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26/03/2012

Les Amis de Pancho Villa




 



Colecção Rivages/Casterman/Noir
Léonard Chemineau (argumento e desenho)
James Carlos Blake (romance original)
Casterman (França, 14 de Março de 2012)
185 x 260 mm, 128 p., cor, brochado com badanas
18,00 €



Resumo
México 1910. Em plena guerra civil, este romance desenhado acompanha o percurso de Pancho Villa e dos seus amigos, divididos entre os ideais da revolução e uma vida animada por tiros, mulheres e pilhagens.

Desenvolvimento
Esta é a primeira banda desenhada de fôlego escrita e desenhada por Léonard Chemineau. E o mínimo que se pode dizer é que se trata de uma bela estreia.
Nascido em 1982, engenheiro de formação, Chémineau foi descoberto no concurso de Jovens Talentos de 2009 do Festival de Angoulême e nesta obra de estreia justifica bem a aposta nele feita.
O traço, um pouco sujo, entre o semi-realista e o caricatural, revela-se surpreendentemente maduro e cativante e demonstra da parte do autor um grande à-vontade no tratamento da figura humana e de todo o tipo de cenas necessárias para a história que escolheu contar, assentando numa planificação de matriz tradicional mas dinâmica graças à sua agilidade intrínseca e ao uso variado de pontos de vista. Para isso contribui também o agradável colorido das pranchas, em que predominam os tons lisos e fortes que ajudam a compor a quente e opressiva atmosfera mexicana.
O ponto de partida para esta incursão na conturbada revolução mexicana que abalou aquele país (e o vizinho Estados Unidos) no início do século XX, é o romance homónimo do mexicano James Carlos Blake que, mais do que debruçar-se sobre os ideais revolucionários, as questões políticas ou as precárias condições de vida que moviam os mexicanos em busca de um futuro melhor e mais justo – ou só diferente? – opta por acompanhar Pancho Villa e os seus homens-de-mão - com destaque para Rodolfo Fierro (que tinha a certeza que não morreria a mãos humanas…)  - nos seus raides pelas zonas dominadas pelos adversários, em acções violentas que, apesar das aparentes motivações políticas, pareciam ter como único fim o saque, a pilhagem, belas mulheres e muito álcool, ou seja tudo o que é necessário para vidas com adrenalina a rodos, longe de julgamentos morais e à margem de equilíbrios feitos tendo por base os conceitos de bem e de mal.
Surpresas, traições, golpes bem-sucedidos, desilusões, amizade e um grande desapego à vida humana, são também os condimentos de uma história que ganha laivos de credibilidade, pelas referências históricas que vão sendo introduzidas, e de humanidade, pelos sucessivos flashbaks que ajudam a conhecer melhor os protagonistas, o seu passado e as suas motivações.

A reter
- A qualidade gráfica e narrativa desta obra que marca a estreia de Léonard Chemineau, um autor que, acredito, ainda vai dar muito que falar.
- A forma como o autor consegue tornar credíveis e humanos personagens que parecem mais simples heróis de BD.


21/03/2012

L'Orme du Caucase













Colecção écritures
R. Utsumi (argumento)
Jirô Taniguchi (desenho)
Casterman, França, Junho de 2004)
173 x 240 mm, 224 p., pb, brochada com badanas
13,50 €




