17/06/2015

As mascotes da BD









Há 50 anos, um pequeno cãozinho parado à porta de uma charcutaria, viu Astérix e Obélix entrarem e decidiu segui-los quando saíram. Era o começo de uma grande amizade.


A cena descrita começa na sexta vinheta da prancha 9 de A Volta à Gália de Astérix, mas não estava no horizonte dos autores, Goscinny e Uderzo, fazer daquele cão mais do que uma pequena anedota gráfica recorrente ao longo do álbum, destinada a terminar na última página do álbum quando Obélix repara nele e lhe dá um osso. A adesão dos leitores decidiria de forma diferente e acabaram por ser eles a baptizar o pequeno cão branco e negro de raça indeterminada como Idéfix, em detrimento de nomes como Patracourcix, Papeurderix ou Trépetix.
Tornado personagem regular – só não participa em quatro dos álbuns seguintes - revelou um forte espírito ecologista e uma enorme dedicação a Obélix, que o adoptou e tenta ensiná-lo a entregar menires.

Naturalmente, Ideiafix está longe de ser a única mascote dos heróis dos quadradinhos, onde os animais de estimação abundam, embora com personalidades e papéis bem diversos.
Na BD – como na vida, que os quadradinhos tantas vezes espelham – são os cães que predominam como companhia dos heróis. Snoopy, o beagle de Charlie Brown (ver caixa), Milu, o fox-terrier do repórter Tintin, com um fraquinho pelas bebidas alcoólicas e muita coragem para defender o dono, e Pluto, o cão de Mickey – que tem como principal amigo Pateta, também um canídeo, mas antropomorfizado - serão três dos mais populares.
Bidú, o cão do Franjinha, primeiro herói de Maurício de Sousa, ainda na “pré-história” da futura Turma da Mônica; no mesmo universo Floquinho, o cão do Cebolinha, cuja cabeça se confunde com a cauda, (!) ou Rantanplan, “o cão mais estúpido do oeste… e também do Este”, de cuja companhia Lucky Luke se esforça por não desfrutar, são outros exemplos, onde ainda poderia constar, a título de curiosidade, Krypto, o supercão de Superman, popular na década de 1950.
E se muitos dos atrás citados, em mais do que uma ocasião puderam manifestar em sequências gráficas o seu milenar ódio aos gatos, estes também surgem regularmente nas páginas desenhadas: Garfield surge à cabeça de uma lista onde se encontram também Mingau, o gato da Magali, ou Tony, a gata que serve de confidente e refúgio a Julia Kendall, a criminóloga de Garden City.


No western, género ainda com muitos cultores, surgem com regularidade cavalos que acompanham – e auxiliam – regularmente os seus donos, como Jolly Jumper, que joga xadrez com o seu dono Lucky Luke e sabe sempre a janela por onde ele vai escapar de situações mais delicadas; Ruby, o cavalo de Jerry Spring; Tornado, montada de Zorro; ou Pequeno Trovão, companheiro do jovem Yakari.
Tex, protagonista do western da BD há mais tempo em publicação, teve durante algum tempo um cavalo, Dinamite, e um cão Satã, que acabaram por desaparecer dado a sua vida nómada e em nome de um maior realismo.

Se estes animais são bastante comuns, muitos heróis optaram pela companhia de espécies se não mais exóticas, pelo menos fora do comum. O trapalhão Gaston Lagaffe conseguiu juntar um gato irritante e uma gaivota sarcástica; Joana e João, criações de Hergé, adoptaram Simão, um chimpanzé; Fantasma, um clássico nascido nos anos 30, tem um cavalo e… um lobo (!). A dupla mais estranha, no entanto, pertence claramente a Spirou, dono do esquilo Spip e do espantoso Marsupilami!

Se alguns destes animais surgem na BD para introduzir uma nota de humor e outros actuam frequentemente como auxiliares do dono, roendo cordas, atacando os inimigos, farejando as suas pistas ou ajudando-o a escapar deles, boa parte deles assumem comportamentos realistas, pedindo mimos e exercendo um efeito calmante no final dos dias mais conturbados.

E se geralmente as mascotes são apenas um complemento dos verdadeiros heróis, nalguns casos os supostos animais de companhia suplantaram os seus donos.
Um dos casos mais evidentes é o de Snoopy que, pelas suas múltiplas personalidades e pelo cínico olhar (canino?) que lança sobre os dramas humanos, suplantou Charlie Brown, Lucy e os restantes Peanuts criados por Charles Schulz.
Já Garfield, nasceu logo como estrela principal das tiras de Jim Davis, quantas vezes com a cumplicidade forçada do bonacheirão Oddie, para infernizar a vida do seu dono, Jon Arbuckle, e das aranhas da casa.
Outro caso é o do temperamental Cubitus, que recorrentemente exaspera o seu dono Sémaphore, com quem compartilha a falta de gosto pela actividade física e as formas generosas do corpo.

No caso de Bill, o protagonismo é repartido com o seu (pequeno) dono Boule, numa série de tom familiar que leva o nome dos dois.

(Versão revista do texto publicado no Jornal de Notícias de 21 de Maio de 2015)

1 comentário:

  1. Li com muita curiosidade este notável estudo acerca dos animais de estimação de uns tantos heróis da BD. Parabéns, Pedro Cleto.

    Abraço,
    Lino

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