A propósito da recente reedição – em Portugal e no Brasil - de
A Pior Banda do Mundo em dois volumes cartonados que dão outra consistência aos
livros e fazem jus à qualidade da obra, lembrei-me de recuperar um texto
publicado a 30 de Maio de 2005 no Jornal de Notícias sobre a adaptação
cinematográfica de alguns dos contos que compõem a obra-prima de José Carlos
Fernandes.
Para ler já a seguir.
As adaptações cinematográficas de obras aos quadradinhos
estão na ordem do dia, de "Homem Aranha" a "Constantine",
de "Old Boy" ao muito aguardado "Sin City". A novidade é
que uma banda desenhada de um autor português - o incontornável José Carlos
Fernandes (JCF) - serviu de base a uma curta- metragem brasileira em fase de
conclusão, "O gosto de ferrugem".
"Tudo começou", diz JCF, "quando o realizador Audaci
Júnior" leu a minha história e me contactou, pedindo autorização para
fazer a adaptação". Consultado o editor, "dei-lhe luz verde e agora
espero pelo resultado, pois não participei na passagem para o celulóide".
Esta não é a primeira vez que a sua obra desperta atenções "Há uns tempos
Sofia Teixeira-Gomes, que estuda cinema em Madrid, pediu-me para adaptar 'O
inextricável labirinto do destino', uma das histórias de 'A pior banda do
mundo'. Há dias veio mostrar-me a curta-metragem 'La señorita Zuenig',
realizada em 2004 e premiada pelo público no último festival de Madrid e
exibida também no Fantasporto".
O resultado final do filme deixou o autor "muito
satisfeito", pois "capta bem o universo e o espírito de 'A pior banda
do Mundo'. E Silvia Abascal, a actriz que dá corpo à Señorita Zuenig, irradia
uma candura que não fazia parte da minha personagem mas que é absolutamente
deliciosa, e que eu dificilmente poderia mostrar através de desenhos. O
interesse dos intercâmbios entre as diferentes artes não está na fidelidade
rigorosa ao original mas em explorar o melhor que cada meio tem para dar".
O autor reconhece ligações entre a sua obra e a sétima arte.
"Quando comecei a fazer BD era mais marcado pelo cinema; depois fui-me
aproximando da escrita e afastando-me do cinema. As minhas histórias centram-se
mais sobre ideias do que sobre personagens e movem-se num universo surreal e
abstracto, desligado da tradição naturalista que norteia a esmagadora maioria
da produção cinematográfica".
No cinema existe uma relação muito forte e quase inevitável
com um espaço e um tempo definidos, "um vínculo que eu evito nas minhas BD",
diz. Este afastamento do cinema também ocorreu na vida real "Há uns 15
anos, em Lisboa, chegava a ver sete filmes por semana. Depois vim para o
Algarve, onde a oferta é reduzida. O cinema partilha um equívoco com a BD: é
visto como entretenimento, os espectadores querem, sobretudo, passar uns
momentos bem-dispostos e ficam incomodados se alguém os desafia a pensar".
Todavia, nem por isso José Carlos Fernandes deixa de lado a paixão pela 'sétima
arte'. como se avalia pela admiração que nutre por algumas obras de cineastas
como David Lynch, Jean-PierreJeunet, Quentin Tarantino ou Larry Clark.
Já adaptou "para guiões de curtas-metragens uma dezena
de BD's", enviadas para os concursos do ICAM. "Ficaram sempre
gloriosamente classificadas no fundo da tabela", graceja. Sem querer dar a
ideia da raposa que alega estarem verdes as uvas que estão fora do seu alcance,
diz que o cinema não o atrai muito "Na BD sou senhor do meu mundo. Posso
despenhar um cometa sobre uma cidade ou fazer chover quando me apetece, uma mansão
com piscina sai ao mesmo preço que um T0, a luz é sempre adequada, os actores
não têm birras, amuos ou problemas com drogas. O cinema é absurdamente
caro".
Mas poderá o sucesso de "A Pior Banda do Mundo", fazer sonhar com a
sua adaptação em Hollywood? José Carlos Fernandes responde: "Até agora
Spielberg não manifestou interesse em adquirir os direitos" (risos).
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