Pedaços de vidas.
Pedaços de vidas aos pedaços, feitas assim pelos acasos, pelo destino ou pela vontade de quem as viveu ou compartilhou.
Vidas aparentemente desfeitas, destruídas, sem rumo nem fim. Mas tornadas novas vidas, com sentido e objectivos, reconstruídas do (aparente) nada pelo (re)encontro com (outros) seres humanos. Pela (re)descoberta do amor, da amizade, do companheirismo. Pela percepção do que correu mal e, agora, há-de correr melhor. Porque - quando? - as provações fortalecem e preparam para viver. Outra vez.
É disto que nos fala L'Orme du Caucase, uma recolha de contos de R. Utsumi, magistralmente adaptados a banda desenhada pelo traço suave, fino e delicado de Jirô Taniguchi, um dos autores recorrentes nesta coluna, que em cada nova obra surpreende pela sua capacidade de falar de forma simples, mas chamativa e tocante - gentil, definiu alguém - das coisas simples da vida.
Seja o relato do respeito por um olmo imponente ou o da descoberta do amor na 3ª idade. Ou de reencontros após longas separações, entre irmãos ou pais e filhos ou até entre uma sogra e uma nora que quase não se conheceram.
Pela forma admirável como os rostos das suas personagens, extremamente expressivos, nos transmitem os seus sentimentos e emoções, quantas vezes contidos. Ou ainda pelas suas belas pranchas, composições a preto e branco, que os nossos olhos sonham em mil cores, em especial quando a natureza invade as imagens e nos faz ansiar pela fuga aos espaços (só aparentemente humanos, afinal opressivos) das grandes cidades.


(Texto publicado originalmente no Jornal de Notícias de 17 de Julho de 2004)

Curiosidade
- Este é mais um tomo da colecção écritures, já diversas vezes presente aqui As Leituras do Pedro, que este mês completa 10 anos de bons serviços. Conto voltar a ela, repetidamente, nas próximas semanas.

27/02/2012

Castro











Colecção écritures
Reinhard Kleist
Casterman (França, 4 de Janeiro de 2012)
173 x 241 mm, 328 p., pb, brochada com badanas
18,00 €



Resumo
Biografia aos quadradinhos do líder cubano Fidel Castro, desde a juventude até abdicar do poder, mais de quarenta anos depois.

18/01/2012

In the name of…












Will Argunas
Casterman/KSTR (França, 11 de Janeiro de 2012)
192 x 279, 112 p., cor, cartonado
16,00 €


Resumo
2015. Houston, nos Estados Unidos, vive um momento sem precedentes aguardando a chegada do novo papa, Nélson I, um negro de origem africana. Mas rapidamente o ambiente de festa se transforma em pesadelo quando ele tomba, vítima de tiros provenientes da multidão.
O FBI reage prontamente e prende três homens encontrados com armas telescópicas. Para descobrir qual deles é o verdadeiro assassino, é chamado o agente Morgan Jackson, também ele negro.

Desenvolvimento
O que primeiro chama a atenção, neste livro de traço semi-realista, não especialmente chamativo, mas elegante e bastante funcional, é a interessante ligação que o autor consegue estabelecer entre a realidade presente e este futuro (muito próximo) que ele ficciona, pois entre ambos existem suficientes elos de ligação, uns reais, outros inventados mas perfeitamente plausíveis: a eleição de um papa negro na sequência do papado desastroso e repleto de escândalos de Bento XVI, as dificuldades de reeleição de Obama, as referências à crise financeira, a utilização de Larry King, o pivot da CNN, para reportar o que vai acontecendo…
Isto dá ao argumento, globalmente bem trabalhado e desenvolvido, uma credibilidade assinalável que o torna bastante estimulante quando conjugado com a indiscutível força do seu pressuposto base.
Faltou, talvez, explorar/explanar um pouco melhor os problemas de solidão (e que mais…?) da agente especial Leslie Forge, designada para acompanhar Jackson, e, especialmente, os problemas deste último com mulheres e álcool – pois trata-se de um alcoólico em recuperação… - o que justifica a forma como reage à pressão que é colocada sobre ele.
Apesar disso, o leitor é rapidamente agarrado pela história, pois à medida que esta se vai desenrolando e alguns aspectos vão sendo esclarecidos, outros mais ficam na sombra, espicaçando a curiosidade de quem lê. Curiosidade que, no entanto, tem de obedecer à cadência imposta pelo autor que obriga a uma leitura dinâmica mas de ritmo não muito elevado, para que o leitor se aperceba quer dos elementos evidentes, quer daqueles presentes nas entrelinhas ou no desenho…
… isto, até ao golpe de teatro final (ou quase…) que subverte toda a narrativa e deixa desconcertados quer os protagonistas – que aos poucos se apercebiam de que havia demasiados elementos que não encaixavam no quadro global – quer os leitores - que não podem senão ser surpreendidos.
Para Argunas, depois, em jeito de epílogo, proporcionar a explicação final deste conseguido policial aos quadradinhos, mais uma vez perfeitamente coerente com a actualidade e com a história recente (só recente?) da grande multinacional – que tem de ser lucrativa - em que se transformou a Igreja Católica Apostólica Romana…

