Não é novidade – vem nos
(bons) livros de História(s) – Super-Homem estreou-se em 1938 e Batman em 1939.
O primeiro, fruto da imaginação de Jerry Siegel (1914-1996) e Joe Shuster
(1914-1992), fez a primeira aparição no número inaugural da revista Action Comics, datada de Junho daquele
ano, a tal de que um exemplar foi vendido por mais de 3 milhões de dólares em
2014.
Quanto a Batman, a sua
criação está creditada a Bob Kane (1915-1998), com o importante contributo de
Bill Finger (1914-1974) no argumento, e estreou-se no n.º 27 da revista Detective Comics, que ostentava na capa
a data de Maio de 1938, com uma história que pudemos recordar no volume 75 Anos de Aventuras da colecção 75 anos de Batman. 2,2 milhões de
dólares foi o valor máximo atingido em leilão por um exemplar daquela revista.
Super-Homem e Batman têm
vários pontos comuns: ambos são órfãos, ambos decidem combater o crime, ambos
decidem dar o máximo pelas cidades onde vivem, ambos adoptam identidades
secretas. Há no entanto (pelo menos) outros tantos a separá-los: Super-Homem
foi enviado de Krypton, um planeta destruído após a sua partida, Batman nasceu
na Terra; Super-Homem teve uma infância e adolescência felizes, enquanto Batman
vive angustiado e rodeado de fantasmas desde criança; o Sol que nos ilumina
confere a Super-Homem poderes extraordinários, as capacidades de Batman, adepto
da noite e da escuridão, provêm do exercício físico, da sua capacidade dedutiva
e do equipamento especial que desenvolveu; Batman é um solitário, que utiliza a
violência e o terror que inspira como principais armas para combater os vilões,
enquanto Super-Homem prefere uma atitude mais positiva.
Super-Homem e Batman foram os
primeiros daqueles que hoje conhecemos por super-heróis e rapidamente
alcançaram um grande sucesso, com um igualmente rápido salto para a TV, o
cinema e a rádio. Também por isso, tornaram-se ícones da editora Detective
Comics, Inc., uma empresa que posteriormente seria incorporada na futura DC
Comics, que hoje conhecemos.
Curiosamente, apesar da
proximidade das suas estreias e do sucesso comum - e, mais surpreendente ainda
à luz do que hoje em dia é vulgar – Batman e Super-Homem só se encontrariam nas
páginas dos quadradinhos – descobrindo de imediato as respectivas identidades
secretas - mais de uma década depois. Isso aconteceu em A Mais Poderosa Equipa do Mundo, publicada em Junho de 1952,
exactamente a história que abre este volume, escrita por Edmond Hamilton e
desenhada por Curt Swan. Este último foi um dos principais responsáveis
gráficos pelo Super-Homem, tendo-o desenhado ao longo de mais de 30 anos,
incluindo a tira diária e a icónica O que
aconteceu ao homem do amanhã, escrita por Alan Moore, com que fez a sua
despedida. O seu estilo, muito legível, inteiramente fiel aos guiões que lhe
eram fornecidos e que contribuiu para a humanização do (extraterrestre)
Super-Homem, deixou uma marca indelével.
A Mais Poderosa Equipa do Mundo, dotada de uma grande ingenuidade narrativa – se
avaliada à luz dos padrões actuais - própria da época em que foi criada,
apresenta pormenores deliciosos que devem ser devidamente apreciados, como a
razão para Bruce Wayne/Batman embarcar no cruzeiro de luxo onde o destino – o tal que faz bem as coisas… – o coloca
na mesma cabine de Clark Kent/Super-Homem, a forma como a descoberta mútua
acontece, como se protegem um ao outro face a uma cada vez mais intrigada Lois
Lane ou o inusitado desfecho final.
Apesar deste primeiro
encontro tardio, Super-Homem e Batman já partilhavam, em aventuras a solo, as
páginas de uma outra publicação, a World’s
Finest Comics, desde 1941, bem como as respectivas capas, muitas vezes bem
mais próximas do gag do que das façanhas super-heróicas que seria
legítimo esperar deles. Para os ver juntos, foi preciso esperar pelo número 71,
de 1954, quando a diminuição de páginas da publicação forçou que começassem a
actuar em conjunto.
É desta revista, dos números
#175/#176, que foi retirada os Esquadrões
de Vingança de Super-Homem e Batman, uma narrativa que tem por base um
concurso de astúcia para avaliar qual é a melhor dupla: Super-Homem/Jimmy Olsen
ou Batman/Robin, mas que culminará no combate entre os heróis e os esquadrões
de inimigos de cada um deles. O argumento pertence a Leo Dorfman, mas o grande
destaque deve ir para a arte de Neal Adams, aqui numa das suas primeiras
participações em Batman, que inicia um corte com o estilo kitsch que à
data marcara os anos precedentes das personagens. Poucos anos depois, após a
polémica e marcante passagem pela dupla Lanterna/Verde Arqueiro Verde – que
tivemos oportunidade de desfrutar em Inocência
Perdida, na anterior colecção Levoir/Público Super-Heróis DC Comics - Adams regressaria ao Homem-Morcego para
tornar as suas histórias mais sombrias e violentas, ao fim e ao cabo, mais
próximas da sua imagem original.
