Primavera de 1992. Após a implosão da ex-Jugoslávia, os
nacionalismos adormecidos despertam violentamente e sérvios, croatas, bósnios,
kosovares, montenegrinos… mergulham numa guerra civil sem quartel, só com
culpados, embora com quotas-partes diferentes.
Apanhado no meio de um turbilhão de violência, Erwin Rustemagić,
responsável pela SAF, uma agência de publicação de banda desenhada, recorre ao
fax – única meio de comunicação com o exterior disponível - para contar aos
seus amigos autores – Joe Kubert, Hermann, Martin Ludwig, Hugo Pratt… - o penoso
dia-a-dia que vive com a sua família, entre bombardeamentos, atiradores furtivos,
falta de bens essenciais, todas as arbitrariedades (in)imagináveis, a perda de tudo
o que possuía (incluindo mais de 12 mil originais de BD)…
Dois anos depois, Joe Kubert deu à luz este Fax de Sarajevo, uma obra biográfica e documental
que ilustra o pesadelo experimentado pela família Rustemagić, não só pelas
condições em que viveram, mas também pelas inúmeras sucessivas promessas de serem
retirados de Sarajevo (graças aos bons ofícios dos seus amigos desenhadores e
dos seus contactos), sistematicamente não cumpridas, numa constante
montanha-russa de esperança e desespero.
Alternando sequências (bem) desenhadas (como só Kubert sabia) com alguns dos milhares de faxes que foram trocados ao longo de mais de
um ano – o que aumenta a credibilidade do relato embora lhe coarcte o ritmo de
leitura - o norte-americano constrói, assim, uma obra forte, emotiva e
emocionante que, mais do que culpar a barbárie instalada e os seus responsáveis,
retrata a situação extrema em que viveram dois adultos e duas crianças no local
onde tinham nascido, crescido e organizado a sua vida.
Muito importante na altura em que foi lançada, quer em
termos de denúncia de uma situação então ainda não inteiramente pacificada, quer
em termos de afirmação da banda desenhada como meio narrativo de outro tipo de
histórias que não as cómicas, de aventuras ou de super-heróis, Fax de Sarajevo surge hoje um pouco
datado – até porque o mundo e a tecnologia mudaram imenso – e apresenta alguns
erros factuais – que Rustemagić na altura não conhecia e que Kubert não
corrigiu - embora mantenha toda a carga humana e a capacidade de emocionar e
tenha uma evidente força narrativa na sua dupla vertente biográfica e
documental.
Fax de Sarajevo
Colecção Novela Gráfica #8
Joe Kubert
Levoir/Público
Portugal, 4 de Agosto de 2016
208 p., cor, capa dura
9,90 €
(imagens disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)
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