Um Espírito Indomável
José Carlos Fernandes (argumento)
Roberto Gomes (desenho)
Câmara Municipal de Loulé (Portugal, Setembro de 2010)
175x240 mm, 40 p., cor, brochada com badanas
Resumo
Este álbum traça a biografia de José Mendes Cabeçadas Júnior, um louletano que foi Presidente da República e que teve papel fundamental em alguns momentos-chave da História de Portugal, como a implantação da República, o levantamento de 28 de Maio ou a campanha de Humberto Delgado para as eleições presidenciais de 1958.
Desenvolvimento
Projecto institucional, “obrigado” a condensar uma vida (muito) cheia em apenas três dezenas de pranchas, apresenta algumas das qualidades e defeitos que são (quase) inevitáveis neste tipo de obras.
Por um lado, foi impossível a José Carlos Fernandes (JCF) fugir ao rigor de datas e acontecimentos, mais a mais face a uma personalidade como José Mendes Cabeçadas Júnior, que de militar a político, de revoltoso a preso, teve uma vida cheia de acontecimentos relevantes que importava conhecer (e pena é que a dimensão da obra não permita aprofundar mais alguns; ficará como ponto de partida para outras leituras).
Por outro, aqui e ali JCF consegue libertar-se daquele espartilho, com pequenos apontamentos (momentos, gestos…), geralmente nas pranchas(/vinhetas com menos texto que mostram e apelam para o lado menos conhecido da personagem pública, mas que lhe conferem uma dimensão mais humana.
Do equilíbrio entre uns e outros, conseguiu uma obra sem paixão, é verdade, mas legível e que cumpre os seus objectivos: divulgar a vida e feitos de um nome marcante da história lusa da primeira metade do século XX.
Quanto a Roberto Gomes, se consegue diversificar bastante a planificação, conseguindo mesmo alguns efeitos interessantes ao utilizar um desenho único, dividido ao alto, como se de várias vinhetas se tratasse, para dinamizar a narrativa (nas páginas 21 e 27, por exemplo), a nível da figura humana apresenta rostos inexpressivos e que só ganhariam se fossem um pouco mais realistas. Em contrapartida, o envelhecimento do protagonista está bem conseguido, merecendo ainda especial destaque a coloração das pranchas, em que predominam os tons ocre e violeta.
A reter
- A excelente edição – design, impressão, papel, acabamento – de fazer inveja a algumas edições “profissionais”.
- A boa selecção de cores.
- A presteza com que a C. M. de Loulé satisfez o pedido de um exemplar.
Menos conseguido
- Numa altura em que José Carlos Fernandes é publicado (e apreciado) em Espanha e França, e expõe em Angoulême e no Centro Belga de BD, é lamentável que no seu país só possa ser lido numa obra de carácter institucional (sem que isto signifique menosprezo por esta edição) e esteja prestes a deixar – ou tenha mesmo já deixado? – a BD.
- Se é louvável esta iniciativa da C. M. Loulé, custa vê-la subaproveitada, por não ser suficientemente divulgada (ou até posta à venda, num espaço como a FNAC, por exemplo). O que seria a melhor forma de atingir os propósitos da edição.
Curiosidade
- Esta não é a primeira vez que José Carlos Fernandes emprega o seu talento em projectos institucionais; já o tinha feito, com argumento de João Miguel Lameiras e João Ramalho Santos, em “A Revolução Interior – À procura do 25 de Abril”, e como autor completo, em “Um passeio ao outro lado da noite”, “Francisco e o rei de Simesmo” (editados pelo Centro Regional de Alcoologia do Centro) e “Os pesadelos fiscais de Porfírio Zap” (Direcção-Geral de Impostos).