Há 55 anos,
o país vizinho assistia ao nascimento de duas das mais atrapalhadas e perigosas
personagens que a banda desenhada já conheceu. Tinham nome de carne de porco –
Mortadela e Salamão – e eram criação de Francisco Ibañez.
Fazendo jus
à tradição das hisporietas, o título original – “Mortadelo y Filémo, agencia de
información” –rimava, e o modelo satirizado era a dupla Sherlock Holmes/Dr.
Watson.
Nessa
primeira aparição, ainda a preto e branco, que teve lugar na mítica revista
espanhola “Pulgarcito” n.º 1394, da Editorial Bruguera, corria o dia 20 de Janeiro do ano de 1958, Mortadelo
e Salamão apresentavam visuais diferentes, eram os únicos detectives de uma
agência e as histórias, de uma única página, terminavam sempre com o fracasso
da sua investigação.
Depois, no
final da década de 60, as histórias cresceram, ganharam cor, multiplicando-se
os trocadilhos, situações absurdas, crítica social e gags visuais, os heróis
passaram a agentes secretos da T.I.A. (Técnicas de Investigação
Aeroterráqueas), continuando especialistas nas maiores confusões. Tiros,
explosões, quedas abruptas, choques eléctricos, com as consequentes fracturas,
queimaduras, perda de membros – tudo provisório, claro - eram o seu pão
quotidiano, com o chefe Salamão (Filémon no original) a ser quase sempre a
vítima da total inépcia de Mortadela.
Na narração
das suas aventuras, em ritmo muito acelerado apesar da profusa utilização de
diálogos palavrosos e de vinhetas repletas de pormenores, Ibañez, nascido em
1936, optou por um traço arredondado, muito ágil e dinâmico e pelo recurso
frequente a metáforas visuais (conforme as situações, Mortadela pode aparecer
como uma tartaruga, um cão, uma máquina ou um veículo…) que se tornaram uma das
imagens de marca da série.
Recorrentemente,
ao lado dos protagonistas, surgem o Super, director da T.I.A, o Doutor
Bactério, inventor dos mais bizarros engenhos, todos com a particularidade de não
desempenharem a função para que foram criados, e a volumosa Ofélia, vítima dos remoques
de Mortadela.
Entretanto,
em meados dos anos 80, um diferendo com o editor levou Ibañez a perder os
direitos das suas personagens, que seriam continuados – com menos originalidade
e interesse - por diversos outros autores, alguns dos quais se tornariam depois
c colaboradores de Ibañez, numa fase híbrida dos dois trapalhões.
Já nos anos
90, com o criador original de novo à frente dos seus destinos, esta banda
desenhada passou a explorar temáticas na moda ou eventos mediáticos, como os
recentes Jogos Olímpicos de Londres, local de uma das suas mais recentes barafundas.
Ainda em
publicação, com quase duas centenas de álbuns, Mortadelo e Salamão saltaram das
páginas da BD para desenhos animados logo nos anos 60 e, depois, para longas-metragens
de animação ou com intérpretes de carne e osso (com Benito Pocino e
Pepe Viyuela como protagonistas), um musical e diversos videojogos.
Apesar da
proximidade geográfica, Mortadela e Salamão (a exemplo de outros sucessos da
Editorial Bruguera) não conseguiram repetir o êxito em Portugal, onde mesmo
assim foram editados perto de duas dezenas de títulos, a maior parte deles nas
décadas de 70 e 80, com a chancela da Paralelo.
Já este
século, houve duas ténues tentativas de fazer regressar as suas aventuras ao
mercado português, primeiro pela Meribérica (“Fórmula 1”, 2001) e depois pela
ASA (“Estrelas de Cinema”, 2005).
(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de
20 de Janeiro de 2013)
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