calhar, sou o único editor português que faz edições exclusivamente para o mercado espanhol”.
Infelizmente, Espanha, onde “a venda pelo correio, através do seu site, assume proporções significativas, ao contrário de Portugal”, “não é um mercado tão grande como se pensa”, mas tem contribuído para garantir a viabilidade económica das suas edições.
Edições cuja qualidade e fidelidade aos originais tem sido amplamente elogiada, pelo que não surpreende que, só este ano, tenha colaborado com a editora norte-americana Classic Comics Press na preparação do primeiro volume das tiras diárias de “Cisco Kid” - que vai lançar em breve em edição própria no mercado espanhol –, vendido a sua versão restaurada de “Lance“ a “editores da Alemanha e da Noruega, estando já nas livrarias a edição alemã”, estando de pé a hipótese de a vender para os Estados Unidos, e esteja a preparar três volumes do Príncipe Valente encomendados por um editor do Uruguai!
O que distingue as edições de Manuel Caldas de outras similares, é a paixão, a paciência, o trabalho artesanal, as muitas horas gastas no restauro de cada página – 20 ou 30 horas, nalguns casos - , na obsessão de “devolver às imagens a pureza original, de melhorar tudo o que sou capaz de melhorar, mesmo pormenores que só se verão com lupa”. Mas, garante, “já decidi que depois de concluir o restauro do “Lance” não mais voltarei a fazer restauros tão profundos. Mas também por vezes me interrogo se conseguirei cumprir tal decisão…”
Para conseguir os seus objectivos, na impossibilidade de utilizar pranchas originais, geralmente inexistentes, recorre às páginas de jornais da época, “umas compradas pela internet, outras emprestadas por coleccionadores estrangeiros, outras obtidas digitalizadas”.
Depois, trabalha obsessivamente, limpa os defeitos de impressão, remove as cores se a edição for a preto e branco ou restaura-as quando são coloridas, utiliza o melhor de cada vinheta – chegando a utilizar quatro fontes diferentes para atingir o "traço ideal", aquele “que se vê, com precisão e sem quebras” ou seja, mostrar cada desenho tal como o autor o fez.
Com a pena de se ver obrigado “a pensar mais (ou exclusivamente) no mercado espanhol”, revela que por cumprir, tem ainda “muitos sonhos, até porque outros vão nascendo”. E sabendo que morrerá “sem os realizar todos”, não se queixa pois sente que vai passar “o resto dos dias a realizar alguns”.















(Versão revista e aumentada do texto publicado no Jornal de Notícias de 13 de Setembro de 2011)

05/08/2011

Outras Leituras (V)

Manuel Caldas regressa ao Príncipe Valente… e ataca Cisco Kid
Leonidas II no Blogue de los 300

Turma da Mônica Jovem vai envelhecer
E. Rodrigues no Planeta Gibi Blog

Marvel Comics ganha processo contra herdeiros de Jack Kirby
Sérgio Codespoti no UniversoHQ

Sobre Jack Kirby e a sentença que deu razão à Marvel
Álvaro Pons em La Carcel del Papel

Originais de Artur Correia no CNBDI
As fotos de João Miguel Lameiras em Por um Punhado de Imagens

20/04/2011

Manuel Caldas

Começou no Invicta Indie Arts, por iniciativa de Manuel Santo, e está a correr por vários blogs portu-ueses ligados aos quadradinhos, uma homenagem ao editor (restaurador e amante de boas bandas desenhadas) Manuel Caldas, a propósito dos 25 anos do seu fanzine Nemo.
Convidado em cima da hora, numa fase de total falta de tempo, apenas pude disponibilizar excertos de alguns dos vários textos sobre as suas edições que já publiquei aqui no blog, edições essas que agora relembro e que recomendo vivamente e sem reservas.
Foster e Val
Príncipe Valente
Surge… Ferd’nand
Krazy + Ignatz + Pupp
Tarzan dos Macacos
Ferd’nand retorna
O Corvo
Hägar
Os Meninos Kin-Der
Dot & Dash
O Livro do Buraco
Lance
Chamando de novo a atenção para estes livros, quero relembrar que a melhor forma de homenagear Manuel Caldas – e quantas homenagens ele merece, sem dúvida! – é comprar (de preferência, pedindo-lhas directamente), ler e divulgar as obras que ele tem editado. A única forma de ele poder continuar com o seu trabalho de editor.
E de nós podermos desfrutar delas, enquanto leitores.

