10/01/2019

Tintin já tem 90 anos



Há 90 anos, um novo herói chamado Tintin, de partida para a Rússia, despedia-se à porta de uma carruagem de comboio, prometendo enviar "postais, vodka e caviar".
Era a primeira de muitas viagens, do repórter mais famoso da BD, apesar de ter escrito uma única reportagem, então para "Le Petit Vingtième", um suplemento infantil de um jornal francês.
Da Rússia soviética aos Estados Unidos, da China ao Peru, do Egipto à Austrália, das ficcionais Bordúria e Sildávia à própria Lua (16 anos de Neil Armstrong), Tintin, primeiro com Milu, depois também com o Capitão Haddock, o professor Tournesol ou os detectives Dupond e Dupont, iria tornar num dos símbolos mais populares do século XX. 

Da ingenuidade das primeiras aventuras, influenciadas pelas posições de extrema-direita do seu mentor católico, à denúncia de todo o tipo de ditaduras e à afirmação de valores universais como a amizade e o direito à igualdade, Hergé tornou-se um dos mais destacados, apreciados e copiados autores de banda desenhada de sempre, com uma obra que continua a ser lida 90 anos depois da sua criação e 40 anos depois da última novidade, Tintin e os Pícaros, em 1976. A legibilidade do traço, a qualidade narrativa, as doses equilibradas de aventura, acção, suspense e emoção, e um herói intrépido, sincero e que privilegia a amizade, são algumas das razões desse sucesso.
Sem (reais) novidades há décadas, e mesmo se a passagem ao cinema pelas mãos de Steven Sipelberg, fã confesso da obra de Hergé, fazendo jus ao original, tarda a ter a anunciada continuação com realização de Peter Jackson e não lhe grangeou nos Estados Unidos a popularidade que desfruta no resto do mundo, mais de 250 milhões de álbuns vendidos, com o mercado chinês em crescendo nos últimos anos, dezenas de obras de análise e centenas de produtos derivados de grande qualidade, revelam que a popularidade ímpar do herói de poupa e calças de golfe se mantém.
Comemorações contidas
Agora, a uma década do centenário, as comemorações anunciam-se menos mediáticas do que seria esperado. A Foundation Moulinsart, que gere os direitos da obra de Hergé, anuncia o lançamento, apenas em formato digital, da primeira versão de Tintin no Congo, digitalizada, remasterizada e colorida para a efeméride (ver exemplos acima), que prossegue o que foi feito pela Casterman há dois anos, quando editou Tintin au Pays des Soviets a cores.
A aventura no Congo, tem sido uma das mais questionadas nos últimos anos, com acusações de racismo e de promoção de maus tratos a animais, quase sempre por parte de organizações ou pessoas em busca dos seus "15 minutos de fama" à custa da obra de Hergé. De certa forma em resposta a essas vozes, surgiu nop final de 2018nas livrarias francófonas Les Tribulations de Tintin au Congo, com uma versão comentada e comparada dessa BD, tal e qual foi publicada em 1940-41, já com algumas variações introduzidas por Hergé. O autor, Philippe Godin, um dos maiores especialistas na obra do criador de Tintin, defende que se trata apenas de uma obra ingénua e algo imatura que espelha a mentalidade belga de 1930, mais a mais sabendo-se que em obras posteriores Hergé demonstrou posições contrárias bem mais determinadas.
A grande novidade dos 90 anos, é a inauguração, no dia 13, de uma exposição de pranchas originais desta obra, no Musée Hergé, na Bélgica.

Portugal: pioneiro sem novidades
Mesmo não tendo desembarcado em Lisboa, quando o paquete que o conduzia ao Congo passou ao largo da capital portuguesa (pelo menos na versão original desta BD, datada de 1931), Portugal foi o primeiro país não francófono a publicar Tintin.
No nosso país, onde continua inédita a versão colorida dos Sovietes, não haverá qualquer edição para assinalar a efemériede, mas uma edição daquela versão, única no mundo, já tentada mas nunca autorizada, faria a delícia dos coleccionadores de Tintin em todo o mundo.

(versão revista e aumentada do texto publicado no Jornal de Notícias de 10 de Janeiro de 2019; clicar nas imagens para as aproveitar em toda a sua extensão)

1 comentário:

  1. O meu sonho seria ver a ultima história inacabada de Hergé "Tintin e a Alph-Art" finalmente acabada, pois como mostra muito bem a edição lançada pela ASA o seu criador já tinha muito material para trabalhar sobre as ideias deixadas pelo seu criador.
    Tintin, juntamente com Astérix e Lucky luke, são para mim personagens da BD eternas. Desde que estejam nas mãos competentes de artistas e argumentistas são bem vindas novas histórias.

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