27/11/2020

Alice

Idade adulta

Descobri cedo o trabalho do Luís Louro - e, na altura, do Tó Zé Simões, parceiro imprescindível para esse arranque e o que se viria a seguir - salvo erro no Mundo de Aventuras. Entre histórias curtas aqui e ali, lembro-me da publicação no fanzine espanhol Camello (?) de Jim del Monaco a cores, quando o preto e branco das edições nacionais só ganhava cor na (nossa) imaginação dos leitores.

Desfeita a parceria, O Corvo marcou a estreia do Luís a solo, mas foi Alice que assinalou a sua entrada na idade adulta, como autor.


A obra

Dele e, de certa forma, da banda desenhada nacional, pouco - ou nada? - habituada a liberdades como a nudez e o sexo explícito - como elementos da narrativa e não de forma gratuita - e temáticas sérias e incómodas, como a SIDA - a 'pandemia' da época... - ou a prostituição.

Inspirada muito livremente na outra Alice, a de Lewis Carroll no verdadeiro País das Maravilhas, em contraste com a cidade - o país? - nada maravilhoso que Louro retrata aqui, esta Alice é um drama, cujos apontamentos de humor apenas fazem sobressair (mais) a sua dimensão trágica.

História (de vidas) de prostitutas, acomodadas ou (ainda) sonhadoras, com escapes vários - no caso da protagonista as histórias encantadas que conta aos miúdos do seu bairro - a Alice do Luís Louro destaca-se pela sua dimensão onírica, espelhada na Lisboa submarina em que a Alice de papel se refugia nos seus sonhos, vazia de seres humanos e apenas habitada por uma diversificada fauna marinha.

A esta visão - que podia ser catastrófica - mas é apenas evocativa do simbolismo que o elemento líquido tem na vida do ser humano - desde o líquido amniótico ainda no útero à sua essência como líquido da vida, constituinte largamente maioritário do nosso corpo - acrescentou Louro referências, mais ou menos óbvias, à obra que o inspirou e alguns piscar de olhos àqueles que mais de perto assistiram ao desenvolvimento da obra.

De leitura simples e linear, mas já dura e incómoda, num primeiro momento, mas capaz de outras revelações em leituras posteriores, esta Alice, pese embora toda a evolução, nos campos gráfico e narrativos, do autor em 25 anos, continua com a força e a capacidade de chocar que tinha em 1995, na edição de capa mole que a ASA incluiu na sua colecção Estórias de Lisboa.


A edição

Uma obra especial e marcante como Alice, merecia uma edição especial, e é impossível escrever sobre esta reedição sem a referir. Mas poucos imaginariam que a Ala dos Livros, que agora a acolheu, fosse tão longe.

Para além do álbum em capa dura, revisto e impresso com as actuais potencialidades tecnológicas, que dão outro brilho ao trabalho de Louro, que acrescenta à edição original um


prefácio de João Mascarenhas e um posfácio do editor Ricardo Magalhães,
a editora decidiu fazer também uma edição especial do álbum, limitada a 500 exemplares, assinados e numerados pelo autor, com capa em tela, com aplicações prateadas e uma sobrecapa.

Para além disso, os primeiros 150 exemplares desta edição, foram reunidos com a edição normal, numa manga que mostra Alice com e sem 'censura'. Neste caso, os exemplares normais foram também numerados e assinados por


Luís Louro, que fez um desenho, a cores, em cada um dos 150 exemplares da edição especial.

Em termos de conteúdo, esta versão inclui 25 perguntas de leitores, respondidas por Louro, bem como a reprodução de esboços, apontamentos e outros elementos de preparação do livro comentados pelo autor.

Como cereja no topo do bolo, estes 150 exemplares são acompanhados por um fotolito da edição original, acompanhado por um certificado de autenticidade que reproduz a prancha correspondente.

Uma bela forma de comemorar 25 anos.


Alice

Luís Louro

Ala dos Livros

Portugal, Novembro de 2020

235 x 310 mm, 64 p., cor, capa dura

16,95 €


(imagens disponibilizadas pela Ala dos Livros; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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