Esta entrada não foi previamente programada, mas até poderia - deveria? - ter sido, mas este livro - surgido na altura certa, no desfilar das leituras finais do ano - é uma bela forma de encerrar o blog - no que ao comentário de leituras feitas diz respeito. Em 2019, claro!
Porque é uma obra de autores
portugueses - também - mas essencialmente, porque é um belíssimo
relato, tout-court.
É
obra de autores portugueses, já escrevi acima, e é também uma obra
passada em Portugal - embora pudesse ter como cenário muitos outros
locais similares, um pouco por toda a parte.
A sua acção, decorre numa aldeia - pequena,
isolada, condenada ao abandono pelo progresso, a centralização, o
desespero, chamem-lhe e vejam-no como melhor entenderem.
Nessa aldeia sem nome - a que poderíamos dar
tantos nomes… - já só há - só resistem… - duas
crianças, em final de 1.º Ciclo, os protagonistas de Toutinegra.
Pedro, o filho da louca (?) da aldeia, que apresenta um ligeiro
atraso, e Adelaide, cujo pai está a morrer com cancro.
Entre os dois, inevitavelmente (também)
por falta de outras opções, cria-se
uma forte cumplicidade, entre brincadeiras, passeios pela natureza,
aprendizagens na escola e descobertas da vida e do que ela (não)
traz. Cumplicidade que aumenta, após uma visita a um velho moinho e
a uma certa descoberta nele - correspondente à adição de um toque
de fantástico/místico no relato - que
vai mexer profundamente com as vidas das duas crianças e com o seu
relacionamento com aqueles que lhes são mais próximos, em mais um
passo do cruel despertar para a vida real.
História de grande sensibilidade - como André
Oliveira tão bem sabe escrever, tendo encontrado no traço simples,
expressivo e agradável de Bernardo Majer o cúmplice ideal
-Toutinegra
é um relato sobre crescimento e a falta de perspectivas, sim, mas
principalmente uma história tocante sobre como lidar com a(s)
perda(s), o(s) medo(s), a(s) ansiedade(s) e o(s) sonho(s) não
cumprido(s).
E cujo final, inesperado e desconcertante à
luz do que o leitor até aí tinha sido capaz de intuir, surge como o
soco final na boca do seu estômago, deixando-o sem ar, sem fôlego,
sem reacção, perante a crueza realista do que lhe é exposto.
Toutinegra
André Oliveira (argumento)
Bernardo Majer (desenho)
Polvo
Portugal, Outubro de 2019
175 x 250 mm, 96 p., cor, capa dura
14,99 €
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