08/11/2010

Dot & Dash













Cliff Sterrett
(argumento e desenho)
Libri Impressi

(Portugal, Outubro de 2010)
300 x 213 mm, 64 p., cor, brochado

Resumo
Dot & Dash (literalmente ponto e traço, a letra ‘a’ no Código Morse) foram publicados originalmente entre 1926 e 1928 para os jornais americanos, como topo da mais famosa criação de Sterrett, “Polly and Her Pals”, na qual fizeram algumas breves aparições. Primeiro como uma tira, depois como tira dupla com vinheta inicial de título.
Esta é uma edição integral da série, completamente restaurada com a habitual competência e paixão por Manuel Caldas, o que possibilita descobri-la no esplendor do seu deslumbrante colorido original.
A edição, trilingue (português, inglês e espanhol, no que diz respeito à introdução, já que a banda desenhada é muda) abre com uma completa apresentação da série por Domingos Isabelinho.

Desenvolvimento
Coisas simples.
Eis o que eu poderia ter escrito no resumo acima: coisas simples.
A isso (a essa coisa tão complicada...) se resume Dot & Dash: à observação, quase sempre simples, quase sempre surpresa, quase sempre descoberta, dos pequenos nadas do dia-a-dia, aqueles pelos quais todos passamos mas dos quais raramente nos apercebemos. Uma poça gelada, um pássaro a cantar, um esquilo a saltar, a sombra que nos acompanha, as pegadas que deixamos impressas no solo, os pingos de chuva, um gato, um cão, um coelho, uma rã ou um caracol.
Dot & Dash são peritos em vê-los, pasmam de surpresa, surpreendem-se com facilidade, assustam-se com mais facilidade ainda, fingem coragem quando o medo facilmente os domina, fogem quase sempre, aborrecem-se, adormecem mesmo, às vezes. Mais ricos, porque viram, tocaram, sentiram, cheiraram, olharam, desco-briram (mesmo que muitas vezes o que viram-tocaram-sentiram-cheiraram-olharam-descobriram não corresponda à realidade “real” mas apenas à que eles “realizaram”).
Se Sterrett se revela perito em mostrar-nos o que Dot & Dash vêem, salientando o pormenor, descobrindo-nos o banal, deslumbrando-nos com a cor, divertindo de forma ingénua e simpática, a par disso, aqui e ali, diverte-se também a alienar a tal realidade “real”, transformando sombras ou valetas em buracos ou poças de tinta, enganando o leitor e também as suas personagens, aumentando nesses casos o efeito cómico.
Personagens que são duas – o nome evidencia-o – dois cães – eram um cão e um gato nos primeiros meses da tira – pequenos e curiosos, irrequietos e que gostam de andar, conhecer, mexer e descobrir.
E que a nós, meros leitores, agarrados a cadeiras, mesas de trabalho, sofás televisivos, importa também descobrir, talvez para abrir a porta – nem que seja só uma fresta – a um outro eu, mais curioso, menos conformista, mais disposto a ver, tocar, sentir, cheirar, olhar, descobrir…

A reter
- A simpli-cidade aparente e desar-mante, mas (também por isso) genial da estrutura narrativa da série.
- A cor, deslumbrante.
- O ritmo, a um tempo contemplativo e dinâmico.
- A edição em si, claro está. Não podia ser de outra forma com Manuel Caldas como responsável…
- Se encomendar o livro directamente ao editor (Manuel Caldas), recebê-lo-á antes de ele chegar às livrarias e com ele receberá um poster de tiragem limitada reproduzindo uma enorme página de jornal de 1928 com “Dot & Dash” e “Polly and Her Pals”. Para além disso isso permitirá que o editor recupere mais depressa (e sem perder a margem que normalmente entrega à distribuidora) o dinheiro investido na edição, contribuindo para que novo livro (quem sabe se o também genial “Polly and Her Pals”) seja editado mais rapidamente!

