O álbum Forte Navajo, que inaugurou na passada quinta-feira a segunda colecção (complementar mas ainda assim incompleta) das aventuras do tenente Blueberry numa parceria entra a ASA e o jornal Público, (ainda) não é (completamente) um bom exemplo das qualidades que fizeram deste western um dos mais apreciados da BD franco-belga - e, porque não escrevê-lo?, da BD tout-court.
Mas,
quero frisá-lo desde já, tem já muito dos elementos que
contribuíram decisivamente para isso, o
que justifica plenamente a sua leitura.
Antes
de entrar na sua análise, uma ressalva: este álbum, primeiro dos
cinco - primeiros desta colecção ASA/Público - que compõem o
chamado Ciclo das
Guerras Índias -
como qualquer dos outros quatro - só faz completamente sentido lido
em conjunto, porque isolado(s) mostram apenas uma segmento parcial
dum conjunto bem mais vasto e abrangente.
Antes de
entrar na sua análise, uma ressalva: este álbum, primeiro dos cinco
- primeiros desta colecção ASA/Público - que compõem o chamado
Ciclo das Guerras Índias
-
como qualquer dos outros quatro - só faz sentido lido em conjunto,
porque isolado(s) mostram apenas uma segmento parcial dum conjunto
bem mais vasto e abrangente.
Tudo
começa com o destacamento do jovem tenente Blueberry para Forte
Navajo, situado em pleno território apache. O Blueberry que
primeiramente conhecemos, é um jogador de póquer, potencialmente
batoteiro, amante de zaragatas e pouco dado à disciplina. Mas é
também corajoso, crente nos ideais que defende e um pacifista - pese
embora alguma facilidade com que não se coíbe de matar aqueles que
diz defender, mesmo traiçoeiramente, como na armadilha que prepara
para conseguir sair do forte em Tempestade
no Oeste…
Neste
seu início, Blueberry é (para
já...) um
western
puro e duro, literal e tradicional,
com a maioria dos participantes a cumprirem de forma maniqueísta e
estereotipada exactamente aquilo que deles se espera.
Um
primeiro encontro com o tenente Graig, com o mesmo destino, cria
entre os dois uma forte amizade, o mesmo acontecendo posteriormente
com o mestiço Crowne e o velho Jimmy McClure. Este último, na
tradição da banda desenhada juvenil de aventuras franco-belga,
surge como contraponto ao protagonista, responsável pelos entreactos
cómicos (devido ao seu vício pelo álcool), estratagema que nos
dias de hoje soa algo datado.
É
com esta curta galeria, a que se deverá acrescentar Águia
Solitária, um chefe índio com ódio jurado a Blueberry e, embora
com menor protagonismo, a jovem Muriel e o preconceituoso e racista
Major Bascom, que Charlier e Giraud constroem uma história longa de
240 páginas, durante a qual, ao longo de um período de várias
semanas, Blueberry tenta a todo o custo conseguir a paz entre brancos
e índios.
Mas
se tudo decorre como expectável, a verdade é que ao longo daquelas
páginas e daquele período,
o
equilíbrio entre factos reais e ficção
é
assinalável, num
relato denso e de elevada coerência, sem
que isso impeça que se multipliquem os
volte-faces, os episódios acessórios, os desvios ao rumo, os
confrontos, as fugas desesperadas, as perseguições, os tiroteios,
as alianças provisórias, as
opções limite e
as salvações
in extremis,
num ritmo narrativo infernal em todo o seu esplendor, que fica (já)
como imagem de marca deste western
durante o período de Charlier e
arrasta
o leitor num longo périplo pelo Arizona,
o Texas e o México, sempre desejoso de saber mais.
E
se narrativamente Charlier já (se) revela o exímio narrador que a
BD celebrizou, graficamente esta primeira mão-cheia de álbuns ainda
não faz jus ao desenhador soberbo que Jean Giraud viria a ser. Muito
preso ao estilo do seu mestre Jijé - a quem assistiu em Jerry Spring
e de quem, segundo se diz, recebeu alguma ajuda neste
álbum de partida de Blueberry, assinando, inclusive, a belíssima
capa - Giraud vai aos poucos libertar-se se das suas (boas)
influências e trilhar um caminho próprio. Nada disso invalida que
evidencie já o
seu superior domínio da anatomia humana e do movimento dos cavalos,
nem a credibilidade e realismo dos inúmeros cenários do Oeste
selvagem que Blueberry percorre graças ao seu pincel.
A
edição actual
Tendo
este álbum - e o seguinte deste ciclo - apenas em edição da
Dargaud - e os três seguintes em edições da Meribérica/Líber -
tenho de assinalar a grande melhoria de impressão da actual edição
da ASA, com o preto do traço completamente recuperado e visível, ao
contrário do que acontecia nas edições dos anos 1980/90.
Se aprovo completamente o papel mate da capa, ele tornou um pouco
mais sombria (do que mostrado acima) a ilustração de Jijé - o que não tem de ser
implicitamente negativo.
Obviamente,
eu e todos (?) os leitores preferíamos álbuns duplos (pelo
menos...),
de capa dura, mas atendendo a que esta colecção vem complementar a
anterior, de 2008 - com a inexplicável ausência de O
Homem da Estrela de Prata
- a actual opção é perfeitamente justificável.
...o
que já não acontece em relação ao facto de as lombadas destes 10
volumes formarem a palavra ‘Blueberry?,
para
lá da evidente justificação
comercial, pois
inevitavelmente
chocará com os álbuns anteriores que
apenas ostentavam o número, o nome dos autores e o título do álbum,
mais a mais sabendo que eles são os cinco primeiros e os cinco
últimos da série.
Blueberry
#1: Forte Navajo
Jean-Michel
Charlier (argumento)
Jean
Giraud (desenho)
ASA/Público
Portugal,
28 de Novembro de
2019
215
x 290 mm,
48
p., cor,
capa mole com badanas
7,90
€
"não é um bom exemplo das qualidades que fizeram deste western um dos mais apreciados..."
ResponderEliminarPor alguma razão a anterior coleççao Bliebrry do Publico diz "Uma selecção das 18 melhores aventuras do herói..."
Possivelmente foi mais uma questão de marketing do que outra coisa... Diria o mesmo se a selecção tivesse sido outra! ;)
EliminarBoas leituras!
Poderá ser. Mas a Maria José Pereira deve ter usado algum critério para escolher os 18, não deve ter tirado à sorte. O que não quer dizer que o critério tenha sido os melhores, para além de que os melhores variam de pessoa para pessoa.
EliminarManter a coerência do conjunto deve ter sido também factor principal, o que justificaria tirar os primeiros 5 e últimos 5.
Claro, mas uma coisa não invalida a outra. É evidente que os primeiros álbuns são dos mais fracos, daí a sua exclusão compreensível da colecção inicial, que na altura começou com a edição da (então) novidade do ano anterior, "Apaches".
EliminarMenos compreensível é que , então, não tenham sido publicados os últimos álbuns da série - os cinco derradeiros da actual colecção, que eram a continuação do relato iniciado exactamente nesse "Apachas"...
Como é incompreensível que a actual colecção não tivesse incluído "O Homem da Estrela de Prata", o único álbum de Bluberry que fica de fora nestas duas colecções ASA/Público.
Os critérios, por vezes, são difíceis de compreender...
Boas leituras!