Ruy, Sales, Mosi
Para além de serem portugueses e fazerem banda desenhada, suponho que
nada (?) mais une aqueles três nomes.
Carolina Beatriz
Ângelo – Pioneira na cirurgia e no voto
Nem sempre, quando abrimos um livro, lhe pedimos que nos
surpreenda; muitas vezes basta que corresponda às nossas expectativas. É o que
se passa geralmente com as obras que José Ruy – a um ritmo assinalável – nos
tem legado, com o seu traço realista personalizado e o rigor na reconstituição
de época que lhe (re)conhecemos, depurando o peso da verdade histórica e da
informação didática em benefício da legibilidade e da fluidez da leitura.
Em Carolina Beatriz
Ângelo – Pioneira na cirurgia e no voto, aborda a conquista do direito de
voto – e o consequente reconhecimento social – pelas mulheres, através de
episódios da vida daquela que pela primeira vez (em 1911) exerceu esse direito
no nosso país – para além de ter sido também a primeira cirurgiã lusa.
Claro está, que se a função do álbum é prioritariamente
informativa – afinal trata-se de uma biografia… - isso não impede que ao longo
da leitura possamos ser surpreendidos, quanto mais não seja pelas tão grandes
diferenças – sociais – que existem entre a época da retratada, o início do
século XX, e a nossa, embora estejam separadas apenas (por um fosso) de cerca
de 100 anos…
Carolina Beatriz Ângelo - Pioneira na cirurgia e no voto
José Ruy (argumento e desenho)
Portugal, Novembro de 2016
215 x 305 mm, 32 p., cor, capa dura
12,00 €
Detective Raton
Os avanços tecnológicos que facilitam hoje em dia a edição,
também têm perigos. Detective Raton é
um exemplo, pois apresenta numa edição de bom acabamento uma obra que não
deveria ter ido além da publicação em fanzine, pela fragilidade gráfica que
denota.
Ou, em alternativa – que me agrada mais – o argumento de Rafael
Sales deveria ter sido entregue a um desenhador mais qualificado pois,
descontando os excessivos apontamentos humorísticos introduzidos, estamos em
presença de uma história com uma forte componente de actualidade, com uma carga
dramática assinalável, proveniente do ‘triângulo’ que a compõe – o desemprego,
a emigração, o rapto de uma filha – e um desfecho com tanto de equilibrado
quanto de humano.
O trabalho de editor, mais do que lançar livros, deve pesar
tudo isto. Digo eu.
Detective Raton
Rafael Sales
Escorpião Azul
Portugal, Outubo de 2016
160 x 230 mm, 66 p., pb, capa mole com badanas
10,00 €
Altemente
Esta trilogia de mini-comics resume uma residência artística
na aldeia algarvia de Alte, frequentada pela autora, Mosi, e alguns colegas da
Faculdade de Belas Artes de Lisboa.
Entre o autobiográfico e o relato documental, o que seduz em
Altemente é a forma como são ligados,
sem cortes abruptos, uma série de episódios isolados, alternando a sua
experiência com pequenas notas e anedotas quotidianas daquela aldeia.
Com um traço simples mas sedutor, alguns – naturais – desequilíbrios
e opções interessantes em termos de planificação, mesmo assim o maior mérito de
Altemente é apresentar-nos uma autora
com muito de promissor.
Altemente - Volumes 1 a 3
Mosi
Comic Heart
Portugal, Maio/Agosto de 2016
165 x 235 mm, 16 p., pb, capa mole
3,50 €
(imagens disponibilizadas pelas editoras; clicar nelas para
as aproveitar em toda a sua extensão)
Tenho o Beatriz Ângelo mas ainda não tive tempo de ler. José Ruy não é um dos meus autores favoritos, mas reconheço-lhe a capacidade de continuar a lançar excelentes obras informativas.
ResponderEliminarJá li o Altemente e tenho a vantagem sobre muitos do leitores de conhecer Alte. Não como habitante que reconheça as pessoas retratadas, mas como um visitante relativamente regular que reconhece os lugares físicos e a âmbiancia, nomeadamente a relativa ao calor.
Altemente. Uma obra pequenina, mas interessante. Tanto na qualificação das várias personagens como na localidade em si. E concordo com o Pedro no sentido de ser uma autora a seguir.
Eu a mim o que me surpreende e aflige é a "fragilidade gráfica" do livro do José Ruy, com uma composição ultra-formulaica e pouco interessante, e um desenho muito rígido e pouco inspirado. E vinhetas com molduras arredondadas? É um choque ver que a Mosi dá uma arraso em termos composição e planeamento das páginas, e em termos de "fluido" e "solto" do desenho. O que eu não gosto muito no Altemente é o lado "episódico" porque me dá a ideia que não foi planeado, ou seja, que ela precisa de mais estrutura em termos de argumento (ou de um bom argumentista atrás dela, veremos o que isso dá quando sair o "O Outro lado de Z").
ResponderEliminarJosé Ruy encontrou um nicho que lhe permite continuar a fazer aquilo que (penso eu) gosta. Ou seja; desenhar e editar livros de BD. Mas não é após os 80 anos de idade que irá mudar o seu estilo.
ResponderEliminarQuem compra, já sabe e deverá aceitar as suas fragilidades gráficas.
Como referi, não é dos meus autores favoritos, exactamente pelo seu estilo de obra. Mas...
No Altemente, a questão 'episódica' é óbvia. Pessoalmente, creio que a obra não foi pensada em termos de lançamento comercial, mas apenas como 'divertimento/trabalho de campo' da autora relitavamente à sua/deles estadia em Alte.
Mas isto é eu a por-me a adivinhar o que passou pela mente da autora.
Em termos da obra, espero que a autora lance uma obra mais estruturada e concebida como peça completa.
Li o livro em questão neste fim de semana. E no caso em apreço, a palavra "li" é a que melhor se aplica, pois se em BD há um binómio de desnho/texto, neste caso, o desenho acaba por ser secundário à parte do texto e à história de Portugal e até mesmo mundial que este livro nos "revela".
ResponderEliminarComo referiu o JoseFreitas, a parte do desenho é claramente pouco estimulante, mas também como eu tinha referido, quem adquire obras de José Ruy já sabe com o que contar. Pelo que não foi (e creio que nunca será) uma desilusão.
Espero que José Ruy continue a editar por muitoe e bons anos. Aliás, tenho acompanhado com muito interesse a evolução da (próxima) obra "A ilha do Corvo que derrotou os piratas" e estou muito curioso pela sua edição em livro.