A reter
- A forma como Argunas guia o leitor.
- O golpe de teatro que resolve (?) o caso.

Menos conseguido
- O aprofundamento do carácter de Forge e Jackson e das razões para as suas atitudes actuais, seria uma mais-valia para o relato.

21/11/2011

Habibi

Colecção écritures
Craig Thompson (argumento e desenho)Casterman (França, 26 de Outubro de 2011)
172 x 240 mm, 672 p, pb, brochado com badanas
24,95 €

Habibi é a história de Dodola, vendida pelos pais ainda criança para desposar um escriba – com quem aprende a ler e a escrever e os contos sagrados que a acompanharão toda a vida -, raptada de casa do marido para ser feita escrava, fugitiva para se esconder no deserto durante anos, capturada e transformada em favorita do sultão.
Habibi é a história de Zam que Dodola resgatou do mercado de escravos, que com ela viveu no deserto, que por ela se tornou eunuco.
Habibi é a história de cada um, quando o destino – ou os homens? – os separou, como (sobre)viveram com a memória do outro.
Habibi é a história do seu reencontro, tão feliz quanto doloroso, tão esperado quanto receado, tão belo quanto pungente, porque Habibi é a história de um grande amor, uma história bela – como todas as histórias de amor – mas também uma história incómoda, profunda e dolorosa – como só as histórias de amor sofridas podem ser.
Mas Habibi é também uma história de busca e iniciação, uma história de uso (e abuso) mercantil do sexo, de sensualidade reprimida, de desejos abafados, de mal-entendidos sobre o que é – o que pode ser – a sexualidade. Uma história de abusos, violações e profanações.
Habibi é ainda uma história de sobrevivência, de resistência, de abdicação e de luta, um conto sobre a pequenez do indivíduo face ao mundo hostil que o rodeia, o traga, o engole, o expele em fezes.
Habibi é também um conto religioso – mais próximo de Deus ou de Alá – do que muitos contos “mesmo” religiosos, um conto sobre falsa religiosidade, assente numa sólida base teológica, proveniente da leitura atenta e exigente do Corão (complementando a da Bíblia que fez parte da educação de Thompson). O que possibilita, aos crentes (verdadeiros), aos conhecedores de um e/ou outro daqueles livros sagrados, desfrutar dos paralelos que o autor vai traçando entre ambos ao longo da sua obra e de um outro nível de leitura que Habibi tem.
Habibi é, igualmente, uma obra coerente e consistente, em que é notória a pesquisa que o autor fez a vários níveis – dentro de si próprio e a nível religioso, já o disse - mas também a nível da escrita (que tem um papel importante ao longo do relato), dos hábitos e das tradições orientais.
Habibi é uma fábula intemporal, universal, uma versão bem mais dura e terrível das 1001 Noites, igualmente situada num sultanato oriental imaginário, num tempo que parece anacrónico, mas que pormenores diversos revelam ser hoje, revelam ser agora, revelam ser aqui, ao nosso lado, em nossa casa…
Em Habibi, Craig Thompson, mais uma vez, como no espantoso Blankets – que era mais directo, mais acessível, menos cerebral – expõe-se, despoja-se, mostra-se, revela-se, evoca por pressupostas personagens as suas experiências traumáticas, os abusos que sofreu, as suas dificuldades de relacionamento, de forma total, sensível, tocante, embaraçosa, pungente.
Habibi é também uma fantástica narrativa em banda desenhada, arte que Thompson domina como poucos, transportando o leitor ao longo das páginas de uma longa história – complexa e profunda – que, apesar disso - por isso - se lê de um só fôlego.
Habibi é também, ainda, igualmente, um notável trabalho de artesão, que ocupou 7 anos da vida do autor, com pranchas de pura contemplação, outras de uma energia louca, algumas de pura emoção outras de acção a rodos, com muitas dezenas de pranchas feitas autênticas obras de arte oriental, numa colagem, numa moldagem do estilo ao ambiente e ao cenário da história.
Habibi é, por tudo isto, uma obra notável. Daquelas que é obrigatório ler, de um só fôlego, escrevi-o atrás, porque não conseguimos parar sem conhecer o fim, enredados sem forma de fugirmos na teia que Thompson vai tecendo, com mestria e competência – com génio, porque não dizê-lo - com conta e medida, avanços e recuos, descobertas e revelações. Daquelas que é obrigatório reler, uma duas, três, dez vezes para descobrir, desvendar, desfrutar de tudo o que Craig Thompson nela colocou para nós.
Habibi, finalmente, é daquelas obras únicas e incontornáveis, “extenuantes e estimulantes” escreveu alguém de forma particularmente feliz, que tornam medíocres tudo o que sobre elas se escreva – o que eu até aqui escrevi - porque ficará sempre muito aquém do que ela é e nos pode proporcionar.

