Confronto perdido
Embora possa ser lida como uma história tradicional de Tex,
a existir uma cronologia ‘real’ do herói, Ouro Negro, que tem apresentação
pública no próximo sábado com a presença do desenhador, deveria ser um relato
do seu período final.
Nele, aqueles que actuam nos limites da lei - ou para lá deles
– têm por detrás um parceiro mais poderoso que transforma a (inevitável)
vitória de Tex num simples adiamento de uma derrota adivinhada, após um confronto
que tem lugar a três tempos.
Primeiro acto: Tex e Carson são chamados ao palácio do
governador do Texas. Embora um pedido de ajuda esteja subjacente à chamada, a
sua presença tem um segundo propósito: serem alvos de uma homenagem pública.
É algo relativamente normal nos nossos dias, a distinção
pública de personalidades que se distinguiram nas suas áreas de influência –
artes, desporto, negócios, política, ensino, investigação… mas sê-lo-ia menos –
começaria a ser aos poucos – no tempo da conquista do Oeste.
O desconforto de ambos, mas em especial de Willer, é
notório. Não só pela sua natureza humilde e porque as suas prioridades são a
justiça e a ordem, sem busca de qualquer tipo de recompensa, mas porque está
claramente fora do seu ambiente.
Segundo acto: os rangers são enviados pelo governador até
Hellsfire, uma cidade sem lei, dominada pela força por Bob Bradock. É irmão de
Jonas, que explora os poços de petróleo dos territórios circundantes, impedindo
qualquer tipo de concorrência.
Ao contrário da habitual entrada em força dos rangers, a sua
acção desembocará num julgamento em tribunal, no qual Tex Willer fará de advogado
de acusação. Mais uma vez fora do seu elemento natural, o ranger demonstrará
falta de à vontade e de aptidão para a função.
Terceiro e último acto: Depois de enfrentar Bob, o confronto
com Jonas Bradock, o irmão ‘com cérebro’ será inevitável. Os campos de petróleo
do industrial assistirão ao enfrentamento, primeiro de palavras, depois a tiro,
recuperando Tex o protagonismo que lhe (re)conhecemos. Ou talvez não, face ao
desabafo com que encerra o volume.
Muito bem desenhado por Leomacs, num estilo realista
pormenorizado e com bons contrastes de branco e negro que esta edição da Polvo
salienta, Ouro Negro destaca-se pelo
argumento de Manfredi, com um acrescento de realismo que impregna a narrativa com
um tom (já) algo nostálgico e questiona – mesmo que só empiricamente – o futuro
de Tex e daquilo que ele sempre representou.
Ouro Negro evocou
em mim, de alguma forma, memórias de O
Dedo do Diabo, em que a mesma civilização que aqui ‘incomoda’ Tex, nesse
álbum de Comanche transubstanciada em eleições e numa nova ordem estabelecida,
afasta o ruivo Red Dust de Greenstone Falls e dos seus amigos, em busca de lugares
ainda livres e selvagens, ainda à sua medida…
E se homens reais, à imagem de quem Dust e Willer foram (superlativamente)
criados, se revelaram indiscutivelmente necessários num lugar e num tempo
determinados, como salienta nesta obra o criador de Mágico Vento, a sua existência a certo ponto caminhou rapidamente
para um ponto de não retorno, como o futuro rapidamente se encarregaria de
demonstrar.
A (in)adaptação aos novos tempos ou a fuga foram as únicas vias disponíveis. Se Dust
regressaria mais tarde, ainda útil, este Ouro
Negro, mais um western bem conseguido, acaba por ser apenas um sinal
isolado, numa longa cronologia assente na faceta viril, heróica e justiceira
que sempre distinguiu Tex Willer.
Apresentação
seguida de sessão de autógrafos
Sábado, 29 de Abril
Auditório do Museu do Vinho Bairrada, Anadia
Com Leomacs, Rui Brito e Mário João Marques
Moderação de João Miguel Lameiras
Tex: Ouro Negro
Colecção Romance
Gráfico Tex #4
Manfredi (argumento)
Leomacs (desenho)
Polvo
Portugal, Abril de
2017
185 x 245 mm, 228 p.,
pb, capa mole com badanas 125 mm
16,99 €
Esta história foi publicada no Brasil, pela Mythos Editora,
da revista regular Tex,
nas edições #554 Ouro negro e #555 Inferno nos Poços.
(imagens da edição da Polvo recolhidas no Tex Willer Blog; clicar
nas imagens para a aproveitar em toda a sua extensão)
Suculenta história!
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