Termina
hoje esta diversificada semana que As
Leituras do Pedro dedicaram ao western, com aquela que é - possível mas
lamentável mente - a proposta mais desconhecida aqui feita nestes dias.
Série
oriunda de Inglaterra, apenas publicada nos jornais daquele país, raramente
reeditada em livro, Matt Marriott é uma das abordagens mais duras,
desencantadas e cruas que a banda desenhada alguma vez fez ao western.
Publicado
originalmente entre 1955 e 1977 - e recorrentemente no nosso país a partir do
final da década de 1950, em diversos títulos da Agência Portuguesa de Revistas,
com destaque para o Mundo de Aventuras,
e mais tarde da Portugal Press - Matt Marriott apresenta como protagonistas o
cowboy que dá nome à série e o seu amigo Powder Horn, um ex-soldado.
Vagabundos
errantes, deambulando sem nunca saber de onde virá a próxima refeição ou onde
deitarão a cabeça, pouco dados a ficar muito tempo no mesmo local, acabam frequentemente
por ser simples peões em jogos mais complexos, figurantes ou até simples
espectadores - mesmo que privilegiados - das histórias que Edgar e Weare têm
para nos contar. Espoletadas pela ganância e a prepotência, assentes no desejo
de lucro e de subalternizar o próximo, as narrativas têm quase sempre a dupla a
remar contra a maré, último obstáculo contra os mais poderosos, embora nem
sempre pelas razões mais correctas.
A
decadência de um velho batedor do exército, a quem o álcool destruiu; a
tenacidade de uma mulher que insiste em pregar a palavra do seu deus, apesar da
troça (do paganismo...?) dos seus conterrâneos; a surpreendente paixão de Matt
por uma jovem revoltada com o modo de vida - selvagem e pouco respeitador do
ser humano - do Oeste, que (quase) o leva a cortar com Powder e a mudar de vida
- e a excessiva (?) reacção deste, indicadora de outras ambições...? São estas
as temáticas abordadas nos três episódios que compõem este álbum, relatos
fortes, complexos e entroncados numa realidade que geralmente associamos mais
facilmente a façanhas heroicas do que à decadência e à miséria humanas.
O
tom agreste e desencantando é reforçado pelo grafismo rude de Weare, pouco
agradável à primeira vista, reconheço, assente num realismo duro e sombrio,
servido por um traço que muitas vezes parece pouco mais do que esboço, em que
usa - e abusa de? - traços paralelos para definir volumes e jogos de sombras.
A
edição de Manuel Caldas - bem complementada com textos introdutórios e de análise de Domingos Isabelinho - teste ao sonho de reeditar integralmente a série, assim surjam potenciais interessados e seja contornada a inexistência/indisponibilidade de originais e/ou
provas, surge aos olhos do leitor com a enorme qualidade habitual, desta vez
acrescida, ou não tenha o editor - e consequentemente os leitores - tido o
privilégio de fazer a reprodução a partir dos originais, pertença de um colecionador
português, o que justifica a opção por três episódios não sequenciais -
“Doremus” (1970), “Gospel Mary” (1973) e “The Reward” (1974).
Matt Marriott:
Pueblo Minero
James Edgar
(argumento)
Tony Weare
(desenho)
Libri Impressi
Espanha, Maio
de 2018
280 x 230 mm, 112 p., pb, capa mole
18,50 €
Bouncer, Cisco Kid, Ken Parker, Matt Marriott, Tex Willer (não obrigatoriamente por esta ordem alfabética em que foram
citados) irão ocupar este espaço por estes dias, transformando-o quase numa
‘semana do western’, onde, por exemplo, também podia ter entrado Duke.]
(imagens disponibilizadas pelo
editor; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
José Pires, sem desmerecer o trabalho de Manuel Caldas que é imenso, tenho que lembrar José Pires com o seu fanzine também sobre Matt Marriott. Ainda bem que aparecem tantas e tão boas ediçoes de bd. Não me lembro de uma coisa assim, nem nos anos 80 e nos anos dourados.
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