30/10/2017

Fernando Dordio: "Tinha de fazer um livro com o Universo do Sérgio Godinho!”







A recente publicação de O Elixir da Eterna Juventude - Uma Dança no Mundo de Sérgio Godinho, numa edição Kingpin Books, justificou esta conversa com o argumentista, Fernando Dordio, para conhecer a génese e o propósito deste livro.
O resultado, está já a seguir.

As Leituras do Pedro - Como surgiu a ideia deste álbum? De quem partiu? Como foi composta a equipa argumentista/desenhador?
Fernando Dordio - O Sérgio é um mito para a minha geração, uma figura que sempre esteve presente na minha vida, inicialmente por ser uma figura muito admirada pela minha mãe (como activista político e como músico) e também pelas músicas de séries da minha infância.
No entanto, por volta de 2000 e pouco, eu estava em Évora no 25 de Abril e ouvi o “Primeiro Dia” seguido das “Fotos de Fogo” e aquilo bateu forte em mim, essas músicas ajudaram-me a ver de toda uma nova perspectiva um aspecto trágico da minha vida.
Desde essa altura comecei a ouvir o que estava para trás e comecei a segui-lo com entusiasmo - tornei-me então mais um dos seus muitos fãs.
A diferença é que descobri tantas personagens e conceitos geniais e comecei a imaginar que seria interessante fazer uma história em que elas interagissem entre elas.

As Leituras do Pedro - De quem partiu a ideia deste livro?
Fernando Dordio - Foi de mim e é um livro completamente pessoal. Estava a voltar para casa do Concerto Liberdade em Lisboa, no Coliseu, fiquei irritado e disse para a minha esposa “Tenho de fazer um livro com o Universo do Sérgio Godinho!”.

As Leituras do Pedro - Como foi composta a equipa argumentista/desenhador?
Fernando Dordio - Neste caso, diria que eu tive uma ideia para uma equipa que ou era conseguida, ou não iria fazer o livro - Osvaldo Medina e Mário Freitas.
Primeiro, precisava do Osvaldo porque é para mim o melhor storyteller português e sei tudo o que ele acrescenta pela sua inteligência e talento a qualquer argumento - o Osvaldo é um contador de histórias magnífico e pragmático, mesmo mais do que os argumentistas que trabalham com ele.
E o Mário porque abraçou desde logo o projecto sem hesitar, admira muitíssimo o Sérgio e deu-me carta branca ainda nem argumento eu tinha. O Mário define uma qualidade superlativa para os livros que edita, faz a legendagem de forma 100% integrada no livro, o que no final dá um corpo e uma consistência global perfeita. Sendo também argumentista, troca ideias e preocupações sobre o guião, faz-me pensar, faz-me procurar sempre fazer melhor, nem que seja para que no fim ele não me ponha defeitos no guião - isso puxa pela exigência.
O Osvaldo e o Mário tem a minha idade e para um projecto como este, era fundamental que a equipa tivesse já ouvido o Sérgio cantar, nem que fosse ao longe.
A cor foi um processo complicado porque tínhamos uma pessoa inicialmente e depois na impossibilidade dela continuar, o amigo brasileiro José Aguiar, sugeriu-nos o seu colaborador do “A Infância do Brasil”, Joel De Souza que veio dar uma ajuda com a cor.

As Leituras do Pedro - Como o defines? Ficção, biografia ou algo mais?
Fernando Dordio - Ficção, sem qualquer dúvida.
É um livro de aventuras para todo o público e que não necessita quaisquer pré-requisitos, i.e. não é necessário saber nada da obra do Sérgio para se apreciar a história.
No entanto, quanto mais o leitor conhecer a obra do Sérgio, melhor será a experiência e irá ver as diversas camadas temáticas que estão no livro.

As Leituras do Pedro - Como desenvolveste o argumento e qual foi o teu método de trabalho com o Osvaldo?
Fernando Dordio - Desenvolvi uma sinopse bem detalhada com a história. Enviei ao Sérgio que gostou globalmente e que disse que tinha grandes ideias, embora tivesse a precisar de polimento.
Além disso, discutimos quais as músicas que eu iria focar - o Sérgio gostava que houvesse referência a um pouco de tudo, desde temas mais recentes aos mais antigos.
E assim foi feito - posso dizer que existe um tema do primeiro álbum “Sobreviventes” e o tema original do espectáculo “Juntos” com o Jorge Palma.
Fiz full-script sem orientação de ângulos ou perspectivas para as vinhetas. O Osvaldo e o Mário reuniram-se várias vezes e fizeram layouts esboçados das cenas - nunca me preocupei com esse campo, uma vez que somos uma equipa a 100%.
O Osvaldo depois desenhava a versão final. Salvo duas excepções, a ideia para as personagens foi concebida (e de forma perfeita), pelo que o Osvaldo interpretou do guião.
Este processo foi iterativo ao longo de mais de dois anos.

