Se Spirou é o exemplo maior e mais antigo da retoma de heróis por outros autores – nalguns casos de forma notável – este é um caminho cada vez mais explorado na BD franco-belga. Chlorophylle, de que é lançado hoje no mercado francófono Le monstre des trois sources, depois de Embrouilles a Coquefredouille, de Zidrou e Godi, há cerca de um ano, é o exemplo mais recente.
E, enquanto aguardamos pelo muito prometedor L’homme qui tua Lucky Luke, de Mathieu
Bonhomme, que chega no início de Abril, exemplos similares não faltam noutros
contextos geográficos e criativos, das Graphic
MSP que têm revitalizado as personagens de Maurício de Sousa, ao regresso
próximo dos heróis Hanna-Barbera aos quadradinhos.
No caso presente, depois de uma enigmática cena inicial que
afectará de forma profunda o decorrer da história, tudo começa como sempre: a
tranquilidade do pequeno bosque onde vivem Chlorophylle, Minimum e os seus
amigos, sofre um ligeiro desvio pela chegada da bela Particule, cansada da vida
citadina.
Um – provocador? – banho matinal da ratinha no pequeno lago
vai dar a volta ao coração e à cabeça de Minimum que passa a viver em função do
tempo que pode partilhar com ela. Quando Chlorophylle, sentindo a falta do
amigo – e das consequentes aventuras – tenta que tudo volte ao normal, o
desaparecimento de Particule, ao que tudo indica raptada por um violento
predador, vai – finalmente! – arrastar os companheiros de sempre para mais uma
aventura.
Ao espírito ingénuo, agradável e ternurento que existia no Chlorophylle
de Macherot – pese embora a componente de crítica social e o retrato da
sociedade humana que compunha com o seu universo animalesco - Hausman adiciona
um visual a um tempo hiper-realista mas também grotesco que corta visceralmente
com o traço arredondado original e confere um toque de realismo duro que contrasta
(ou talvez nem tanto…) com o tom geral da narrativa, pese embora alguns desvios
introduzidos por Cornette, nem sempre subtis, que alteram sucessivamente a
linha original e a vão transformar mais numa tragédia do que numa simples
aventura, com um final em parte ‘emprestado’ de um clássico do cinema,
perfeitamente conseguido e que acentua a velha máxima de ‘que nem tudo o que
parece, é’.
Dessa forma, a procura de Particule, raptada por um texugo, mentalmente
afectado e transformado em “monstro” por um atropelamento (mas não só…) assume
contornos inabituais em Chlorophylle e, introduz temáticas bem mais sérias tornando,
ao mesmo tempo, a leitura mais estimulante, embora, inevitavelmente, isso venha
a chocar e dividir os leitores.
Pelo tempo de um álbum, a via (naturalmente) seguida por Cornette
e Hausman revela-se bastante interessante, mantendo o espírito da série, aproveitando
bem a lenda do pequeno lago, recuperando personagens menos utilizadas e
acrescentando o seu toque gráfico (bem) pessoal e uma temática diferente.
Cornette (argumento)
Hausman (desenho)
Le Lombard
Bélgica, 4 de Março
de 2016
241 x 318 mm, 48 p.,
cor, cartonado
EAN 9782803637065
14,99 €
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