Quem conta um conto...
Diz
a sabedoria popular que não há dias sem três, por isso utilizo
pela terceira vez esta abertura: 'Num
ano em que as editoras nacionais parecem rendidas ao western
- Undertaker,
Duke,
Tex,
O último homem...,
Lucky Luke...', mas desta vez forço
a nota, para ter a
terceira entrada
consecutiva
com esta temática,
esta semana.
Isso,
porque li
finalmente este
Fantasmas de Natal,
(justamente) muito bem referenciado.
[Antes de entrar na análise propriamente dita, faço um ponto de ordem. Como leitor (errante) de Tex, não vejo - não via... - qualquer necessidade nem razão autoral para evocar a juventude do ranger de forma regular, numa colecção dedicada a essa época da vida do herói, embora compreendo a óbvia razão mediática e a operação de marketing, que estão por detrás dessa opção.
Agora, depois da leitura de duas histórias do (assim designado) Tex Willer - três com esta, na verdade - sinto a minha posição reforçada. Numa delas, o protagonismo é entregue ao seu irmão 'pacifista'; na outra - nas outras, na verdade - o protagonista ser o jovem Tex Willer ou o Tex 'homem feito' que nós conhecemos, pouco ou nada altera em termos narrativos, podendo o protagonismo ser entregue a um ou outro com ajustes mínimos do argumento.]
É o que acontece com este Fantasmas de Natal. E, o melhor elogio que se lhe pode fazer, é dizer que, com Tex Willer, Tex ou outro qualquer protagonista, estamos perante um belo western a toda a prova.
Começo por informar que esta é uma obra inspirada nos contos de terror natalícios clássicos - com o Conto de Natal de Dickens à cabeça - e nos romances em cenários gelados e adversos, entre os quais se conta Jack London, cuja adaptação por Chabouté pudemos ler recentemente na Novela Gráfica 2020.
De forma sintética, pode apontar-se que esta narrativa decorre a dois tempos: por um lado, o jovem Tex, ainda fora-da-lei, foge face à perseguição que lhe movem homens da lei; por outro, um grupo de agentes da Pinkerton persegue três bandidos, encarregados de lhes entregar um resgate que leve à libertação da filha de um banqueiro.
Obviamente, estes dois relatos acabarão por se cruzar, quando todos - Tex, os Pinkerton e os raptores com a sua vítima - convergirem para uma cabana isolada nas montanhas cobertas de neve e geladas por temperaturas negativas, cenário ideal para uma história natalícia.
Essa cabana, local central do drama que se desenrola perante o olhar dos leitores, irá servir também de palco a uma série de contos - com diferentes narradores - que servirão para adensar o clima de algum terror e até sobrenatural que assim ganha predominância, a espaços, no relato, ao mesmo tempo que traz ao de cima os medos mais íntimos dos protagonistas. Estes momentos - estes contos curtos - entremeados na narrativa base - surgem nela com a aplicação de uma cor (verde, castanho, azul) e aguadas que os distinguem facilmente - sendo pena que a edição da Mythos as exiba 'borratadas' aqui e ali. Se esse efeito gráfico realça a sua inserção 'forçada' na história de Tex Willer, os seus efeitos - e algo mais... - serão determinantes para o desfecho da mesma.
Dessa forma, o argumento de Mauro Boselli apresenta-se mais cerebral do que é costume em Tex, muito mais denso e de leitura bem pausada, chegando o leitor ao final com a impressão que leu bem mais do que as 126 pranchas que tem em mãos.
O trabalho gráfico de Marco Ghion é globalmente bem conseguido, apesar de algumas vinhetas que surgem menos trabalhadas, assente num traço fino e num bom uso de contrastes de branco e negro que dão consistência e credibilidade ao cenário coberto pela neve, ao frio de rachar e às diversas cenas nocturnas. E a forma como trabalha as aguadas nas páginas a uma cor, deixa vontade de ver uma história completa com esta técnica num futuro que se deseja próximo.
A temática fora do comum nas aventuras do ranger (e do futuro ranger!) e a opção pela aplicação pontual de cor faz de Fantasmas de Natal uma edição (mesmo) especial, mas é realmente pela sua qualidade intrínseca que deve ser lida.
Tex
Willer Especial #1
Fantasmas
de Natal
Mauro
Boselli (argumento)
Marco
Ghion
(desenho
e cor)
Mythos
Editora
Brasil,
Dezembro
de 2020
145
x 210
mm,
128
p., pb+cor,
capa cartão
R$
29,90
(capa disponibilizada pela Mythos Editora; pranchas disponibilizadas pela Sergio Bonelli Editore; clicar nelas para as apreciar em toda a sua extensão)
Na temática do Western, porque não a publicação em Portugal da excelente série Durango de Yves Swolfs?
ResponderEliminarPodia ser uma hipótese, sem dúvida, mas as editoras nacionais - com a excepção de Comanche - têm optado por obras mais recentes.
EliminarMas pode ser que algum editor passe por aqui e se sinta tentado... ;)
Boas leituras!
Durango é uma série que ainda está em curso o último volume é de 2016 (Volume 17), pelo que uma suposta edição era bem vinda em integrais, pois a série é de facto excelente...
ResponderEliminarBoa tarde. Eu sou apreciador de tudo o que seja temática western e não posso deixar de apreciar DURANGO, sob o (hiper)realista traço de Yves Swolfs. Tenho dois ou três números conseguidos em alfarrabistas em Portugal, há já muitos anos, mas a coleção, na sua totalidade (até porque os últimos números já não são desenhados por Yves Swolfs), nunca foi publicada em Portugal, com muita pena minha. Acrescento, apenas, que os argumentos e a violência contida nas histórias e desenhos de Durango, são o que mais se aproxima do western Spaguetti, de tal forma que muitas das personagens são o retrato de alguns atores célebres que protagonizaram esses filmes. Seria bem-vinda a publicação dessa coleção. A ver se algum jornal/editora (ou ambos) se lembram disso!
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