Há 50 anos, um pequeno cãozinho parado à porta de uma
charcutaria, viu Astérix e Obélix entrarem e decidiu segui-los quando saíram.
Era o começo de uma grande amizade.
A cena descrita começa na sexta vinheta da prancha 9 de A Volta à Gália de Astérix, mas não
estava no horizonte dos autores, Goscinny e Uderzo, fazer daquele cão mais do
que uma pequena anedota gráfica recorrente ao longo do álbum, destinada a
terminar na última página do álbum quando Obélix repara nele e lhe dá um osso.
A adesão dos leitores decidiria de forma diferente e acabaram por ser eles a
baptizar o pequeno cão branco e negro de raça indeterminada como Idéfix, em detrimento
de nomes como Patracourcix, Papeurderix ou Trépetix.
Tornado personagem regular – só não participa em quatro dos
álbuns seguintes - revelou um forte espírito ecologista e uma enorme dedicação
a Obélix, que o adoptou e tenta ensiná-lo a entregar menires.
Naturalmente, Ideiafix está longe de ser a única mascote dos
heróis dos quadradinhos, onde os animais de estimação abundam, embora com
personalidades e papéis bem diversos.
Na BD – como na vida, que os quadradinhos tantas vezes
espelham – são os cães que predominam como companhia dos heróis. Snoopy, o
beagle de Charlie Brown (ver caixa), Milu, o fox-terrier do repórter Tintin,
com um fraquinho pelas bebidas alcoólicas e muita coragem para defender o dono,
e Pluto, o cão de Mickey – que tem como principal amigo Pateta, também um
canídeo, mas antropomorfizado - serão três dos mais populares.
Bidú, o cão do Franjinha, primeiro herói de Maurício de
Sousa, ainda na “pré-história” da futura Turma da Mônica; no mesmo universo
Floquinho, o cão do Cebolinha, cuja cabeça se confunde com a cauda, (!) ou
Rantanplan, “o cão mais estúpido do oeste… e também do Este”, de cuja companhia
Lucky Luke se esforça por não desfrutar, são outros exemplos, onde ainda
poderia constar, a título de curiosidade, Krypto, o supercão de Superman,
popular na década de 1950.
E se muitos dos atrás citados, em mais do que uma ocasião
puderam manifestar em sequências gráficas o seu milenar ódio aos gatos, estes
também surgem regularmente nas páginas desenhadas: Garfield surge à cabeça de
uma lista onde se encontram também Mingau, o gato da Magali, ou Tony, a gata
que serve de confidente e refúgio a Julia Kendall, a criminóloga de Garden
City.
No western, género ainda com muitos cultores, surgem com
regularidade cavalos que acompanham – e auxiliam – regularmente os seus donos,
como Jolly Jumper, que joga xadrez com o seu dono Lucky Luke e sabe sempre a
janela por onde ele vai escapar de situações mais delicadas; Ruby, o cavalo de
Jerry Spring; Tornado, montada de Zorro; ou Pequeno Trovão, companheiro do
jovem Yakari.
Tex, protagonista do western da BD há mais tempo em publicação,
teve durante algum tempo um cavalo, Dinamite, e um cão Satã, que acabaram por
desaparecer dado a sua vida nómada e em nome de um maior realismo.
Se estes animais são bastante comuns, muitos heróis optaram
pela companhia de espécies se não mais exóticas, pelo menos fora do comum. O
trapalhão Gaston Lagaffe conseguiu juntar um gato irritante e uma gaivota
sarcástica; Joana e João, criações de Hergé, adoptaram Simão, um chimpanzé; Fantasma,
um clássico nascido nos anos 30, tem um cavalo e… um lobo (!). A dupla mais
estranha, no entanto, pertence claramente a Spirou, dono do esquilo Spip e do
espantoso Marsupilami!
Se alguns destes animais surgem na BD para introduzir uma
nota de humor e outros actuam frequentemente como auxiliares do dono, roendo
cordas, atacando os inimigos, farejando as suas pistas ou ajudando-o a escapar
deles, boa parte deles assumem comportamentos realistas, pedindo mimos e exercendo
um efeito calmante no final dos dias mais conturbados.
E se geralmente as mascotes são apenas um complemento dos
verdadeiros heróis, nalguns casos os supostos animais de companhia suplantaram
os seus donos.
Um dos casos mais evidentes é o de Snoopy que, pelas suas
múltiplas personalidades e pelo cínico olhar (canino?) que lança sobre os
dramas humanos, suplantou Charlie Brown, Lucy e os restantes Peanuts criados
por Charles Schulz.
Já Garfield, nasceu logo como estrela principal das tiras de
Jim Davis, quantas vezes com a cumplicidade forçada do bonacheirão Oddie, para
infernizar a vida do seu dono, Jon Arbuckle, e das aranhas da casa.
Outro caso é o do temperamental Cubitus, que recorrentemente
exaspera o seu dono Sémaphore, com quem compartilha a falta de gosto pela
actividade física e as formas generosas do corpo.
No caso de Bill, o protagonismo é repartido com o seu
(pequeno) dono Boule, numa série de tom familiar que leva o nome dos dois.
(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 21 de Maio de 2015)
Li com muita curiosidade este notável estudo acerca dos animais de estimação de uns tantos heróis da BD. Parabéns, Pedro Cleto.
ResponderEliminarAbraço,
Lino