A reter
- Habibi, no seu todo, uma obra notável.










14/11/2011

Sibylline

L’Intégrale – Tome 1: 1965-1969
Raymond Macherot (argumento e desenho)
Casterman (França, 26 de Outubro de 2011)
216x288 mm, 200 p., cor, cartonado
25,00 €

Resumo
Primeiro tomo da reedição integral das aventuras de Sibylline, uma criação do magistral Raymond Macherot (1924-2008), prevista em 5 volumes que compilarão de cerca de 1000 pranchas.
Este livro inicial inclui a primeira parte de um dossier sobre o autor e as bandas desenhadas “Sibylline”, “Sibylline & Cie”, “Sibylline et la betterave”, “Sibylline et l’imposteur”, “Sibylline en danger”, “Un sapin pour Sibylline”, “Sibylline contre-attaque” e “Sibylline et les abeilles”.

Desenvolvimento
Se acerca de muitas das obras e/ou autores que me marca(ra)m consigo com facilidade referir o que me atrai nelas(es), o mesmo não se passa com Raymond Macherot, um dos grandes mestres da banda desenhada franco-belga, cuja mérito, injustamente, poucas vezes é reconhecido.
No entanto, logo que soube da publicação deste primeiro tomo das aventuras de Sibylline, pedi-o de imediato e, quando o recebi, não resisti a puxá-lo rapidamente para o topo da pilha dos livros que tenho para ler.
E, concluída essa leitura, confirmei o grande prazer que Macherot sempre me proporciona. Não sei se isso se deve à pequena estatura das suas personagens – Sibylline e também Chlorophylle são ratos – o que dá uma outra dimensão ao mundo em que (tal como nós) vivem, ao seu humor singelo e terno, ao espírito e à espontaneidade dos diálogos, ao seu sentido do gag, à forma extremamente legível como as suas páginas são construídas ou ao modo ritmado e alegre como conta as pequenas aventuras dos seus pequenos heróis.
Possivelmente é o conjunto de tudo isto que confere à sua obra a magia e uma certa ingenuidade que me encantam e seduzem.
Sibylline, que hoje me ocupa, nasceu a 4 de Março de 1965 nas páginas do número 1403 da revista belga Spirou, para onde Macherot se transferira com armas e bagagens após deixar a também belga Tintin, devido a desacordo com o seu redactor-chefe sobre o futuro de Chlorophylle. Tendo deixado o seu herói original na revista que o vira nascer, o desenhador optou por uma nova criação, cujos pontos de contacto com aquele eram por demais evidentes.
Curiosamente, se o desacordo tinha por base a localização das aventuras – Macherot queria o campo, a revista Tintin a cidade – as aventuras de Sibylline iniciam-se em cenário urbano, rapidamente abandonado para a fazer migrar para o campo.