05/10/2010

Os Meninos Kin-Der

Lyonel Feininger (argumento e desenho)
Libri Impressi (Portugal, Maio de 2010)
330 x 440 mm, 40 p., cor, brochada


Resumo
Os meninos Kin-Der (o letrado Daniel Webster, o comilão insaciável Bocadetorta e o forte Teddy Enérgico), na companhia do seu bassset Sherlock Bones e do autómato Japansky, partem em viagem a bordo de uma banheira (sic). No seu encalço, utilizando um aeróstato, seguem a Tia Jim-Jam e o Primo Gussie, com o objectivo de lhes darem a dose diária de óleo de rícino.

Desenvolvimento
Num mundo ideal não seria preciso dizer que esta é uma obra datada de 1906 - não, não é gralha” – e que o seu autor, Lyonel Feininger, é um célebre artista ligado ao Cubismo e à Bauhaus, de que alguns elementos já podem ser encontrados nesta sua curta (muito curta, para quem gosta de BD…) incursão pelas histórias aos quadradinhos. Todos o saberiam.
Num mundo ideal, não seria necessário falar da história simples e ingénua, ao ritmo de um episódio por pranchas semanal, nem dos episódios de uma simplicidade desarmante, embora com um interessante e conseguido sentido de humor e um ritmo narrativo muito assinalável. Todos os conheceriam.
Num mundo ideal, faria parte do senso comum que o deslumbramento provocado por “Os meninos Kin-Der” se deve essencialmente à sua componente gráfica. Por isso, seria desnecessário referir que cada prancha, embora encaixada na necessária sequência narrativa, funciona como um todo. Ou que a sua planificação varia de semana para semana, entre pranchas de imensa vinheta única aquelas multi-divididas, com vinhetas horizontais e/ou verticais.
Num mundo ideal, seriam por todos reconhecidas pranchas mais experimentais, como a da página 27 em que a acção decorre a dois tempos, no telhado da casa e no seu interior, funcionando a janela do edifício como uma segunda (mini-) prancha integrada no conjunto maior das vinhetas típicas, com formas regulares (quadrados, rectângulos). Ou a divisão da terceira tira (e da respectiva acção) da página 32 em duas vinhetas para prolongar o tempo em que decorre.
Num mundo ideal, o experimen-talismo, a liberdade gráfica, o sentido de composição da prancha de Feininger seriam atributos desta banda desenhada que alimentariam as conversas de todos.

A reter (tanto neste mundo como no ideal)
- A originalidade e modernidade da obra que hoje, mais de um século após a sua criação, se lê com o mesmo prazer e sentimento de descoberta.
- A magnífica restauração dos originais levada a cabo por Manuel Caldas.
- O imponente tamanho da edição e a gramagem do seu papel.
- A excelente e completa introdução de Rubén Varillas que dificultou sobremaneira a escrita deste texto.
- A reprodução de uma prancha em tamanho original incluída na edição para quem a encomendar directamente ao editor, o que aconselho vivamente.

Menos conseguido
- Num mundo ideal, este texto já teria sido escrita e publicada aqui há mais tempo. As minhas desculpas, ao Manuel Caldas e aos leitores de As Leituras do Pedro, em especial àqueles que só após a lerem vão comprar o livro.
- Num mundo ideal, Lyonel Feininger não teria alimentado esta série durante uns poucos meses apenas, mas teria feito dela – e de outras que se lhe seguiriam – o trabalho de toda a sua vida. - Num mundo ideal, a edição incluiria também o integral de Wee Willie Winkie’s World, outra série de Feininger, e teria uma bela capa cartonada em vez de ser uma edição agrafada.
- Num mundo ideal, os jornais norte-americanos (e os dos outros países também…) teriam continuado a publicar bandas desenhadas estimulantes e graficamente arrojadas como esta, neste mesmo imenso formato.
- Num mundo ideal, uma edição como esta não seria uma excepção mas sim a regra nas livrarias portuguesas.
- Num mundo ideal, os exemplares desta edição não seriam apenas umas poucas centenas; ela seria um autêntico “best-seller”. Como não estamos num mundo ideal, longe disso, mas num país chamado Portugal, a única hipótese que temos de nos aproximarmos daquele é comprar e desfrutar desta soberba edição. Futuras edições ideais, como esta, também dependerão disso.
- Num mundo ideal, haveria muitas edições como esta e, por isso, também estantes à sua medida. No nosso mundo real, este é um livro bem difícil de arrumar!

Curiosidade
- Apesar dos seus 33 x 44 cm, maior do que o A3 (!), esta edição reproduz as pranchas apenas a 68 % do seu tamanho original.
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