Uma das grandes dificuldades para quem chega 'tarde' ao universo Marvel - ou DC Comics - é a dificuldade em aceitar a sua especificidade: os super-poderes, as relações entre super-heróis. E - talvez principalmente, embora poucas vezes citado - o facto de apesar de (quase) página sim, página não terem lugar combates épicos de proporções descomunais, eles não terem consequências gravosas para aqueles a que eles assistem ou que, simplesmente, vivem nos locais que lhes servem de cenários.
Edifícios destruídos, viaturas pelo ar,
explosões, rajadas do mais variado tipo, geralmente saldam-se por
alguns (poucos) destroços e algumas equimoses - ou nem isso! - nos
intervenientes.
Marvels: Ruinas reúne
quatro narrativas em tudo distintas mas que assentam (de um ponto de
vista bastante lato) numa mesma base: a presença de super-heróis no
mundo real, tem consequências para este.
Começo pelo
fim, por The
Wonder Years,
protagonizado por uma fã de um super-herói que um dia a salvou. É
uma história de paixão e obsessão, com a jovem a deixar tudo para
seguir - à distância - o objecto da sua fixação, procurando -
tentando forçar até... - um novo encontro. Nada de novo, se
pensarmos bem, basta trocar o super-herói por um qualquer famosos de
qualquer ramo - futebol, cinema, TV, banda desenhada até? - mas a
curiosidade aqui - como nos restantes relatos - é compreender como
se cruza aquela obsessão com o universo Marvel e como os autores
relacionaram a sua ficção com alguns momentos icónicos da história
dos super-heróis fda Casa das Ideias.
Da
mesma série, Tales
of the Marvels,
vem - antes! - The
Inner Demons
centrado em sem-abrigo e (ex-)alcoólicos, numa narrativa mais
dramática e intimista que prova como um ser humano normal e (até)
um super-herói (como Namor) podem estabelecer laços - e superar-se
através dos outros.
Continuando
a recuar no livro, no terceiro relato no âmbito dos Tales
of the Marvels,
em Blockbuster
a
destruição - com vítimas mortais - de um prédio na sequência de
um confronto entre o Surfista Prateado e Tyros, origina uma
improvável e improcedente acção colectiva contra os super-seres e
- em paralelo - numa busca por vingança por parte de alguém que
perdeu os pais no confronto. A redenção no amor ou a destruição
na sede vingadora que o consome são os dois caminhos disponíveis
para o protagonista.
Para
fechar - a abrir o livro! - da melhor forma, surge o tal Ruinas
que lhe dá título, uma visão em negativo - tão que bem apropriado
soa aqui este termo! - do outro Marvels,
o de Kurt Busiek e Alex Ross, que mostrava um fotógrafo, Phil
Sheldon (e os seus concidadãos) maravilhado(s) perante os
super-seres que agora caminhavam na Terra, quase à imagem dos
antigos deuses.
E
se naquele caso, raios cósmicos, radiação gama ou uma aranha
radioactiva tornavam os seres humanos melhores, diferentes,
poderosos, dispostos a ajudar - autênticas maravilhas! - neste
retorcido Ruinas
as
mesmíssimas causas têm efeitos e consequências completamente
contrárias e desastrosas. Ou apenas e tão só os que seriam
expectáveis se acontecessem realmente no nosso mundo. Mas o
fotógrafo Phil Sheldon, persegue-os na mesma com a sua objectiva,
tentando compreender porquê, ansiando descobrir a razão, procurando
compreender o incompreensível duvidando daquilo em que já teve fé,
arrastando-se quase literalmente de destino em destino, em busca de
cada um dos afectados/infectados, ele próprio com a morte às
portas, por razões que só mesmo no final descobriremos, como última
machadada num universo que (já) nos maravilhou e preencheu.
Visão
negativa e derrotista, apresentada de forma crua como só Warren
Ellis sabe fazer e com uma belíssima - e ao mesmo tempo cinzenta e
crua - interpretação gráfica por Cliff e Terese Nielsen a que
pertencem as pranchas aqui ao lado, Ruinas,
se não é um clássico da bibliografia super-heróica da Marvel -
pela visão desagradável e auto-destrutiva que transmite desse
universo - é uma obra que merece ser lida pela sua qualidade
intrínseca e como contraponto do (maravilhoso) Marvels.
Marvel:
Ruinas
Warren
Ellis, Mike Baron, Mariano Nicieza, Dan Abnett, Andy Lanning
(argumento)
Cliff Nielsen, Terese Nielsen, Chris
Moeller, Shawn Martinbrough, Bob Wakelin
e Igor
Kordey
(desenho)
Panini
Comics
Espanha,
14
de Maio
de 2020
170
x 260
mm, 256 p., cor, capa dura
ISBN:
9788413343709
25,00
€
Já li esta obra há uns anos mas as últimas páginas da obra principal estão muito mal desenhadas e destoam dos artistas iniciais, acho que pela mão do Moeller que já fez melhor mas que aqui não se esforçou nada.
ResponderEliminarEste comentário foi removido pelo autor.
EliminarTodos estes conceitos foram colocados Pelo Ellis no título Planetary, claro que com variantes para não ficar demasiado colado aos heróis em que se inspirou, na verdade o plot do Planetary não é um plot, é apenas uma desculpa para distorcer e trabalhar nos personagens lendários da Marvel e dos comics em geral, trazendo para uma abordagem mais terra a terra e realista, como acontece neste Ruins.
EliminarConfesso que fiquei bastante desiludido com o Ruins por a arte não ser mais consistente.
Os trabalhos extra que colocaram neste volume não têm nada a ver, apenas servem para fazer volume, em tom têm mais a ver com o Marvels original ou o Eye of the camera do que com o Ruins que tem um tom mais bizarro e perverso.
Legal
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