As Leituras do Pedro - O Sérgio Godinho teve alguma participação na sua concepção/execução?
Fernando Dordio - Além do que disse anteriormente, fui enviando imagens dos principais plot-points e personagens ao Sérgio.
O Sérgio é uma pessoa muito ocupada e por isso mesmo, acho eu, directa, pragmática. Dessa forma o processo foi simples. Outro aspecto, importante. Só voltei a falar com o Sérgio pessoalmente depois de ter escrito o guião todo, uma vez que queria colocar no livro a personagem Sérgio Godinho da minha perspectiva e não um Sérgio Godinho que eu já conhecesse pessoalmente.

As Leituras do Pedro - Já tiveste alguma reacção dele ao trabalho finalizado?
Fernando Dordio - Fui dar-lhe um exemplar assim que tive o livro. Em relação ao livro objecto o Sérgio gostou bastante e ficou entusiasmado por estar numa banda-desenhada.
E mesmo há pouco tempo ele disse-me que gostou, mas havemos de falar melhor quando nos encontrarmos novamente. Até agora tudo bastante positivo e ainda bem.

As Leituras do Pedro - Como avalias o álbum impresso? O que ias já mudar se ainda pudesses?
Fernando Dordio - Perfeito. O Mário trabalha há algum tempo com um gráfica polaca e com eles o trabalho tem sido muito bom e o livro impresso está exactamente como concebido. Há livros em que se pode apontar alguma perda de brilho, ou páginas mais baças que outras.
Tudo foi preparado para o livro demorar mais de um mês a vir da Polónia, uma vez que tínhamos mais garantias da qualidade final.

As Leituras do Pedro - O álbum foi impresso com duas capas diferentes, a de Osvaldo Medina para a edição ‘normal’ que sai com o Público, e a ‘variante’ de Nuno Saraiva, para venda nas lojas FNAC e na Kingpin Books. Que destacas em cada uma delas?
Fernando Dordio - A banca e a livraria são dois mundos distintos. Eu gosto igualmente das duas capas e o objectivo foi apelar a dois públicos distintos.
A capa do Nuno a meu ver, é mais destinada a um público que está na livraria a ver o que pretende comprar, olha ao detalhe e normalmente está mais informado sobre o que pretende comprar.
O Osvaldo concebeu uma capa para ter mais punch, porque na banca tudo é mais imediato e é preciso chamar a atenção do potencial leitor - ainda por cima numa altura em que há tanta variedade nas bancas procuramos algo meio Kirbyano, para captar a atenção do leitor.

As Leituras do Pedro - Qual a tiragem deste álbum?
Fernando Dordio - 4500 unidades, sendo 4000 para o Público, 350 para a Fnac e 150 para a Kingpin Books.

As Leituras do Pedro - A distribuição do álbum com o Público dá-lhe uma visibilidade acrescida. Qual a importância disso?
Fernando Dordio - Enquanto fã do Sérgio e sabendo que existem muitos por aí, esta forma é a mais fácil para chegar a qualquer pessoa em qualquer ponto do País. Desta forma, democratiza mais o acesso a um livro que é sobre uma das figuras mais importantes da cultura portuguesa.

As Leituras do Pedro - Qual a importância deste álbum no actual momento da edição de BD em Portugal?
Fernando Dordio - Penso que é mais um álbum Nacional numa altura em que existem dezenas de álbuns nas bancas. Pode existir a possibilidade de atrair pessoas que normalmente não compram BD, mas isso é uma incógnita - esperamos naturalmente que isso se verifique.
A BD portuguesa tem sempre a difícil concorrência de publicações estrangeiras com um maior número de páginas e difíceis de superar.
Para mim, por exemplo, o facto de ter brincado com a Sandbox do Sérgio, mais do que vale todo o trabalho dispensado. Mas, retirando isso, espero que o livro venda e que quem sabe, possa fazer com que interessados em BD possam descobrir a música e obra do Sérgio.

As Leituras do Pedro - Estão previstas sessões de apresentação/autógrafos?
Fernando Dordio - Serão as seguintes embora sem data definidas:
- Lançamento no auditório do Público [no passado dia 25 de Outubro]
- Amadora BD - possivelmente estaremos presentes todos os fins-de-semana
- Diversas FNAC pelo País (Lisboa, Coimbra e Porto pelo menos)
- Comic Con Portugal 2017


(imagens disponibilizadas pela editora e pelo entrevistado; clicar nelas para as aproveitar em toda a sua extensão)

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