#15 - Não te ponhas com essa cara
Jerry Scott (argumento)
Jim Borgman (desenho)
Gradiva (Portugal, Junho de 2011)
210 x 220 mmm, 128 p., pb e cor, capa brochada
14,50 €
As recolhas de tiras diárias de imprensa – criadas e pensadas para serem lidas isoladamente, ao ritmo de uma por dia – acabam muitas vezes por se revelar algo repetitivas e mesmo maçadoras, pela duplicação de situações e gags.
Quando tal não acontece, é geralmente sinónimo de qualidade e originalidade. Zits, é um desses (poucos) casos.
Várias razões contribuem para isso, apesar da galeria de personagens que lhe serve de base ser algo limitada: Jeremy, o adolescente que a protagoniza, os seus pais, o círculo de amigos mais próximo da escola – Hector, Pierce, Sara, poucos mais… No entanto, estão todos bem definidos e caracterizados e os seus comportamentos e reacções, aos poucos, pela sua repetição, pela forma como reagem nesta ou naquela situação, vão-se tornando familiares e previsíveis… O que não impede que cada um deles seja capaz de nos fazer (sor)rir em cada gag em que participa. Quer porque são previsíveis, quer porque – bem humanamente… - são capazes de nos surpreender.
Outro aspecto que distingue Zits de outras séries de temática similar – o quotidiano familiar e escolar de um adolescente – é a riqueza gráfica da série, que vai muito mais além do que é normal no género, pois o traço de Borgman é pormenorizado, muito expressivo, funciona tão bem a preto e branco (diariamente) como a cores (nas pranchas dominicais) e, acima de tudo, revela-se excelente quando assume metáforas visuais, como nas tiras que abrem este álbum, transformando a tentativa da mãe acordar Jeremy num desfile duma banda, num passeio de elefante ou num balão de texto real e palpável. Ou, mais comummente, quando o crescimento imparável de Jeremy – de todos os adolescentes – o transformam num gigante que ocupa – extravasa – a própria margem dos quadradinhos em que devia “actuar”. Estes são apenas dois dos múltiplos exemplos que poderia apontar e que são paradigmáticos de casos em que “uma imagem vale mais do que mil palavras”.
Porque Zits, contendo textos, geralmente diálogos, assenta boa parte dos seus momentos mais divertidos nos (múltiplos) silêncios – de espanto, dúvida, surpresa… - que os autores vão espalhando pelas tiras.
Depois, ainda, a diferença que Zits marca assenta na forma a um tempo assustadora – porque hiper-realista – e irresistivelmente divertida – porque caricatural e com um grande sentido de oportunidade – como é retratada a relação entre Jeremy – a geração actual, nascida para clicar, teclar, googlar e outras coisas que tais – e os seus pais – uma geração obsoleta mais ou menos da Idade da Pedra, que desconhece funcionalidades de aparelhos básicos para a sobrevivência como telemóveis, mp3, computadores, preferindo conversar em lugar de utilizá-los… Um relacionamento que (tantas vezes) parece ser apenas um diálogo de surdos ou de seres em diferentes níveis de existência ou em universos paralelos.
Ao longo dos anos que Zits já conta – foi publicada pela primeira vez em Julho de 1997 – Jeremy - indolente, esfomeado, quase mudo, desarrumado, desorganizado, exasperante para os pais… - foi crescendo e desenvolvendo-se e nós, leitores, tivemos o privilégio de o acompanhar – embora na realidade a personagem, graficamente, pouco tenha evoluído e o tempo para ela seja bem lento do que para nós… – nas diversas etapas ligadas aquela fase da vida: saídas com os amigos, namoros, relacionamento com os colegas, empregos de férias, carta de condução…
Momentos diversos mas reconhecíveis do quotidiano de todos nós, que são retratadas com rigor e distanciamento, com realidade e humor, de forma que diverte, dispõe bem, com frequência faz soltar gargalhadas. Pelo menos, enquanto os nossos filhos não se tornarem adolescentes…
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