Em relação a Chlorophylle, se o objectivo era o mesmo, utilizar animais para narrar o que o ser humano lhe inspirava, a principal diferença é o menor protagonismo de Sibylline, uma ratinha corajosa, decidida e pouco modesta.
O que acaba por dar mais espaço aos seus coadjuvantes: Taboum, o noivo distraído e trapalhão, o corvo Flouzemaker, oportunista vendedor de banha-da-cobra e o brigadeiro Verboten, responsável por manter a ordem no bosque. E, claro está, Anathème, o pérfido rato negro, vilão da série, que tem por único objectivo vingar-se de Sibylline e dos seus amigos enquanto serve de contraponto às suas acções. Ou, nas histórias iniciais, o pobre gato de quem Sibylline e os outros ratinhos urbanos fazem gato-sapato. Desta forma, Macherot multiplica os motivos de interesse de cada história, assentes em personagens fortes e de carácter bem definido, baseadas no dia-a-dia rotineiro da vida simples e descontraída num pequeno bosquezinho que provê tudo o que os protagonistas necessitam, enquanto enfrentam a cobiça e a perfídia de Anathème e dos seus correligionários.

A reter
- A magia ingénua de Sibylline, simplesmente irresistível.
- A entrada da Casterman no segmento das reedições de clássicos.
-A qualidade da edição, com um magnífico dossier da autoria de Stéphan Caluwaerts, uma excelente reprodução das pranchas e um bom trabalho de restauração das cores.
- A possibilidade de ler histórias apenas publicadas na revista Spirou e até agora inéditas em álbum.

Menos conseguido
- A maqueta da colecção, que podia ter sido melhor trabalhada.

Curiosidades
- Em 2005, Sibylline foi retomada por Andre Taymans, nas edições Flouzemaker.

Em Portugal
- Sibylline teve vida curta em Portugal. A estreia deu-se no número inaugural da segunda série da revista Spirou, a 10 de Abril de 1979, com a história “Sibylline e a Beterraba”, concluída ao fim de 10 números.
- Seguiu-se, no número 11, onde protagonizava a capa, “Sibylline & Cª” (numa inversão da ordem original da série) que duraria até ao número 20.
- Finalmente, “Sibylline” foi publicada nos números 21 a 25, terminando assim a publicação de Sibylline em edições nacionais.
- Antes disso, a 26 de Março de 1955, o Cavaleiro Andante, no seu número 169, dedicava a capa a “Missão Perigosa” (“Mission Chèvrefeuille”), cujas 4 pranchas publicava, uma história também incluída no presente integral e que é, de certa forma, uma antecipação (um episódio-piloto…) do que viriam a ser Chlorophylle e Sibylline.

15/09/2011

Jean-Paul Mougin (1941-2011)