Avançando neste volume, novo
salto temporal leva-nos até 2006, a Ontem,
hoje, amanhã, um relato que revisita uma realidade diferente da relação,
nem sempre pacífica, nem sempre profícua, de Batman e Super-Homem: a sua
coexistência na Liga da Justiça. Piscar de olho à memória dos leitores
regulares da DC Comics, é um apanhado dos grandes momentos – bons e maus –
vividos por ambos, da sua formação às mortes temporárias ou fingidas de cada um
deles, de futuros hipotéticos, das situações de (quase) confronto e ruptura aos
momentos felizes partilhados com os outros membros, unindo na sua arte – e no
estilo original de cada um desses momentos - o talento dos artistas que ao
longo dos anos os levaram até aos leitores, entre os quais se contam Dick
Giordano, George Pérez, Ethan Van Sciver, Adam Kubert
ou Dan Jurgens.
Se a banda desenhada anterior
tinha por base a participação igualitária na Liga da Justiça, a seguinte, Rumo ao Microverso, publicada pela
primeira vez em 2014, assenta na base de confiança existente entre os dois
protagonistas deste volume, mostrando como em qualquer momento podem depender
inteiramente do outro. Esta é uma história recente de Jeff Lemire, Karl Kerschl
e Scott Hepburn, que marca também o ‘nascimento’ do Átomo no universo DC, na
fase Novos 52.
Se calhar já ouviram esta…, a banda desenhada seguinte, se ignora um seguimento
cronológico, pretensões de continuidade ou coerência narrativa, de certa forma
representa como que o fechar de um círculo, num remake da história que
abre o volume, bem à moda de Hollywood. Mas, onde na primeira imperava a
ingenuidade e o inusitado, aqui é o humor – presente logo no título – que
percorre as páginas. Uma leitura mais atenta fará realçar também o que mudou –
em termos gráficos, narrativos e temáticos – nos quase 60 anos que separam a
versão original desta, deliciosa, assinada por Joe Kelly, Ed
McGuinness, Ryan Ottley, Sean Murphy e Carlo Barberi.
Fora desta lógica, em tom de
desafio, a encerrar o volume, temos When
Clark met Bruce, uma história de apenas duas páginas na qual Jeph Loeb e
Tim Sale, de forma poética e com grande sensibilidade, transformam o tal
primeiro encontro (inicial) quase em segundo. Nele, Clark e Bruce – ainda
miúdos, distantes de se tornarem destacados cidadãos de Metrópolis e Gotham
City como Super-Homem e Batman – olham-se nos olhos, a poucos metros de
distância, com o mesmo desejo – infantil – de brincadeira conjunta, na beira de
uma estrada, algures perto de Smallville, no interior da América profunda. Mais
do que um apontamento curioso, esta narrativa abre a porta a uma reflexão: como
poderia este eventual encontro ter proporcionado o nascimento de uma amizade
diferente e ter mudado o futuro de ambos, principalmente de Bruce Wayne,
despojando-o, quem sabe, da amargura e tristeza que acabaram por tomar conta
dele e transformá-lo no homem/vigilante que hoje conhecemos.
Um volume destes apresenta a
grande vantagem de permitir, num reduzido número de páginas, ter um vislumbre
de quase sete décadas de encontros – os desencontros, os momentos de tensão,
afastamento ou confronto ficarão para uma futura oportunidade… – entre os dois
maiores protagonistas da DC Comics e de como a forma, o estilo, o grafismo e as
temáticas foram evoluindo – ou só mudando? – ao longo do tempo e ao sabor da
inspiração e do talento dos grandes autores que os trouxeram até aos dias de
hoje e até nós.
(Texto de introdução ao volume Super-Homem & Batman: Antologia)
Super-Homem & Batman: Antologia
Colecção Super-Heróis DC #07
Inclui: Superman (vol.
1) #76, World's Finest (vol. 1) #175-176, Justice League of America (Vol. 2)
#0, Batman/Superman (vol. 1) #10, Superman/Batman Annual (vol. 1) #1, Superman/Batman
Secret Files 2003
Edmond Hamilton, Leo Dorfman, Cary Bates, Brad Meeltzer, Jeff Leemire, Joe
Kelly, Jeff Loeb (argumento)
Curt Swan, John Fischetti, Neal Adams, Dick Giordan, Eric Wight, Tony
Harris, George Pérez, J.H. Williams III, Luke McDonnell, paul neary, Gene Ha,
Rags Morales, Ethan Van Sciver, Kevin Maguire, Adam Kubert, Dan Jurgens, Kvin
Nowlan, Jimm Lee, Howard Porter, Dexter
Vines, Andy Kubert, Jesse Delperdang, Phil Gimenez, Andy lanning, Ed Benes, Sandra
Hope, Karl Kerschl, Scott Hepburn, Ed McGuinness, Ryan Ottley, Sean Murphy,
Carlo Barberi, Cliff Rathburn, Don Hillsman II, Bob Petrecca, Andy Owens, Rodney
Ramos, Tim Sale (desenho)
Levoir/Público, 17 de Março de 2016
175 x 265 mm, 160 p., cor, capa dura, 9,90 €
(Texto de introdução ao volume Super-Homem & Batman: Antologia)
Gosto deste volume, está equilibrado entre histórias clássicas e novos 52. Estão também representados alguns artistas que ficaram fortemente ligados na história dos dois, caso do Curt Swan no Super-Homem e do Neil Adams (um dos meus grandes preferidos) no Batman. Tem havido por parte da Levoir uma harmonia na escolha das histórias.
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