Cartão de apresentação
Banda desenhada de aventuras, envolvente, leve e descontraída - elementos que nem sempre são fáceis de combinar - Tango é a mais recente aposta da Gradiva no segmento conhecido em França por grand public e o seu primeiro álbum, Um oceano de pedra, é sem dúvida um bom cartão de apresentação.
Porque, nesta história completa - fica já o sublinhado - ficamos a conhecer o suficiente sobre o protagonista, ao mesmo tempo que pairam no ar questões importantes sobre o seu passado, que os relatos futuros - já são cinco os tomos lançados em França, onde a série se estreou em 2017 - irão desvendar, pelo menos em boa parte.
Sem entrar em demasiados pormenores, posso dizer que Tango é um americano que se refugiou nos Andes, fugindo de um passado - de que nos será dado espreitar um pouco, mais à frente no livro - que o persegue inapelavelmente. Há quatro anos neste refúgio quase deserto, recriou uma vida para si, integrando-se na pequena aldeia local, fazendo amigos, e estabelecendo uma relação com uma bela viúva com quem passa bons momentos e, principalmente, encontrando uma calma, um sossego que lhe dão um grande conforto interior.
Mas, inevitavelmente numa banda desenhada de aventuras, o destino tem objectivos diferentes e, para ter a certeza que tudo vai mudar, neste caso ataca mesmo a dois tempos. Primeiro, trazendo homens interessados no jovem Diego, um dos amigos de Tango, e depois, quase em simultâneo, deixando que os seus perseguidores encontrem a sua pista.
Numa história semeada de dúvidas prementes, a que aos poucos os autores vão dando algumas respostas, houve neste álbum de estreia dois aspectos que me agradaram menos. Em primeiro lugar - de forma surpreendente, reconheço - senti um sobre-dimensionamento dos balões, geralmente maiores do que o necessário. Incomodou-me de tal forma, que consultei a edição original francófona, comprovando ser problema de origem e da legendagem da edição portuguesa da Gradiva.
Depois, parece-me que o traço de Philippe Xavier teria ganho com uma planificação mais densa, que reduzisse o seu desenho (ou com uma edição menor que tivesse o mesmo resultado). Não acontece em todas as páginas, mas nalgumas, as vinhetas surgem demasiado grandes, aqui e ali há um fundo vazio, por vezes as personagens mereciam melhor definição. E não é sequer uma questão das páginas iniciais, em que o desenhador estaria ainda à procura das melhores soluções gráficas, é uma questão que continua recorrente nos dois álbuns seguintes e que melhora substancialmente quando, em lugar de três tiras por página, Xavier encaixa quatro ou mesmo cinco.
Isso não invalida a naturalidade de poses e movimentos com que Xavier dota as suas personagens e o dinamismo com que impregna as cenas de maior acção.
Deixei o melhor para o final: a escrita reflexiva e intimista de Matz, que já tinha apreciado em O Assassino. É através dela que o passado de Tango vai sendo revelado e, principalmente, que compreendemos as suas opções, os seus desejos, as suas motivações. É também dessa forma que transmite mais consistência e densidade ao relato, contrabalançando momentos mais íntimos com as cenas mais dinâmicas, pontuando assim, de forma dúplice, o ritmo de leitura, que é acelerado pela tal planificação, ampla e arejada, que já referi.
No final de uma leitura que se faz a bom ritmo, com alguma vertigem aqui e ali, se muitas das respostas são dadas e o círculo de Um Oceano de Pedra é fechado, como acontece com todas as bandas desenhadas de acção com herói fixo - e personagens recorrentes - que fizeram as delícias de tantos nos anos 1960/1990, fechamos o livro com a certeza que Tango voltará (mais brevemente do que muitos imaginariam...), de novo com o perigo a rondar em seu redor, muita acção e alguma bela rapariga.
Nota final
Em mais uma sólida edição, de bom tamanho, capa muito consistente e bom papel, saúda-se o desaparecimento do logótipo - pouco estético e nada inspirado - ‘Gradiva BD’, presente na capa das edições mais recentes da editora - e até na primeira versão da capa deste livro que foi disponibilizada.
Tango
#1 Um Oceano de Pedra
Matz
(argumento)
Philippe
Xavier (desenho
Jean-Jacques
Chagnaud (cor
Gradiva
Portugal,
Agosto de 2021
233
x 313 mm, 72 p., 16,50 €
(imagens disponibilizadas pela Gradiva; clicar nesta ligação para ver mais pranchas ou nas aqui reproduzidas para as aproveitar em toda a sua extensão)
A típica BD dos anos 60, 70, 90 que nos apaixonou e fez mergulhar num universo maravilhoso e muito mais vasto, todo o mundo da nona arte. Argumento de Matz na linha do Assassino (apenas 4 títulos em português dos 13 saídos em França) e desenho muito explícito e claro do Xavier que talvez tenha abusado, como refere o Pedro do tamanho das vinhetas e no nu dos fundos. De qualquer modo excelente livro que se devora com o apetite despreocupado de quando éramos jovens.
ResponderEliminarÉ de louvar a Gradiva trazer novas obras, mas não entendo o porquê de não dar continuação ás series já publicadas como por exemplo: a dos ´´Exploradores´´, a dos ´´Mitos´´ ou mesmo a outra das ´´Personalidades históricas´´!!!
ResponderEliminarMiguel, penso que é o eterno problema da BD em Portugal. Muito entusiasmo na publicação dos primeiros números mas depois tudo morre, interrompe-se para sempre a publicação da série porque os últimos números publicados já deixaram muitas sobras. Aliás assusta-me aquilo que, à partida, até poderia ser um bom indicador ou seja, o atual boom de editoras de BD, com muitas edições a saírem mensalmente. Só vai contribuir para se assistir ao fenómeno referido atrás
ResponderEliminarE eu que diga, o corto maltese, os dois volume que sairam em agosto, cinquenta euros. Poderiam ser publicados num so, com preco mais acessivel. Penso foram por este caminho para compensar as sobras dos anteriores, nä fnac de almada tem uns quantos em prateleira, os mais antigos.
EliminarÉ verdade que durante anos era quase norma em Portugal as séries serem interrompidas ao fim de 1 ou 2 livros.
EliminarFelizmente, nos últimos anos, isso raramente tem acontecido e têm sido muitas as séries publicadas integralmente ou que estão em curso de publicação.
Isso não invalida que a edição de BD seja um negócio e que quando as vendas não são suficientes para rentabilizar a colecção, ela tenha de ser suspensa.
Relativamente ao Corto, por um lado duvido que a editora original autorizasse uma edição dupla; por outro lado, um álbum com dois volumes teria uma preço muito alto, mesmo que pudesse ser um pouco mais barato que os dois livros em separado, o que no mínimo prolongaria ainda mais no tempo a sua venda...
Boas leituras!
Segundo a Fnac no próximo dia 28, sai o segundo volume! Yes!!!
ResponderEliminarVolume já anunciado no Calendário BD deste blog desde dia 1 de Setembro.
EliminarBoas leituras!
Este comentário foi removido pelo autor.
EliminarO problema da Gradiva e esse,com o Guardião ou Bruno Brasil também editaram 2 depois nada.
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