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06/02/2013

Hägar: horrendo e quarentão












Há 40 anos, a 4 de Fevereiro de 1973, um novo herói de BD estreava nas páginas de 136 jornais norte-americanos: tinha por nome Hägar, the horrible e teve um sucesso retumbante, tendo chegado a publicar-se em 1800 jornais de 58 países.

Embora adoptando o tom tradicional das tiras diárias familiares, Hägar distinguia-se por ser um vicking que vivia um milénio antes da data da sua estreia nos jornais, em plena idade das trevas, para a qual ele contribuía entusiasmado.
A comicidade advinha tanto dos muitos anacronismos existentes na série, quanto da convivência entre os diferentes membros: Hägar, tão intrépido conquistador quanto submisso marido; Helga, a sua mulher, que usa os maiores cornos da casa, símbolos de poder entre os vickings; Hamlet, o filho, que prefere a leitura à natural violência da época e quer ser dentista; Honi, a filha adolescente que almeja seguir o pai nos combates. A galeria de personagens é ainda enriquecida com Eddie Felizardo, lugar-tenente de Hägar, que não faz jus ao nome e dotado de pouca inteligência; Lute, o trovador pacifista que aspira ao coração de Honi; o dr. Zook, o curandeiro local e Snert, o cão de Hägar.



O seu criador foi Dik Browne (1917-1989), que na sua bibliografia já registava o desenho de “Hi and Lois”, outra tira diária bem-sucedida. Surgido quando já contava 56 anos, uma idade em que muitos criadores já entraram em declínio, Hägar permitiu-lhe cumprir o principal propósito: deixar à família um legado que lhes permitisse viver sem sobressaltos.
Ainda em publicação nos nossos, dias, agora assinado por Chris Browne, que assumiu a série quando o seu pai faleceu, em Portugal – onde foi terrível, abominável e horrendo - Hägar passou de forma discreta pelas páginas do Mundo de Aventuras, tendo conhecido uma primeira edição em álbum, em 1993, por parte dos Livros Horizonte. Em 2008 a Libri Impressi, de Manuel Caldas, propôs-se fazer a sua reedição integral cronológica, mas o projecto ficar-se-ia por dois volumes, correspondentes às tiras diárias publicadas em 1973 e 1974.

(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 5 de Fevereiro de 2013)


11/08/2010

Hägar




















Um vicking de sorriso inofensivo e feliz – Ano 1
Um pai desiludido e amargurado – Ano 2
Dik Browne (argumento e desenho)
Libri Impressi (Portugal, Julho e Novembro de 2008)
170 x 235 mm, 128 p. e 144 p., pb, brochado com badanas

Manuel Caldas, em paralelo com a notável restauração das pranchas originais dos primeiros volumes do “Príncipe Valente”, do western humanista “Lance”, do “Tarzan” original de Hal Foster, tudo obras realistas, e de selecção de clássicos como “Krazy Kat” e “Os Meninos Kin-Der”, propõe também o humor de “Ferd’nand” e de “Hägar, o horrendo”, este um clássico das tiras diárias norte-americanas. Comum a todos estes projectos é o cuidado apaixonado posto nas edições e o grande respeito pelas obras originais e (consequentemente) pelos autores.
Hägar é um vicking atípico, ou não divida ele o tempo entre as actividades inerentes à sua “profissão” – invadir, pilhar, saquear – e as banais tarefas domésticas quotidianas a que Helga, a sua mulher – que usa cornos maiores, símbolo do poder entre os vickings de Browne - o obriga.
Com um universo reduzido - inspirado na sua família e amigos – que junta a Hägar e Helga, Hamlet, o filho letrado, Honi, a filha que sonha com proezas guerreiras, Lute, o trovador pacifista que aspira ao seu coração, Eddie (nada) Felizardo, companheiro de batalhas, um médico/curandeiro charlatão e poucos mais, Browne explana um humor simples mas eficaz, assente num traço arredondado, simpático, expressivo e desprovido de pormenores desnecessários, com divertidos anacronismos e desfechos sempre surpreendentes, parodiando não só a época de Hägar mas também o quotidiano de todas as épocas, mostrando que dentro de cada um de nós há um pouco deste vicking permanentemente insatisfeito e rude mas também submisso, e transformando as pilhagens e massacres cometidos pelos vickings, um dos mais violentos povos da História, em algo divertido por que ansiamos página após página.

Menos conseguido
- Expliquem quem for capaz, mas a verdade é que os leitores portugueses não aderiram a Hägar e as vendas destes dois tomos foram muito baixas. Por esse motivo, dificilmente mais verão a luz do dia…

Curiosidade
- Não é vulgar, mas quando Dik Browne (1917-1989) imaginou Hägar, em 1973, já passara os 55 anos. Até aí, tivera uma carreira mediana, com um Prémio Reuben (1963) para a tira familiar “Hi and Lois”, criada e escrita por Mort Walker, como ponto alto.
E sem alguns problemas de visão, que o levaram a querer precaver o futuro da família, talvez Hägar nunca tivesse saltado duma folha de papel para 1900 jornais de todo o mundo, privando-o do Reuben de 1973, da fama e dinheiro que nunca tivera e da completa realização pessoal e artística.

(Versão revista e actualizada do texto publicado na página de Livros do Jornal de Notícias de 21 de Julho de 2008)
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