Numa
colecção
Novelas Gráficas 2018 que - na sua quarta edição - de alguma
forma se constrói (três livros em dez) sob o signo das adaptações literárias - que até
podia ser o mote para uma colecção completa da Levoir com o jornal
Público - Tatuagem apresenta - em BD - Pepe Carvalho, o
detective privado criado na literatura por Manuel Vásquez Montalbán.
Ex-agente
da CIA, nascido na Galiza, residente em Barcelona, Pepe Carvalho,
para além - ou antes do mais - é também um amante de literatura e
um conhecedor gourmet, indefinido na sua complexidade de
verdadeiro ser humano.
O
romance Tatuage, publicado originalmente em 1974 marcou a sua
estreia como protagonista, depois de uma aparição, dois anos antes,
noutro livro de Montalbán. Bem-amado em Espanha, com adaptações ao
cinema e à televisão, Pepe Carvalho é tudo menos um detective
privado típico. Daqueles, guarda a inquietude, uma boa rede de
informantes, com Bromuro à cabeça, diversas ligações ao sub-mundo
de Barcelona e um inquestionável poder de atracção sobre as
mulheres, pese embora o eterno regresso à sua amada Charo,
prostituta e confidente. A esta marginalidade omnipresente, fogem a
sua inclinação para a literatura, a cultura e a gastronomia que,
nas histórias que interpreta que vão bem além do mistério
policial que lhe serve de base, coexistem com o lugar importante que
ocupam nos seus monólogos e diálogos a situação política e a
realidade social espanhola sob o regime franquista.
Este
Tatuagem, na adaptação de Migoya e Seguí (que conhecemos do
magnífico Histórias do Bairro, da colecção Novela Gráfica
2017), dá relevo a todos esses aspectos, numa fidelidade ao original
assinalável, embora excessiva aqui e ali, nomeadamente na quantidade
monólogos e pensamentos interiores dos intervenientes introduzidos
(ou mantidos?), que atrasam a leitura e cortam demasiado no ritmo da
acção. Porque, recordo, adaptar é mais do que ser fiel, passa por
recriar no novo meio a história, sem trair esta nem subverter a
forma narrativa utilizada.
Ao
trabalho gráfico de Seguí parece ter faltado algum tempo, pois
identificam-se alguns desequilíbrios entre diferentes pranchas - e
não é uma questão de evolução na procura do melhor registo, pois
elas surgem entremeadas, com as personagens demasiado caricaturais
aqui e ali. O que não impede que, globalmente, o seu traço não
esteja muito conseguido, com uma magnífica reconstrução da
Barcelona dos anos 1970, muito bem trabalhada em termos de
luminosidade ou jogos de sombras, numa composição de pranchas que
merece ser apreciada demoradamente, depois da leitura da obra.
Na
origem deste caso, está o aparecimento numa praia de um cadáver com
uma curiosa frase tatuada nas costas. O pedido de investigação a
Pepe Carvalho, por parte de um particular, levá-lo-á num longo
périplo por Barcelona, os seus arredores e Amesterdão, com diversas
pistas que se cruzam e contradizem até ao desfecho final,
inevitavelmente surpreendente e que comprova como tantas vezes a
montanha pare ratos...
[Nota: o livro foi lido na sua versão francesa, e foi nela me me baseei para escrita deste texto; são dela também as pranchas mostradas.]
Pepe
Carvalho: Tatuagem
Segundo o romance
de Manuel Vázquez Montalbán
Hermán
Migoya (argumento)
Bartolomé
Seguí (desenho)
Levoir/Público
Portugal,
25 de Julho de 2018
88
p., cor, capa dura
10,90
€
(imagens
disponibilizadas pela editora; clicar nelas para as aproveitar em
toda a sua extensão)
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