29/10/2009

Astérix 50 anos – Entrevista com Albert Uderzo
















Chama-se Albert Uderzo e nasceu em Fismes, na França, a 25 de Abril de 1927. Os 50 anos de Astérix, que se cumprem hoje, foram o pretexto para uma conversa por mail, com a preciosa intermediação da Drª Maria José, das Edições ASA, na qual evocou com saudade o seu amigo René Goscinny, bem como o passado e o futuro do herói que juntos criaram.
- Como apresenta Astérix a alguém que não o conheça? 
- Quer dizer que ainda há leitores irredutíveis? (risos) Pois bem, não sei como o apresentar: Astérix é um valoroso guerreiro gaulês, não muito grande nem muito inteligente, mas astuto e desenrascado! Ele e os outros habitantes da sua aldeia só têm medo de uma coisa: que o céu lhes caia na cabeça! Sempre em companhia do seu fiel amigo Obélix e de Ideiafix, o seu cão, percorrem o mundo antigo para socorrerem as vítimas dos romanos. Para darem uns ”tabefes” aos romanos, ele e os seus amigos da aldeia precisam de uma preciosa poção mágica preparada pelo druida Panoramix que lhes dá uma força sobre-humana e lhes permite alcançar todas as vitórias, que festejam sempre com um grande banquete! 

- Como seria Astérix se fosse imaginado hoje? 
- Como já é! Ele mudou muito desde a sua criação. Cresceu, os seus traços afirmaram-se e a sua personalidade também! Falo dele, mas Obélix também mudou: a sua estrutura, algo quadrada nos ombros, atenuou-se em benefício da barriga, que cresceu! Todas as personagens evoluíram e estão muito bem neste tempo! 

- Nos últimos 50 anos quem mudou mais? Astérix, o mundo ou Uderzo? 
- Tenho que reconhecer que quem está mais marcado é este seu criado! Onde estão os meus 20 anos? como diz a canção! Quanto ao mundo, não me parece que tenha mudado muito em 50 anos e a prova é que os álbuns que escrevi com o meu amigo René Goscinny continuam muito divertidos! E no entanto, na época acusaram-nos de reduzir as culturas a clichés, os franceses regateiros, etc… Isso não mudou muito! Astérix não pode mudar, o seu mundo é imaginário! Não pode envelhecer: já reparou que 50 anos depois, continua a viver em 50 a.C.? Não, Astérix não mudou! 

- Que qualidades permitiram a Astérix resistir tanto tempo, com um sucesso sempre crescente? 
- Não sei, talvez porque se manteve sempre num mundo de papel, aos quadradinhos! Um mundo que lhe permite defender sempre os mesmos valores, como a resistência, por exemplo, porque a aldeia dos gauleses nunca se sujeitará ao opressor romano! Está escrito a introdução de todos os álbuns: “Uma aldeia resiste ainda e sempre ao invasor”. Talvez porque preserva a sua aldeia, as suas amizades e os seus prazeres simples (a caça, os banquetes, etc…) E nós, autores, quisemos sempre preservar esses valores na érie, com um ingrediente suplementar: o riso! Que é o mais importante! 

- Quais foram os momentos mais importantes deste percurso de 50 anos? 
- Houve tantos! Sabe, a minha carreira e a do René não começou há 50 anos. No que me iz respeito, há já 65 anos que desenho! O primeiro momento importante para estes 50 anos foi sem dúvida o meu encontro com René, em 1951! Porque sem ele, não teríamos criado a personagem! Depois, em 1959, quando o imaginámos pela primeira vez, aquando da criação da revista “Pilote” que se dirigia aos jovens adolescentes! E, evidentemente, quando tomámos consciência que Astérix se transformara num verdadeiro fenómeno, ao ouvir um homem na rua a chamar ao seu cão Astérix!. O momento importante mais lamentável foi o desaparecimento prematuro do meu amigo René em 1977. Arrasou-me. E hoje, o cinquentenário desta personagem que, para meu grande prazer, continua a divertir pequenos e grandes. Sinto-me orgulhosos por poder celebrar este meio século de amizade com os leitores! 


- Se pudesse voltar atrás, o que gostaria de mudar? 
- A partida de René. Foi-se demasiado cedo e uma forma demasiado violenta. Sinto muito a sua falta. De resto, não mudaria nada desta aventura gaulesa! - Que história de Astérix ainda não contou? - Todas as que ainda não foram escritas. E talvez aquela em que penso para a próxima vez! (risos) Já na época de René tínhamos a sensação de termos explorado todos os temas que podíamos desenvolver com Astérix. E de cada vez que um álbum era publicado faziam-nos sentir isso! Hoje, o problema é o mesmo, Astérix já viajou por todo o mundo antigo conhecido e é muito difícil fazê-lo descobrir novas regiões! As aventuras desenrolam-se na aldeia, em França ou noutros países… Continuo a reflectir e logo que tenha uma ideia vou escrevê-la e pegar num lápis para a colocar em imagens! 

- Porque é que Astérix nunca veio à Lusitânia? 
- Eis uma bela ideia para uma viagem! Agora só tenho que encontrar a intriga (risos)!

- Qual é o seu álbum de Astérix preferido? 
- Não tenho nenhum preferido. Tenho talvez um carinho especial por “Astérix entre os Bretões”, porque adoro o trabalho que o René fez em torno da língua inglesa! Quando termino um álbum, raramente o releio; parto logo para o seguinte, se assim se pode dizer! 

- O álbum dos 50 anos é diferente dos outros… 
- Para os 50 anos de Astérix queria um álbum especial. Um álbum onde todos os amigos das personagens principais lhes testemunhassem a sua amizade e lhes oferecessem uma prenda! E ao mesmo tempo presto uma homenagem a todos os leitores que seguem Astérix há tanto tempo! Então, imaginei um livro de ouro, uma espécie de álbum de recordações! É um conjunto de histórias curtas, todas com a temática do aniversário, que contam a preparação de todas essas prendas. 

- Foi o último desenhado por si? 
- Meu Deus, espero que não! Enquanto puder segurar um lápis, pode acreditar que não cederei o meu lugar a ninguém! É verdade que Astérix continuará depois de mim, já o anunciei e já trabalho com aqueles que me devem suceder mas isso tem tempo! 

- Vai deixar argumentos escritos para os seus sucessores? 
- Ainda não pensei nisso e não preparei nada nesse sentido. 

- Como imagina Astérix depois de Uderzo? 
- Já houve um Astérix depois de Goscinny e espero que haja u depois de mim. Como o imagino? Espero que Astérix continue a divertir os milhões de leitores que já tem em todo o mundo.

(Versão integral da entrevista publicada hoje no Jornal de Notícias)

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