Étienne Davodeau (argumento e desenho)Futuropolis (França, 6 de Outubro de 2011)
200 x 270 mm, 272 p., pb, cartonado
24,50 €
Resumo
Como diz o subtítulo deste livro, este é o “relato de uma iniciação cruzada”. A iniciação de Richard Leroy, vinhateiro, no mundo da banda desenhada. E a iniciação de Étienne Davodeau, autor de BD, nos meandros do fabrico de vinho.
Em tom documental, o livro abarca quase um ano e meio da vivência em comum dos dois homens.
Desenvolvimento
O título dá o mote. Étienne Davodeau, um dos mais interessantes autores dos nossos dias, ignora tudo o que diz respeito às vinhas e ao vinho. É um ignorante.
Ricahrd Leroy, proprietário de uma vinha na região da Loire, ignora tudo o que diz respeito ao mundo das histórias aos quadradinhos. É um ignorante.
Este livro narra na primeira pessoa e num registo documental, como cada um deles vai iniciar o outro no seu universo próprio. Mesmo se Étienne tem dificuldade em distinguir vinhos, mesmo se Richard adormece quando tenta ler BD.
Porque este é um mergulho naqueles dois universos, díspares mas sedutores, potenciado pela paixão comum dos protagonistas pelo trabalho bem feito.
Por isso, ao longo do livro, acompanhando o trabalho dpos dois homens na vinha, acompanhando as suas escapadas ao mundo dos quadradinhos, vamos conhecer os segredos para a obtenção de um bom vinho: a poda, os cuidados a ter com o solo, a adubação, o sol, a (não) utilização de químicos, o fabrico das pipas, o controle do crescimento das videiras, as vindimas, a fermentação, o repouso, o engarrafamento, a degustação, as visitas de críticos…
E também saber pormenores sobre o desenvolvimento do argumento e do desenho, o fabrico físico dos livros, a importância do papel, a função do editor, vamos visitar as casas de Jean-Pierre Gibrat, Marc-Antoine Mathieu e Emmanuel Guibert (vendo os autores como raramente os vemos, no seu ambiente próprio, na sua mais simples condição de seres humanos normais… e descobrindo as suas concepções da BD, razões para as opções formais, temáticas e estéticas, formas de trabalhar), descobrimos porque Trondheim se retrata com um grande bico (numa explicação desenhada pelo próprio…), visitamos os festivais Quai des Bulles e de Bastia ou a exposição Moebius na Fundação Cartier…
Mas se o registo é documental, o tom é profundamente humano, cativante e sereno, em especial graças aos diálogos credíveis, verdadeiros e sinceros como só Davodeau sabe, pontuados aqui com humor, ali com fúria, depois com dúvida, mais à frente com surpresa, e através dos quais – como os protagonistas - somos iniciados naqueles dois mundos, aprendemos com as dúvidas de cada um que, em muitos casos, podem ser também as nossas. Acompanhamo-los no campo e nas exposições, provamos vinho e descobrimos bandas desenhadas como Watchmen, Maus ou Le Photographe (conhecemos mesmo dois co-protagonistas desta última, igualmente vinhateiros!), ouvimos as suas opiniões, os seus pensamentos, os seus desabafos…
Por isso, no final do livro, encontramos duas listas: os vinhos bebidos e as bandas desenhadas lidas…
Numa vintena de capítulos e quase 300 pranchas – vivas, dinâmicas, baseadas no essencial, retratando com rigor mas liberdade os locais por onde os dois passaram, transmitindo a paixão de Richard pela sua terra, descrevendo sem palavras as diferenças (de solo, irrigação, clima, vegetação) entre as diversas vinhas visitadas – Davodeau mostra a amizade forte que une os dois homens e transmite a paixão que cada um sente pela sua actividade, a honestidade com que cada um a encara e com as quais tenta conquistar o outro.
No fim, ganha o leitor - qualquer leitor, seja ele apreciador de vinhos, amante de BD, ambos ou nenhum dos dois - pois aprende sobre aquelas duas ocupações artesanais – criar BD, fabricar vinho - desfruta de uma história sensíuvel e humana e (re)descobre (outr)as potencialidades narrativas da banda desenhada.
A reter
- A superior capacidade narrativa de Davodeau.
- A honestidade apaixonada (e apaixonante) dos dois protagonistas em relação à respectiva arte.
- O belo objecto livro.
Obrigado pela sugestiva critica. Uma pergunta desde o outro lado da "raia": por acaso nao estara Lea Ignorants publicado ja em lingua portuguesa?
ResponderEliminarCaro Jim Hawkins,
EliminarObrigado pelas suas palavras e por esta interacção.
Infelizmente "Les Ignorants" ainda não está editado em português...
... e possivelmente nunca será...
Boas leituras!
Será em 2017!
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