Comunicado das edições Casterman:“Foi com grande tristeza que soubemos da morte de Jean-Paul Mougin, falecido na passada terça-feira, 13 de Setembro de 2011, em Bruxelas, com a idade de 70 anos.
Jornalista e editor de uma estatura excepcional, Jean-Paul Mougin foi, no final dos anos 70, o mítico fundador da revista (ÀSuivre), lançado pelas Edições Casterman, periódico de que assumiu a direcção continuamente durante 20 anos, escrevendo assim algumas das mais belas páginas da história da banda desenhada europeia. Retirado do mundo da edição há uma dúzia de anos, manteve, no entanto, um olhar atento sobre a criação em banda desenhada.
Formado na televisão, no tempo da ORTF, e expulso do serviço público na sequência do movimento de 68, muito sensível à imagem sob todas as suas formas, Jean-Paul Mougin começou nos quadradinhos na redacção do semanário Pif Gadget, onde aprendeu a reconhecer e a apreciar as grandes assinaturas da época: Jean-Claude Forest, Paul Gillon, Nikita Mandryka, Gotlib...
Teve um papel decisivo no lançamento da carreira francesa daquele que viria a tornar-se seu amigo para sempre, Hugo Pratt. Alguns anos mais tarde, o autor de Corto, cujos álbuns tinham começado a ser publicados pela Casterman, apresentou por sua vez Jean-Paul Mougin ao seu editor. O projecto (À Suivre) iria nascer desse encontro.
Lançada em Janeiro de 1978, no quinto Salão de Angoulême a (À Suivre) de imediato fez sensação no mundo da banda desenhada. A sua identidade editorial, então muito original, imaginada por Jean-Paul Mougin para este novo título – uma banda desenhada exigente adulta a preto e branco, com ambições literárias assumidas, livre das restrições de formato existentes por toda a parte – encontrou de imediato um público entusiasta, bem como uma expressão que ficou célebre, formulada no primeiro editorial da nova revista: “a (À Suivre) será a erupção selvagem da banda desenhada na literatura (...)” Durante duas décadas, Jean-PaulMougin e a sua revista mantiveram com paixão e fervor a promessa do “romance em banda desenhada”, não interditando nenhum género, nenhuma aventura, nenhuma intuição.
O número de autores assim revelados ou consagrados é demasiado grande para que façamos a sua listagem completa - Pratt e Tardi, claro, mas também Schuiten e Peeters, Ted Benoit, Sokal, Manara, Loustal e Paringaux, Comés, Muñoz e Sampayo, Ferrandez, Rochette, Geluck, Boucq, Cabanes, Baru, mais tarde, jovens talentos como Nicolas De Crécy ou Nicolas Dumontheuil, e tantos outros -, mas assemelha-se muito a um repertório dos grandes nomes da banda desenhada contemporânea. Tendo ficado míticos na memória de muitos profissionais, a (À Suivre) e Jean-Paul Mougin foram bem mais do que uma revista de sucesso e o seu talentoso redactor-chefe: eles moldaram, em parte, o que a banda desenhada é hoje.
Jean-Paul Mougin decidiu retirar-se no fim dos anos 90, ao mesmo tempo que terminava a trajectória da sua revista, em 1997. Todos aqueles que o conheceram guardam a lembrança de um ser humano envolvente e caloroso, duma grande generosidade, que prezava mais do que tudo os valores da fidelidade, da cultura e da inteligência.”

Para mim – como para muitos da minha geração – a (À Suivre) foi um marco.
Uma revista – no tempo em que elas existiam e eram fundamentais – cujo trajecto apanhei já a sua vida ia longa, mas ainda a tempo de (re)descobrir uma nova forma de ser e fazer banda desenhada, adulta, apelativa, desafiante, estimulante, nas assinaturas de Tardi, Schuiten e Peeters, Pratt e Manara, Comés, Muñoz e Sampayo, Geluck, Boucq, Bourgeon, Cabanes… Sim a lista é longa… e impressionante!
Possivelmente, a (À Suivre) foi o veículo que me permitiu continuar a ler BD, dar o salto da juventude para a idade adulta com os quadradinhos, transitar da BD de aventuras para o romance desenhado.
Por isso, o meu obrigado a Jean-Paul Mougin porque sem ele, quem sabe, talvez não estivesse hoje aqui a escrever, talvez não tivesse feito da BD o centro da minha vida profissional, talvez não tivesse mantida acesa a chama da paixão que nutro por uma forma única de expressão.

