Frank Bourgeron
(argumento e desenho, a partir do romance de François Sureau)
Futuropolis (Novembro de 2009)
217 x 296 mm, 80 p., cor, cartonado
Resumo
Em plena Primeira Guerra Mundial, o governo belga solicita ao seu homónimo francês o empréstimo de uma guilhotina e de um carrasco para executar um condenado à morte, Préfaille, preso numa zona ocupada pelos alemães. A razão do pedido ? Há mais de 80 anos que não há execuções na Bélgica, pelo que também não existem profissionais – carrascos – habilitados para o efeito...
A França aceita o pedido e envia Deibler, o executor, com a sua preciosa máquina de matar devidamente desmontada e encaixotada, sob a escolta de um pequeno grupo comandado pelo tenente Verbruge, após conseguir os necessários salvo-condutos da parte dos diversos exércitos envolvidos (francês, belga, alemão, inglês).
Desenvolvimento
Embora soe a anedota de mau gosto, esta adaptação do romance homónimo de François Sureau (Gallimard, 2006), tem por base uma história verídica, que mostra como os governos envolvidos numa guerra fratricida, embora incapazes de chegar a um consenso para promover a paz, conseguem facilmente acordos para ceifarem uma vida a mais (mesmo que isso coloque em risco diversas outros seres humanos).
De qualquer forma, o cerne da história gira em torno da obediência cega que o exército impõe – e que tantos dos seus homens cultivam – de tal forma que Verbruge, que perdeu um braço na guerra, ao receber as suas ordens, nem sequer questiona porque foi condenado à morte Préfaille. E, dias depois não admite sequer questionar se elas se mantêm, quando alterações profundas na frente de batalha o aconselhavam.
O seu grupo, composto por voluntários, é heterogéneo e singular e é pena que não tenham sido aprofundadas as suas diferenças e motivações: Deibler, que só sai de Paris obrigado e que passa os dias a relatar ao pormenor em pequenos cadernos as suas execuções; o seu ajudante, Desfourneaux, que ama a lâmina da guilhotina mais do que a própria vida; o interesseiro Faucon, que não hesita em seduzir e possuir a esposa do carrasco mesmo antes da partida… Um grupo cujos pensamentos – que servem de fio condutor à narrativa - vamos conhecendo, embora por vezes seja complicado compreender quem “pensa” naquele momento, o que retira fluidez à banda desenhada que também é afectada por algum excesso de texto.
Juntos, mas não unânimes, com algumas tensões latentes mas contidas pela necessidade de obedecer, embrenham-se no campo de batalha, sofrem bombardeamentos – de oponentes e aliados - por duas vezes, cruzam as linhas inimigas e acabam por chegar a Fresnes, onde Préfaille, que denota algum atraso mental, aguarda numa cela, acusado de um crime (relativamente) menor e inexplicável e cuja única vontade é pôr rapidamente um fim aquela situação.
Este relato que seria burlesco, se não fosse tão trágico e pesado, é feito por Bourgeron com um traço grosso, não rude como aparenta mas elegante, que no entanto se revela pouco indicado para o tratamento da figura humana, em especial ao nível dos rostos que, por vezes, se torna difícil distinguir. Mas que se torna bem mais interessante quando aplicado de forma depurada aos cenários – urbanos ou não – como nas páginas 37, 38 ou 45, em que é realçado pela ausência de texto.
A utilização exclusiva de tons – escuros - verdes e cinzentos e a opção pela pintura das personagens com uma só cor, acentua o tom sombrio desta história interessante mas cujas limitações apontadas não deixam entusiasmar, sobre uma missão absurda criada para satisfazer caprichos de políticos que tomam decisões sentados nos seus gabinetes, longe da realidade.
A reter
- A elegância do traço de Bourgeron.
- O travo amargo que o absurdo da ideia base deixa.
- A forma subtil como o relato expõe temas incómodos, sempre recorrentes, como a obediência cega, a pena de morte ou o patriotismo.
Menos conseguido
- A dificuldade de distinguir as personagens e os seus pensamentos.
- A forma como isso obriga a parar e a voltar atrás na leitura, comprometendo a fluidez da leitura.