12/09/2011

12 Septembre

L’Amérique d’après
Collection Univers d’auteurs
Enki Bilal (capa)
Sophia Aram, Russell Banks, Daryl Cagle, CharlÉlie, Jerome Charyn, Roger Cohen, Jacques Ferrier, Jean-Luc Hees, Barbara Hendricks, Miles Hyman, Jul, Lorenzo Mattotti, José Muñoz, Plantu, Joe Sacco, Carlos Sampayo, Fabienne Sintes e Art Spiegelman
Casterman + Radio France (França, 17 de Agosto de 2011)
187 x 260, 208 p., pb e cor, brochado com badanas
22,50 €

Resumo
Obra colectiva que reúne autores de um e outro lado do Atlântico que reflectem sobre as mudanças que os atentados de 11 de Setembro de 2001 provocaram nos Estados Unidos, no sonho e nos ideais norte-americanos.

Desenvolvimento
Este é um livro diferente, pensado pelos jornalistas franceses Pascal Dellanoy e Jean-Christophe Ogier, que junta em parcerias ou diálogos autores francófonos ou norte-americanos, oriundos das mais diversas áreas: jornalistas, cartoonistas, escritores, arquitectos, ilustradores, músicos, autores de BD, fotógrafos…
A base, para (quase) todos, é a mesma: reflectir sobre o que mudou com os atentados de há uma década. E a respostas, em forma de ficção ou reflexivas, críticas dos atentados e das acções (retaliatórias) que se lhe seguiram, são maioritariamente marcadas pelo pessimismo, a desilusão, a dúvida. Naturalmente. Mas sem esconder (algum) fascínio, e, no fundo, a crença que continuam a depositar numa América capaz de os surpreender.
Em termos práticos, é evidente que o que melhor funciona são os cartoons, no saboroso e (apesar de tudo) divertido diálogo entre Cagle e Plantu.
É, no entanto, nalguns dos textos escritos que o tema é melhor esmiuçado e é neles que se cumpre melhor o propósito do livro: fornecer ao leitor pistas, pontos de partida, indicações para elaborar a sua própria reflexão sobre o tema.
Para quem tem maior interesse pela BD – a maioria dos leitores deste blog, suponho – para além da bela capa de Bilal, o destaque vai para a criação de Joe Sacco, desta vez despido da sua farda de BD-jornalista, enveredando por um relato com (invulgar) tom de ficção-científica, numa viagem a um aterrador futuro dos EUA. Muñoz e Sampayo, com o tom negro e desiludido que os caracteriza mostram como os emigrantes estão (sempre) por detrás dos (sonhos) norte-americanos, desta vez com uma viagem à cozinha do império. Miles Hyman, nova-iorquino que reside em Paris traça um retrato sombrio de uns EUA transformados em vítimas de uma hiper-segurança obsessiva.
De uma obra com estas características, aberta para permitir ao leitor, claramente apontada para lá do mercado tradicional de banda desenhada, ressalta o facto de as participações aos quadradinhos ombrearem perfeitamente com as outras formas de expressão, por alguns ditas “mais nobres”, ganhando em expressividade sem perder profundidade ou capacidade de afirmar posições.

A reter
- A qualidade dos nomes reunidos nesta obra.
- O tom da obra, que privilegia a reflexão sobre o futuro em detrimento da homenagem ou da evocação, partilhando pistas e sinais com o leitor.
- As participações dos cartoonistas Cagle, Jul e Plantu.

Menos conseguido
- O facto de a participação de Art Spigelman, um nome com muito peso e com diversos trabalhos sobre o tema, se limitar a respostas a uma entrevista (ilustradas por Mattotti), embora com muito para reflectir.
- A inexistência de uma edição portuguesa, que pode de alguma forma ser compensada pela edição brasileira da Record/Galera, já disponível.
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